segunda-feira, 7 de outubro de 2013

A ilusão do judiciário


Quando Montesquieu (1689-1755) dividiu os poderes em legislativo, executivo e judiciário chamou a atenção para o fato de que deve haver uma relação equilibrada entre eles. Se um dos poderes se une a outro, ou se um deles se sobressai perante os demais é sinal de que a liberdade está sendo minada no estado em questão.

Dado nosso histórico, o legislativo no Brasil sempre foi visto com certa ressalva, por sua vez, com o fracasso desse poder, o executivo sempre foi tratado como a salvação por todos, e, em muitos casos, tentou suprir o papel do legislativo. Os personagens do judiciário, que até pouco tempo eram nomes conhecidos dos especialistas da área, se tornaram midiáticos nos últimos anos.

Junto com o poder, inevitavelmente, tem-se a figura do líder. O líder é aquele indivíduo capaz de comandar e ser admirado por grande parcela da população, tornando-se exemplo a ser seguido. No caso brasileiro, tal papel foi bem exercido pelos grandes executores que, devido à nossa tradição republicana ter se tornado desde cedo um assistencialismo paternalista, souberam representar o papel de pai que cuida dos seus filhos. 

O fato de o legislativo estar sempre mal, e o executivo ter arranhado sua imagem em tempos recentes proporcionou que o poder judiciário tenha se tornado para o imaginário popular a salvação do estado brasileiro, além de ser aquele poder que carrega o bastião da moral. E aqui começam nossos problemas. 

A democracia é o regime que pretensamente possibilita a maior liberdade civil para os cidadãos, entretanto, é um regime que pode tornar esses mesmos indivíduos preguiçosos, pois há sempre alguém que zela por todos, não deixando que nada de mal lhes aconteça. Isso decorre da falta de interesse em lidar com a coisa pública, culminando com o pensamento de que as ações devem ser deixadas para os peritos. 

O judiciário se valeu dessa lassidão natural de muitos e da crise dos demais poderes e se fez passar pela solução de todos os problemas do estado. Ele se tornou “O” grande poder e seus personagens se transformaram em figurinhas carimbadas de programas de talk show. Criaram-se personagens acima do bem e do mal, e, com isso, uma expectativa de que agora as coisas seriam diferentes. Entretanto, a ilusão durou relativamente pouco. 

Numa época em que a razão começara a ser colocada como a grande guia da humanidade, Blaise Pascal (1623-1662) questionou tal noção. O próprio judiciário serve de contraexemplo para o pensador francês ilustrar seu pensamento. A autoridade do judiciário, por exemplo, não é oriunda de uma decisão racional, mas devido à pompa e circunstância que se cria ao seu redor. 

O equívoco perante o judiciário foi se esquecer que ele é também um poder sujeito às falhas que se encontram nos demais poderes. O judiciário pode ser igualmente burocrático, lento, interesseiro, corrupto, vicioso, comprado, em suma, humano. Que sirva de lição o fato de que nesse formato político em que vivemos os poderes devem andar lado a lado, do contrário, o indivíduo deixa de ser livre.

Émilien Vilas Boas Reis é graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre e Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Professor de Filosofia do Direito e Metodologia de Pesquisa na Escola Superior Dom Helder Câmara. 

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