quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Comendo música

Gilmar P. da Silva SJ*
Uma coisa é ouvir música; outra, fazer experiência estético-musical. E aqui a diferença é qualitativa. No primeiro caso, a música pode ficar desprovida de significado, parecendo até que o som entra por um ouvido e sai pelo outro. No segundo caso, não. Não só a música entra na pessoa, como a pessoa entra na música, o que consiste em uma autêntica relação estética com aquilo que se ouve, experiência de imersão.

De tanta música produzida pela indústria fonográfica, apesar da muita execução, poucas tocam. Algumas até entretém, mas nem todas satisfazem. A diferença entre elas é parecida com aquela entre experiência gastronômica e o ato de fazer um lanche em rede de fast-food. Música é como comida. Pode lhe encher e não satisfazer, pode ser ouvida sem ser saboreada, pode ser simples ou muito elaborada, pode ser industrializada ou vir imbuída de carga afetiva. Sempre há uma comida e uma música que lhe recorda alguém ou alguma história. Ouve-se como se come.

Talvez música também tenha cor, cheiro, textura e sabor. E se não se pode atribuir todas essas característica à musica por si mesma, ao menos pode-se dizer da experiência musical em seu caráter imersivo. É o que acontece com a produção do grupo curitibano Ruído/mm. Sua sonoridade tem a capacidade de reportar o ouvinte a um mundo de imagens e sensações. Uma música repleta de camadas, cujos diversos sabores parecem penetrar as papilas gustativas da alma. Com frequência, a banda faz parecer que aquilo que se ouve é trilha sonora de algum momento da própria vida. Suas músicas têm a cor dos sentimentos vividos como as imagens da recordação que elas suscitam têm o cheiro dos acordes.

O que diferencia o grupo, entretanto, é o tempo de maturação no preparo de sua música. Foram 3 anos desde o último álbum: “Introdução a cortina do sótão”. Esse tempo de cozimento se dá não só pelo fato de os músicos não viverem exclusivamente da banda, mas pela riqueza própria do processo criativo. A nova produção, que deve ser lançada em diversos formatos – CD, LP e Digital –, é como uma depuração das três anteriores e, talvez por isso, seja difícil de ser catalogada. Há muita experimentação, post-rock, elementos de clássico, mas não se restringe a isso. A riqueza da experiência se dá pela sutileza de cada nota – expressão comum à música e à culinária – que talvez só possa ser percebida com uma boa degustação. Saboreie o ruído a cada milímetro.
 
Onde degustar?
 
Pré-lançamento do álbum no teatro Cleon Jacques, dia 23 de Agosto, em Curitiba. Lançamento no dia 27 Setembro, Teatro do Sesc da Esquina, em Curitiba. Outras informações na página da banda: https://www.facebook.com/ruidomm
 
Aperitivo

Deguste o vídeo de Peti-Pavé: http://goo.gl/XbSuhO

*Mestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa em Signo e Significação nas Mídias, Cultura e Ambientes Midiáticos. Graduação em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Possui Graduação em Filosofia (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Experiência na área de Filosofia, com ênfase na filosofia kierkegaardiana.

Um comentário:

  1. Para.mim a música deve nos reportar a um mundo de imagens e sensações.
    Ela tem que tocar o meu coração para que faça parte da minha memória afetiva. Excelente abordagem!

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