Livro narra, em estilo jazzístico, a paixão do escritor americano e de sua mulher pelo álcool.
Por Carlos Ávila*
"É preciso estar sempre bêbado", decretou o poeta francês Baudelaire, ainda no século 19. Álcool e literatura andam juntos há séculos. As "libações" etílicas já estavam na "Odisseia" homérica; o persa Omar Kháyyám, no ano 1040 da era cristã, exaltava o vinho e a embriaguez: “Mais vale uma taça de vinho que o poder, a glória e as riquezas”. No século 20, grandes escritores estabeleceram uma tumultuada “parceria” com o álcool: Hemingway, Faulkner, Dylan Thomas... No Brasil, lembre-se de Vinicius de Moraes (“o uísque é o melhor amigo do homem, o uísque é o cachorro engarrafado”).
Um dos grandes escritores que vivia “movido a álcool” era o autor do romance “O Grande Gatsby” (já filmado e refilmado por Hollywood, com sucesso): F. Scott Fitzgerald (1896/1940). Scott era amigo do scotch (ou seja, do bom uísque de malte feito na Escócia); como também do champanhe e do vinho. Ele e sua mulher, a maluquete Zelda. Ambos eram americanos autoexilados na Paris dos anos 1920, frequentadores das melhores festas e rodas intelectuais; dissipadores de talento e dinheiro; curtidores da riviera francesa, da boa mesa e do melhor álcool.
“Pileques: drinques e outras bebedeiras”, publicado recentemente pela Companhia das Letras, reúne textos confessionais, aforismos e cartas de Fitzgerald - num estilo algo jazzístico - registrando as delícias e os desastres da opção pelo ramal etílico. O escritor vivia constantemente algumas doses acima da realidade, numa espécie de porre contínuo, onde o bar se transformava em lar. “A única finalidade do cabaré é reunir homens descomprometidos e mulheres complacentes. O resto é perda de tempo numa atmosfera viciada” - sentenciou num de seus textos, citando seu amigo Hemingway, que no fim da vida em Havana detonava uma fileira de mojitos (o famoso drinque cubano que leva rum, limão e hortelã).
Após o intenso período parisiense, regado a muito álcool e desregramentos vivenciais, Fitzgerald voltou detonado para os EUA (Nova York e depois Los Angeles), nos anos 30; Zelda (com quem teve uma filha) enlouqueceu e terminou num hospício; seu talento quase desapareceu, escrevendo roteiros banais em Hollywood, já com a mente dissolvida pelo álcool que tanto exaltou. Morreria pouco depois, aos 44 anos, deixando obras primas como “Gatsby” e “Suave é a Noite”, livros de escrita refinada. Sua vida breve foi certeiramente definida por ele próprio num dos seus “desaforismos”, selecionados de seus cadernos de notas: “Bêbado aos vinte, devastado aos trinta, morto aos quarenta”.
*Carlos Ávila é poeta e jornalista. Publicou, entre outros, Bissexto Sentido e Área de Risco (poesia); Poesia Pensada (crítica) e Bri Bri no canto do parque (infantil). Foi, por quatro anos (1995/98), editor do “Suplemento Literário de Minas Gerais”. Trabalhou também na Rede Minas de Televisão e foi editor do caderno de cultura do jornal “Hoje em Dia”. Participou de mais de vinte antologias no país e no exterior.
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