A pergunta que não sai de corações e mentes: valeu a pena gastar tanto dinheiro?
Por Luiz Ruffato
Aumentou consideravelmente o fluxo de prostitutas para a cidade de São Paulo. De garotas de programa que estipulam seu preço em até 800 reais por encontro até as que cobram 50 reais por cliente, muitas estudaram inglês ou espanhol para melhor desempenhar seu papel. O turismo sexual, que contou sempre com o aval oficial nas propagandas do Brasil no exterior, por meio da venda da imagem do país relacionada a mulheres seminuas, deve se constituir no principal legado desta Copa do Mundo que começa quinta-feira. Triste legado.
Mais de um mês antes do inicio dos jogos, inúmeros sites já estavam colocando à venda, com descontos de até 70%, camisas e bonés da seleção brasileira. Em outros tempos, essa seria uma noticia inimaginável. Estampar o orgulho exibindo a bandeira nacional nas janelas ou pintando-a no chão de asfalto ou colando-a no vidro dos carros era quase uma obrigação. Torcer pelo uniforme canarinho, um privilégio. Já existem, no entanto, muitas pessoas que questionam nas ruas, em conversas privadas, ou publicamente, em entrevistas, se vale a pena toda essa dedicação. O que ganhamos com isso, perguntam?
De todos os escândalos relacionados à construção dos estádios destinados à Copa do Mundo, certamente o mais absurdo deles reside em Manaus. A Arena Amazônia, com capacidade para 39 mil pessoas, receberá quatro jogos da primeira etapa. O mais bem colocado clube local no ranking é o Nacional, que este ano disputa a quarta divisão do Campeonato Brasileiro. Sua média de público no ano passado foi de 901 torcedores. Nele foram gastos 604 milhões de reais, 100 milhões a mais que o previsto. O que será feito da Arena Amazônia, depois que forem disputados os quatro jogos? Ninguém sabe.
Os estrangeiros perguntam, pasmos, mudou o futebol ou o povo brasileiro? Na verdade, talvez tenham mudado ambos. Os campos de futebol da periferia, os chamados campos de várzea, foram aos poucos desaparecendo, devido à especulação imobiliária, substituídos pelas escolinhas de futebol. E os jogadores, antes heróis da tenacidade popular, hoje limitam-se a ostentar símbolos de riqueza. Mudou o tamanho do interesse pelos jogos. Embora continuemos amantes do futebol, sabemos que há um abismo imenso entre o jogo jogado dentro de campo e a vida que acontece fora das quatro linhas. Essa, infelizmente, vem se tornando cada vez mais dura.
Quando, há sete anos, o Brasil foi confirmado como país sede da Copa do Mundo de 2014, vivi uma pequena epifania. Fiz planos de alguns meses sabáticos, em que além de alguns jogos assistidos em São Paulo, ainda não sabia em que estádio, acompanharia todas as partidas realizadas nas outras cidades. E veio então a decepção. A diferença entre o custo previsto e o preço final dos estádios ultrapassa os 30%. Oito operários morreram durante as obras. Boa parte da infraestrutura de acesso aos estádios não será realizada. E as denúncias de corrupção pululam na imprensa. Além disso, o preço dos ingressos, o preço oficial, varia entre R$ 60 e R$ 1.980 - e todos sabemos que esses valores, a medida em que a seleção brasileira avançar, vão ser inflados pela venda no câmbio negro. Por tudo isso, sete anos depois, decidi que não iria assistir aos jogos no campo... Apenas na televisão...
O que vai acontecer durante os jogos da Copa do Mundo? Essa é a pergunta que mais me fazem. Não sei responder. Espero que, no final, ganhem os brasileiros.A festa que pode não acontecer. Veja o vídeo:
*Luiz Ruffato, escritor brasileiro, é cronista do jornal El País
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