terça-feira, 3 de junho de 2014

As raízes espirituais do papa


Em sua essência, unem-se os Exercícios Espirituais e a devoção a Nossa Senhora de Luján.
Por Giacomo Galeazzi

Um papa inaciano e mariano. Nas raízes espirituais de Francisco, unem-se os Exercícios Espirituais e a devoção a Nossa Senhora de Luján. O Vatican Insider conversou com os quatro principais estudiosos do pontificado de Jorge Mario Bergoglio para entender as peculiaridades da sua fé.
 
Andrea Riccardi, historiador do cristianismo e fundador da Comunidade de Santo Egídio, destaca a figura de Santo Inácio de Loyola, que teve uma influência evidente no caminho espiritual do jesuíta: Bergoglio, tanto em seu discernimento como em seu “homem da Bíblia”. E se deve acrescentar, indicou o professor Riccardi, a "profunda devoção mariana", que encontrou expressão sobretudo na experiência no Santuário de Luján e, em particular, na convicção de que Maria é a mãe nos momentos difíceis.
 
Alberto Melloni, professor de História do Cristianismo na Universidade de Módena e titular da Cátedra Unesco sobre a pluralidade religiosa e a paz na Universidade de Bolonha, dirige a Fundação para as Ciências Religiosas João XXIII de Bolonha. Segundo Melloni, em Francisco é evidente “a marca mariana, forte e sóbria, de todo o catolicismo sul-americano; ou seja, uma devoção baseada nos afetos mais que nas aparições: uma Virgem maternal e não milagrosa”. Para Bergoglio, “reflete uma piedade popular pelos sacramentos e tem uma sensibilidade litúrgica pós-conciliar”, esclareceu Melloni. De fato, Jorge Mario Bergoglio “foi ordenado sacerdote em 1969, razão pela qual é o primeiro Papa que nunca celebrou com o Missal de São Pio V”.
 
O também jesuíta Antonio Spadaro, diretor da revista La Civiltà Cattolica, relaciona os dois pontos de referência da espiritualidade de Francisco: “Nos Exercícios Espirituais, a referência a Maria é fundamental – observa o padre Spadaro. Santo Inácio exorta constantemente a dialogar com a Virgem e, nos momentos mais importantes, sempre está a referência a Nossa Senhora. Francisco é particularmente devoto de “Nossa Senhora Desatadora dos Nós”, e sempre foi como peregrino parra Santa Maria Maior, lugar da memória para os jesuítas, porque ali Santo Inácio celebrou sua primeira missa”.
 
Jorge Mario Bergoglio, explicou Spadaro, faz sua a “tradição da devoção do povo” e está muito vinculado à adoração cotidiana, “tempo de alimentação espiritual e de gestação para decisões e reflexões”. Ou seja, uma espiritualidade “baseada no povo e não somente no sujeito”, defendeu Spadaro. “À tradição puramente ascética da Companhia de Jesus, prefere a tradição mais mística de raízes francesas: o silêncio e a prática exterior servem para o diálogo com Deus, mas não têm um valor em si”. Por isso, insistiu Spadaro, “compreende-se quão radicalmente Jorge Mario Bergoglio segue a profundidade da meditação jesuíta”.
 
Giovanni María Vian, historiador do cristianismo e diretor do L’Osservatore Romano, falou sobre a gratidão de Francisco para com a “transmissão feminina da fé”. Não é por acaso que o Pontífice, relacionando-a com os primeiros tempos, “tenha citado uma passagem do epistolário paulino no qual se fala de mulheres que transmitiram a fé”. O último gesto que o confirma, explicou Vian, foi o bilhete que o Papa deixou no Muro das Lamentações, no qual Francisco escreveu “a oração do Pai Nosso e especificou que a tinha escrito na língua em que a havia aprendido da sua mãe”. Compreende-se, continuou, “sua espiritualidade mariana e a devoção pelas imagens da Virgem, que era própria também de Santo Inácio”, pois “Maria é o melhor exemplo de discípulo do Senhor e expressa cabalmente o vínculo entre o judaísmo e o cristianismo”. De fato, Maria é a nova Eva, segundo os Padres da Igreja, e o Papa Francisco retoma a riquíssima simbologia que identifica a Virgem com a Igreja”. Vian concluiu: “Maria é o tipo de crente mais perfeito e o ponto de união entre Israel e a Igreja”. A espiritualidade de Francisco está “impregnada dela”.
Vatican Insider, 02-06-2014.

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