sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Força moral

Os republicanos não fizeram outra coisa senão boicotar Obama e frustrar suas promessas na área social

Quando o Barack Obama lançou seu plano nacional de saúde muitos americanos foram para as ruas manifestar seu apoio e agradecer a novidade. Que tardava, já que os Estados Unidos eram a única potência industrial do mundo que não tinha um plano de cobertura universal. Isto pensaria você, e pensaria errado. As manifestações, insufladas por seguradoras e pelo lobby dos programas de saúde particulares, eram contra o plano. O chamado “Obamacare” teve um começo meio turbulento, mas agora funciona bem, beneficiando principalmente pobres e desempregados — o que não impediu que continuasse a ser combatido pelos interesses contrariados e pela oposição republicana, que vê nele mais uma prova de que Obama quer levar o país para o socialismo. Durante todo o primeiro mandato do presidente os republicanos, com maioria na câmara dos deputados, não fizeram outra coisa senão tentar boicotar seu governo e frustrar todas as suas promessas na área social. O Baraca tinha uma escassa maioria democrata no Senado com a qual dialogar. Depois das eleições da semana passada, não tem mais. O país foi para a direita e o deixou falando sozinho.

Você e eu pensaríamos que um plano abrangente de saúde que assegurasse atendimento a todo mudo teria uma força moral capaz de derrotar qualquer conveniência política ou econômica. “Força moral”, eu sei, não é um poder reconhecido num mundo regido pela ganância e pelo cinismo. Nem na esquerda, onde soa como sentimentalismo burguês inútil. Mas há dias li uma matéria da Naomi Klein (canadense, autora de “No logo”, “A doutrina do choque” e outros livros de crítica aos desmandos do capitalismo) que trouxe um novo alento a este coração ingênuo. Naomi comparava a campanha pela abolição da escravatura ao atual movimento para salvar o planeta das agressões dos humanos à Natureza, que estão nos levando para uma cucuia de proporções ainda indefinidas. E ela lembra que foi uma revolta contra a desumanidade da escravidão, portanto uma reação moral, que forçou a abolição. Não foi pouco o que o império britânico, por exemplo, perdeu junto com o direito de explorar a escravidão. Só as suas plantações de açúcar no Caribe no século XVIII, totalmente dependentes do trabalho escravo, davam mais lucro aos ingleses do que todas as suas outras colônias reunidas. E foi no parlamento inglês que a revolta moral contra a escravidão tomou forma relevante, apressando a abolição. Nos Estados Unidos, entre várias outras razões econômicas e geopolíticas para forçar o Sul a renunciar à escravidão, sua simples imoralidade anticristã foi decisiva. No Brasil só demoramos um pouco mais para nos escandalizarmos.

A direita republicana que agora domina os Estados Unidos não acredita que os humanos estejam causando o envenenamento do planeta. Ou que, se estão, isto seja razão para mudar os velhos hábitos e atrapalhar os negócios. Vamos ver o que a força moral pode contra eles.

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