quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Contra o crescimento econômico ilimitado



Equívoco: pensar a atividade econômica isolando-a de sua relação com a natureza (Foto: Divulgação)
Marcus Eduardo de Oliveira

Os serviços ecossistêmicos e a biodiversidade não são levados em conta no cabedal teórico que emoldura a economia neoclássica tradicional. Decorre disso a dificuldade por parte dos neoclássicos em aceitar o fato de o sistema econômico ser um subsistema da biosfera.

Por isso tem sido comum a economia convencional “passar por cima” da problemática ambiental. Para os economistas tradicionais, as questões de ordem ambiental não passam de meros setores pertencentes à macroeconomia, como são os casos da pesca, da agropecuária, das florestas, entre tantos outros.

Com isso, é ignorada a real movimentação dentro de um sistema econômico com as “entradas” (de materiais) e saídas (de resíduos), e a economia, no todo, não é vista como um sistema aberto dentro de um amplo sistema (o ambiente).

É oportuno reiterar que os fluxos de entrada (materiais e energia) e de saída (produtos e resíduos ejetados) precisam ser levados em consideração.

É totalmente equivocado pensar a atividade econômica isolando-a de sua relação com o conjunto da natureza. Por isso, o diagrama do fluxo circular, estudado desde as primeiras aulas no curso superior de Economia, apresenta uma visão irreal da economia em que não entra matéria e energia, e nem sai resíduos.

Tudo parece acontecer dentro de uma “caixa” isolada do mundo físico, como se a economia pudesse produzir de forma ininterrupta usando sempre a mesma quantidade de energia. Ora, isso refuta a segunda lei da termodinâmica, a lei da entropia.

Pela lei da entropia não se pode usar a mesma energia indefinidamente, queimando o mesmo carvão ad infinitum. Qualquer sistema para continuar funcionando precisa de energia entrando, no mínimo de maneira constante.

Escreve Andrei Cechin, em “A natureza como limite da economia”, que “se a economia capta recursos de qualidade de uma fonte natural e devolve resíduos sem qualidade para a natureza, então não é possível tratar a economia como um ciclo isolado”.

Pelo pressuposto, a economia é apenas uma parte de um todo; o todo é o meio ambiente. Logo, não há como escapar da seguinte ponderação: à medida que acontece o crescimento econômico exponencial se dilapidam as bases da natureza, resultando em sensível diminuição do meio ambiente, agravando substancialmente os fundamentos naturais da vida.

Reforça-se assim a prerrogativa de que mais crescimento significa menos meio ambiente, tendo em vista que a biosfera é finita, não cresce (e jamais irá crescer), além de ser fechada (com exceção do constante afluxo de energia solar) funcionando regiamente sob as leis da termodinâmica.

Sintomaticamente, mais crescimento econômico responde pela exaustão dos recursos naturais e energéticos e pela depredação dos serviços ecossistêmicos.

Assim, é limitada à capacidade de o ecossistema terrestre suportar as pressões advindas do crescimento econômico. Os limites biofísicos constrangem o sistema econômico que, por sua vez, irrompe-se com força destrutiva, expondo o meio ambiente em constante degradação, comprometendo a capacidade de vida humana.

É necessário não perder de vista que os recursos naturais são, essencialmente, um conjunto de matéria e energia de qualidade atuando (entrando) no processo econômico. Na saída desse “cano econômico” sobra resíduo, poluição, calor e matéria dissipada. Do ponto de vista físico, o processo econômico não cria matéria e energia.

A questão ecológica mais preocupante está justamente no impacto dessa ação (a retirada de recursos naturais e a entrega de resíduos pós-produção) gerada pela atividade econômica.

Esse resíduo gerado deteriora o ambiente de várias maneiras: quimicamente, como no caso do mercúrio ou da chuva ácida; nuclearmente, como o lixo radioativo; ou fisicamente, como a acumulação de CO2 na atmosfera.

Razão pela qual o crescimento econômico - pelas bases da expansão da capacidade produtiva - entendido como condição essencial para satisfazer as necessidades humanas, precisa urgentemente ser repensado, até mesmo porque o crescimento, per si, não atende em linhas gerais aos desejos ilimitados das pessoas.

Seguindo essa linha, o desenvolvimento humano (melhoria da qualidade de vida) dependerá, pois, da retração econômica, e não de seu crescimento. Ademais, qualquer subsistema - como é o caso da economia -, em algum momento necessariamente deve parar de crescer e adaptar-se a uma taxa de equilíbrio natural.

Posto isto, a economia tradicional precisa aceitar um fato inexorável: é impossível um crescimento ilimitado num sistema que depende da existência de recursos naturais finitos.

Funda-se nesse argumento um fato imperioso: parar de crescer não significa parar de se desenvolver. É perfeitamente possível prosperar (se desenvolver) sem crescer; é factível, pois, avançar economicamente sem agredir o meio ambiente.

Por sinal, prosperidade econômica, em seu significado mais elementar, deve ser entendida como sinônimo de bem-estar, e não pode haver prosperidade – portanto, melhoria substancial na qualidade de vida das pessoas -, em ambientes constantemente expostos à degradação, reduzidos à poluição decorrente da expansão produtiva que esgota o patrimônio natural (biomassa da floresta, fertilização do solo, disponibilidade de água, solo arável etc).

Decorre disso a necessidade em promover a troca da busca incessante do crescimento (expansão quantitativa) pelo desenvolvimento (melhoria qualitativa).

Faz-se necessário, contudo, buscar um “novo modelo econômico” capaz de assegurar a preservação do espaço ecológico que responde pela continuidade da vida humana em bases mais sustentáveis, estando em conformidade com o conjunto teórico que embasa a Ciência Econômica – porém, com uma nova roupagem - voltada às ordens ecológicas, não às mercadológicas.

Para alcançar esse objetivo, é imprescindível condenar a busca pelo crescimento econômico exponencial que “passeia livremente” sobre as ruínas do capital natural (ar, floresta, solo, água) promovendo em seu rastro a mais agressiva destruição dos elementares serviços ecossistêmicos.

Faz-se oportuno ponderar que no linguajar dos economistas ecológicos crescimento econômico vai só até certo “ponto” (desconhecido). Uma vez ultrapassado esse “ponto” não há melhorias, mas sim perdas significativas (crescimento deseconômico), começando pela qualidade do ar que respiramos e pela completa destruição do espaço natural, afetando substancialmente o que se convenciona entender por qualidade de vida nas cidades, uma vez que os serviços ecossistêmicos são expostos à dilapidação. 

Crescimento além dos limites é sinônimo de vida degradada, de ambiente natural destruído. Por sinal, todo e qualquer crescimento que se expande de forma incontrolável gera consequentemente desequilíbrios ao meio ambiente.

A expansão da atividade econômica, usada como paradigma de ascensão (progresso econômico) no modo de consumir das pessoas, alimentada pela ideologia da propaganda “compre mais”, consubstanciada na obsolescência programada (desgaste dos produtos de forma induzida cujo único objetivo é acelerar o tempo de rotação do capital “forçando” assim novas vendas), tem produzido muito estrago no tocante aos serviços prestados pela natureza, configurando na expressão máxima: mais economia significa menos meio ambiente. É hora de abandonar esse modelo. Afinal, o tempo urge, e a vida tem pressa.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. prof.marcuseduardo@bol.com.br

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