sexta-feira, 27 de junho de 2014

E se não ganharmos a Copa?

A hipótese da derrota em casa faz ressurgir em cada um de nós o fantasma de 1950.

Por Carlos Eduardo Leão*

É a pergunta que não quer calar. Por onde ando ouço a mesma cantilena, a mesma ladainha, o mesmo presságio. A bem da verdade, já não aguento mais essa Copa. É uma overdose de futebol sem precedentes ou, como diria aquela nulidade abissal,  "como nunca antes na história desse país". Não bastassem três partidas por dia que já dão assunto para o resto da tarde, noite e madrugada afora, ter que conviver com a hipótese da derrota em casa faz ressurgir impiedosamente em cada um de nós aquele célebre fantasma de 1950, responsável pelo maior trauma nacional desde Cabral.

Eu nem era nascido, mas o trauma parece perpetuado cromossomicamente nas nossas vidas. É como se um vírus da decepção se apoderasse de todos os brasileiros vivos à época e invadisse, sem cerimônia,  suas entranhas genéticas para que passassem às suas descendências toda aquela tristeza que não há pajelança, vodu, reza brava, macumba ou coisa do gênero que consiga apagá-la de nossas memórias.

Se pensarmos friamente, não é uma coisa normal o poder que o futebol exerce sobre nós, principalmente sobre nós, brasileiros. E olha que tivemos guerras tupiniquins, passamos pelas guerras mundiais, epidemias, desastres ecológicos, dengue, Lula, Dilma, PT, mas o grande trauma continua sendo o Maracanaço de 50. Imaginem se agora perdermos para Argentina? Sim, porque perder novamente para o Uruguai seria a triste confirmação de que Deus é mesmo argentino. Já chega Francisco! Tá de bom tamanho! E sabedores do que isso representaria para nós, não tenho dúvida de que os argentinos são uruguaios desde criancinhas.

Se pensarmos friamente de novo, não faz sentido esse fascínio, mesmo com todo o romantismo de outrora protagonizado por Pelé, Garrincha e cia que viveram uma época de verdadeiro amor à camisa, manto sagrado para todos que a defendia com raça e honra. A cena de um comboio do exército trazendo, pelas avenidas do Rio, 3 milhões de dólares em dinheiro vivo para que os jogadores de Gana continuassem na Copa, reflete o que o futebol é hoje. Isso sem falar que os camaroneses atrasaram a sua chegada ao Brasil porque não embarcariam sem a bufunfa no bolso. As fortunas, em torno de meio bilhão de dólares, amealhadas  pelas principais estrelas do torneio e um pouco menos do que isso por outras estrelas de menor brilho, representam uma afronta a um mundo em  que ainda se morre de fome.

Nessa mesma toada de "se pensarmos friamente", a mordida que o canibal Luisito Suárez deu no jogador italiano serviu para nos mostrar o despreparo psicológico e até mesmo traço psiquiátrico que reina entre os atletas mais violentos do certame, onde socos, pontapés e cotoveladas sobressaíram às grandes jogadas de Messi e Neymar.

Por essas e por outras, se o Brasil perder a Taça, a minha vida e, acho, a vida dos que me lêem nesse momento, continuarão as mesmas. Mesmo porque existem coisas piores que perder uma Copa em casa como, por exemplo, Luis Roberto Barroso ser o novo relator dos mensaleiros e permitir que Zé Dirceu conspire durante o dia sob a alcunha de bibliotecário de uma banca de advocacia.

Pensando pelo lado positivo, se o Brasil perder a Copa vai sobrar mais tempo, mais empenho e mais discernimento para a coisa política que se avizinha. Aqui sim poderemos dar ao mundo verdadeira demonstração de competência, seriedade e compromisso cívico ao mandarmos para escanteio toda a incompetência que se apoderou da nação há 12 anos. Se ganharmos, teremos a oportunidade única de mostrar ao mundo que a nossa competência é universal.

Em tempo: de nada adiantou a excelente defesa que o advogado do Fluminense, contratado pela seleção uruguaia, fez do seu cliente, o canibal Luis Suárez. A sua teoria de que "foi apenas um beijinho no ombro do atleta italiano", foi rejeitada pela FIFA que o puniu com 9 jogos. Pelo menos alguma coisa de bom fez a próspera empresa de Joseph Blatter que, na calada da noite carioca, aumentou o seu salário e de seus diretores em módicos 200%.

*Carlos Eduardo Leão é médico e cronista
Redação Dom Total

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