quarta-feira, 2 de julho de 2014

Falta contestação no rock atual, dizem Titãs

Músico defende ao G1 que roqueiros devem 'colocar temas em discussão'.
'Não há nenhuma banda de rock fazendo um álbum como 'Nheengatu'', diz.

Rodrigo OrtegaDo G1, em São Paulo
Formação atual dos Titãs, da esquerda: Tony Bellotto, Branco Mello, Sérgio Britto e Paulo Miklos (Foto: Divulgação)Formação atual dos Titãs, da esquerda: Tony Bellotto, Branco Mello, Sérgio Britto e Paulo Miklos (Foto: Divulgação)
Branco Mello vê um objetivo comum entre gritos raivosos do disco mais recente dos Titãs e seu encontro com músicos de funk, sertanejo, axé e outros no programa de Fátima Bernardes. Para o músico, mesmo que não haja influência direta entre trabalhos na TV e na banda, ambos têm como fim contestar o preconceito. "O 'Encontro' é muito aberto musicalmente. Nosso disco fala sobre isso, sobre não ter preconceito", diz ao G1.
Os Titãs discutem preconceito e outros temas no novo álbum, o roqueiro "Nheengatu". O nome vem da língua geral que tentou promover a comunicação entre índios e colonizadores no Brasil. Branco Mello diz que o objetivo da banda era fazer "um discaço".
Temas como violência policial ("Fardado"), abuso sexual ("Pedofilia") e racismo ("Quem são os animais?") aparecem. Para Branco, falta contestação no rock atual. "O rap assumiu essa voz. Acho bárbaro que estejam questionando. O rock estava com essa lacuna vazia", diz o músico de 52 anos.
G1 - A que você atribui a má fase comercial do rock no Brasil?
Branco Mello -
 Não tenho a menor ideia. Talvez porque não seja um momento muito bom para o rock mesmo, estão tocando outras coisas. Mas me parece que as rádios rock estão voltando. O público está começando a querer mudança. Talvez a gente consiga reverter esse quadro um pouquinho. Seria muito bom. O Brasil é muito grande e cabe tudo: funk, rock, samba, axé, pagode. Tem para todo mundo.
Nós fomos acumulando o desejo de um 'discaço' com contundência
Branco Mello,  cantor e baixista
G1 - Por que decidiram lançar um dos discos mais roqueiros da banda neste contexto?
Branco Mello - É uma coisa do espírito dos Titãs. Estamos sempre na contramão da história. No começo dos anos 80, gravamos dois discos bem pop. De repente fizemos o "Cabeça dinossauro", deu aquela guinada. De tempos em tempos isso acontece.
Estávamos há cinco anos sem gravar inéditas, fomos acumulando o desejo de fazer um 'discaço' com contundência. Percebemos que quem está abrindo as discussões são os rappers. O rap assumiu essa voz. Acho bárbaro que estejam falando, contestando, questionando. O rock estava com essa lacuna vazia. Para os Titãs, coincidiu de o momento ser propício e querermos falar sobre isso. Mandamos ver, como a gente sempre fez.
G1 - Essa lacuna do rock que você citou é de contestação?
Branco Mello - 
É, uma coisa de colocar certos temas em discussão, questionamentos. A gente não é movido pelo que o rádio está tocando. Mesmo quando tocou em rádio, não foi feito para isso, e sim por ser um barato daquele momento.
Titãs é uma espécie de unanimidade"
Branco Mello. cantor e baixista
G1 - No 'Encontro com Fátima Bernardes' você tem contato com músicos populares que hoje investem em temas festivos. Vocês tem uma visão mais crítica. Esse disco foi uma forma de se contrapor ao oba-oba?
Branco Mello - Acho que não. Não há antagonismo entre o que a gente faz e o que fazem outros artistas, populares ou não. Pelo contrário. Aprendo muito no programa. Conheço trabalhos que normalmente não ouviria. Todos eles gostam muitos da gente. Titãs é uma espécie de unanimidade. Pela nossa história, por esses 32 anos. Troco energia e informação com esses músicos de todos os tipos. É muito emocionante. O "Encontro" é aberto musicalmente. Nosso disco fala sobre isso, sobre não ter preconceito.
G1 - Então o trabalho no programa influenciou de alguma forma nos Titãs?
Branco Mello - Não ter preconceito não quer dizer isso. Com 32 anos de carreira, eu já tenho uma formação musical minha. Tanto que estou fazendo um disco que acho que é único. Não tem nenhuma banda de rock fazendo um disco como "Nheengatu". O fato de eu estar conhecendo outros artistas não necessariamente me faz ser influenciado pela música deles. Ao mesmo tempo é muito legal, eu me divirto muito.
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Não tem nenhuma banda de rock fazendo um disco como 'Nheengatu"
Branco Mello, cantor e baixista
G1 - Vocês já definiram o disco como retrato instantâneo do Brasil. Como a situação política e social te afeta, especialmente os protestos desde 2013
Branco Mello - A gente está fazendo nesse disco uma crônica dos acontecimentos, das mudanças no Brasil. Em todas essas manifestações existe um aprendizado, sobre como lidar com o exercício democrático, como a polícia vai se comportar. Isso coloca em questão temas importantes atuais que tem que ser discutidos para melhorar nosso presente, nossa vida, nosso país. Tem coisas que não podem mais acontecer e ainda acontecem. O disco toca em vários tabus. Pedofilia [por exemplo], que em música ninguém fala. O rock também tem a função de colocar essas coisas em discussão.
G1 - Comparando com 'Cabeça dinossauro', é mais fácil ou colocar temas em discussão hoje? Têm visto mais ou menos polêmica?
Branco Mello -
 Até agora só vi coisas muito positivas, por parte da imprensa e do público. Não tem nem polêmica. As pessoas estão assimilando, ouvindo o disco, refletindo, falando em redes sociais. Não sabemos se vai tocar em rádio. O disco é essa crônica do Brasil. Tem as músicas dos índios, samba, pífanos, música nordestina, frevo, rock pesado, figuras da cultura brasileira. Acho que o disco está bem claro, contundente, dando a nossa opinião.
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Titãs encerra apresentação no sábado em Botucatu (Foto: Divulgação)Titãs, atualmente um quarteto, formação que lança o disco 'Nheengatu' (Foto: Divulgação)

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