Por Joan Chittister
Organismos inteiros de pessoas estão em movimento, indo adiante, enquanto que os bispos permanecem em repouso. E o mais importante de tudo: quando finalmente a hierarquia pediu por uma resposta da Igreja em geral sobre algo importante – matrimônio, família, relacionamentos –, propostas jorraram de vários grupos de leigos. As informações eram claras: o laicato estava ansioso para responder ao pedido. Seus membros quiseram fazer parte do diálogo. Quiseram dar de volta à Igreja os frutos do sacramento que a Igreja lhes concedeu.
Mas não apenas numa área ou a partir de um grupo somente.
Por exemplo, a Associação de Padres Católicos – APC irlandesa pediu aos seus bispos representantes para apresentarem três propostas à Conferência dos Bispos Católicos da Irlanda com vistas de encaminhá-las a Roma. As propostas incluem a aceitação de padres casados, a ordenação de mulheres para o diaconato e um chamado para padres laicizados ao ministério sacerdotal.
Segundo se lê nas atas de suas reuniões, os membros da APC sabem que “suas propostas vão causar inquietação e dificuldades”, mas que são, todavia, essenciais para “garantir o acesso regular à Eucaristia por parte dos fiéis irlandeses”. Em 1984, havia 171 ordenações na Irlanda. Em 2006, havia 22. Em 2013, tinha somente 70 seminaristas em todo o país ainda pensando sobre o sacerdócio.
O problema é que propostas como estas têm sido apresentadas a partir de várias regiões da Igreja universal. Não houve, no entanto, nenhuma consideração do “corpo em repouso”. Tivemos apenas uma reprimenda para sequer pensarmos sobre o assunto.
Aqui, no nosso caso, uma rede de católicos e cristãos mundial iniciada nos EUA (a Catholic Church Reform International), em colaboração com mais de uma centena de organizações religiosas e indivíduos de 65 países, está propondo a todos os católicos terem uma voz influente nas tomadas de decisão na Igreja.
Eles estão levando o papa a sério. O Papa Francisco convidou a Igreja a se preparar para o próximo Sínodo dos Bispos sobre a família, ao pedir aos fiéis para relatarem a seus bispos suas próprias respostas à sondagem/pesquisa papal sobre o assunto.
Na verdade, a Catholic Church Reform International está querendo que todas as formas de vida familiar sejam representadas e convidadas a participar do Sínodo que está por vir. Eles “querem uma voz dentro da Igreja”. O documento da organização é claro: “Precisa-se compreender tanto o conhecimento quanto a experiência dos desafios enfrentados pelas famílias antes que resoluções significativas possam ser alcançadas”.
E os que subscrevem estas ideias estão preparados para fazer isso acontecer.
Pedem ao Sínodo para realizar quatro coisas:
1. Abençoar os que escolhem viver juntos em preparação para o casamento bem como os que formam novos relacionamentos após seu casamento se romper.
2. Dizer que a encíclica Humanae Vitae foi um engano. Querem que a Igreja enfatize a alegria do casamento em vez de encontrar novas coisas para condenar. Dizem esperar que a Igreja aconselhe os cônjuges sobre os valores e as práticas que promovem genuinamente a abertura à vida. Parece que querem mais da Igreja do que somente outra lista de pecados.
3. Tratar todas as pessoas com o mesmo respeito, independentemente da orientação sexual delas e abster-se de fazer do gênero uma definição dos papéis e tarefas, seja na Igreja ou na sociedade.
4. Proclamar a verdade de que a Igreja se expressa através do sensus fidelium, através dos “padres, religiosos e das pessoas, que ensinam e aprendem juntos”.
Além disso, estas questões e os documentos que as sustentam já foram entregues ao escritório do Sínodo, aos principais escritórios da Cúria e a todos os 114 presidentes de conferências episcopais ao redor do mundo.
O objetivo, dizem os proponentes, é ajudar as pessoas a compreender que a Igreja é delas e encorajá-las a se manifestarem com franqueza.
Este é claramente um corpo em movimento.
Ao usar os seus documentos de posição para lançar o debate sobre os tópicos da agenda, o grupo está realizando encontros regionais ao redor do mundo a partir dos quais recolhe as respostas ao questionário do próprio Vaticano, que circulou – ou não – pelos países e dioceses. A falta de atenção séria à própria sondagem se tornou um comentário sobre o valor que os próprios bispos atribuíram – ou não – aos insights dos leigos sobre a vida familiar no mundo.
O mais importante de tudo isso é que a Catholic Church Reform International está fazendo um convite aberto a qualquer um que deseja participar em seu “Fórum sobre a Família: escutar aos fiéis”, a se realizar nos dias 2 e 3 de outubro no oratório jesuíta de São Francesco Saverio del Caravita, em Roma.
Pouco antes da abertura do Sínodo sobre a família, o relatório-síntese das respostas regionais produzido aí será entregue ao escritório do Sínodo.
É claro que para cada ação há uma reação, como ensinam os físicos. E esta reação do laicato sobre a “família”, como existe hoje, está vindo do coração das pessoas sobre cujas vidas o Sínodo irá se pronunciar.
Os que apoiam a Catholic Church Reform International estão vindo a Roma, dizem, para demonstrar solidariedade ao Papa Francisco, acolhendo o seu Sínodo extraordinário. E estão levando um presente consigo: estão levando os seus próprios testemunhos, os frutos de um discernimento internacional que já dura um ano a respeito de questões sobre as quais o próprio papa pediu à Igreja para pensar.
A única dúvida é como este interesse, discernimento, participação e experiência irão ser recebidos.
De onde estou, e parece que não são poucas as vezes, respostas como esta foram recebidas com surpresa ou espanto pelos mesmos bispos que deveriam estar avisando Roma quanto aos insights dos leigos sobre questões importantes. Em vez disso, o próprio pensamento de que a voz do povo ecoa a através da Igreja incitou alarme demasiadas vezes. Por exemplo, isso aconteceu em Trento.
De fato, esta tensão entre movimento e repouso levanta uma dúvida que pode se mostrar ser mais importante para o futuro da Igreja do que as próprias questões colocadas. Antes que seja tarde demais, alguém precisa perguntar aos físicos o que acontece quando a reação a uma ação é simplesmente descartada.
National Catholic Reporter, 03-07-2014.
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