Concluímos neste domingo, solenidade de Cristo Rei, o ano litúrgico 2013. É um momento de fazermos a nossa revisão de vida cristã, nos voltando para nós mesmos, a fim de sentirmos o quanto temos ainda para melhorar, a fim de nos tornarmos com o nosso testemunho a presença de Deus no mundo, assumindo o nosso papel na construção do seu Reino.
A solenidade que celebramos hoje nos convida a tomar consciência da realeza de Jesus, realeza que não deve ser entendida à maneira dos reis deste mundo: é uma realeza que se exerce no amor, no serviço, no perdão e no dom da vida. Reino de Deus significa que Deus intervém neste mundo com o seu poder de amor e de salvação; é uma ação que supera a compreensão do homem, mesmo existindo claros sinais da presença do Reino de Deus entre nós. Um destes, dentre muitos outros, Jesus proclamou tantas vezes: "Amai os vossos inimigos, rezai por quem vos caluniam".
O evangelista Lucas nos convida a ver o siinal mais evidente de como Deus reina e de como Jesus reina: "Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem". Deus reina perdoando, Jesus inaugura um mundo novo no qual o perdão de Deus é definitivamente manifestado e no qual o homem encontra força para perdoar. Com o seu perdão, Jesus supera todas as humilhações sofridas desde a sua prisão até sua santa morte na cruz. "Ele salvou os outros, por que não se salva a si mesmo, se é o Cristo de Deus". Dentre os que escarnecem de Jesus se encontram os líderes religiosos, os soldados e um criminoso. Os três fazem lembrar a tríplice tentação do diabo a Jesus, no início do seu ministério pastoral. No final das tentações se lê: "Satanás se afastou da dele até o tempo estabelecido". E, sob a cruz é chegado o momento estabelecido e satanás retorna a tentar Jesus completamente humilhado.
A provocação é a mesma: "Jesus é verdadeiramente o enviado de Deus?" E, na verdade, este é o problema fundamental do homem: onde podemos encontrar Deus? Deus nos salva em Jesus? E, como nos salva? De acordo com Lucas, o povo estava a ver Jesus na cruz. Não participa das zombarias, se contenta em olhar e contemplar. Talvez seja a contemplação de quem estaria começando a se converter? Certamente, porque o evangelista se apressa em dizer que tais pessoas batiam no peito. A contemplação de Jesus cruficado é o primeiro passo para a conversão, pois é assim que Ele se torna rei. Não poucas vezes no seu ministério pastoral Jesus nos convida ao arrependimento e à conversão. E na cruz o próprio Jesus nos apresenta um modelo de arrependimento e de conversão: o ladrão arrependido. Não é um arrependimento por razões humanas nem por simpatia por Jesus ou ainda por bons sentimentos que brotam espontaneamente. O ladrão arrependido se converte porque, com os olhos da fé, descobre quem é verdadeiramente aquele Jesus que se encontra a seu lado. Somente descobrindo quem é Jesus para nós, podemos nos converter. O que ele diz para o outro ladrão, crucificado com Jesus: "Não temes a Deus"? É um convite para se ter ao menos o temor de Deus, uma vez que não teve medo de fazer o mal aos outros. O temor de Deus é o princípio da sabedoria e o ladrão arrependido convida seu companheiro a tê-lo.
Temer a Deus é a disposição de quem reconhece a própria indignidade diante de Jesus e reconhece a grandeza do seu amor e do seu modo de agir, mesmo diante de situações desconcertantes. No caso do ladrão arrependido o temor de Deus significa o reconhecimento do seu próprio pecado: "Nós recebemos o castigo pelo mal que fizemos". por outro lado reconhece que Deus está presente em Jesus e age em Jesus. De fato, é inocente(ele não fez nenhuma mal) e se sabe que Deus está com os inocentes; por isso, não pode estar longe de Jesus. Pois se morre pedindo ao Pai para perdoar, não pode se encontrar distante de Deus. A segunda atitude do ladrão arrependido é a oração. Se Deus não se encontra distante de Jesus, é a ele a quem se deve pedir. É o único caso em todo evangelho em que um homem se dirige a Jesus chamando-o com seu próprio nome: "Jesus, lembra-te de mim quando estiveres em teu reino". Aqui se dá o passo decisivo na revelação de Jesus ao ladrão arrependido: "Hoje mesmo estarás comigo no paraíso".
Uma resposta solene de Jesus, que traduz a manifestação de Deus, a salvação, a realeza que o ladrão esperava para o futuro aontece no presente, ou seja, através da cruz. Jesus tem no presente o poder de nos salvar, porque é a sua morte que nos salva: basta que se suplique com humildade. O paraíso é, por isso, estar com Jesus. Será a plena realização da presença de Deus em nós e conosco, presença que já neste mundo é real. Com sua santa morte se torna o centro de todo universo e que tudo para ele converge.
Cabe, por último, nos perguntar: Jesus crucificado e ressuscitado ocupa a centralidade da nossa vida ou há outros deuses e referências que usurparam o seu luga? Quais são esses outros "reis" que ocuparam o "trono" que pertence a Cristo. Esses "reis" trouxeram "mais valia" à nossa vida ou apenas criaram escravidão e desumanização? Somente descobrimos o Reino de Deus na cruz do cruficado. Quem não vou capaz disso, jamais entenderá o que significa: Cristo Rei.
*Doutor em Direito Canônico, Presidente do Tribunal Eclesiástico do Ceará e professor da Faculdade Católica de Fortaleza
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