segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Um Simón nada bolivariano

17/11/2014  |  domtotal.com

Uma imersão na vida de um Libertador que pouco teve a ver com o tal ‘bolivarianismo’.

Por Camila Moraes*
Era uma vez um homem nascido em Caracas em 1783, no seio de uma família rica de criollos (descendentes de europeus nascidos na América), que quando cresceu enveredou para a política e – cansado da dominação da Espanha nas terras que habitava, assim como em áreas vizinhas – decidiu levar adiante um processo independência da indesejada coroa espanhola. Fez alianças, criou certa liderança, mas sem necessariamente defender valores republicanos e democráticos, e finalmente tornou-se "o herói da independência” de Bolívia, Colômbia, Equador e Venezuela.

Muitos dizem que, por trás de sua empreitada, havia basicamente interesses de fundar o próprio poder, assim como afirmavam que ele era um mulherengo de marca maior. Por essas e por outras razões é que Simón José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar y Palacios Ponte y Blanco – o Simón Bolívar – morreu sozinho e longe de casa aos 47 anos, doente de tuberculose ou talvez envenenado por inimigos, em Santa Marta, na costa atlântica colombiana. Muito se falou sobre ele desde 1830, o ano de sua morte, mas digamos que ele só reviveu de fato quando Hugo Chávez, o ex-presidente venezuelano, decidiu torná-lo seu herói pessoal e uma espécie de símbolo do
tipo de nação que desejava forjar. E, mais ou menos assim, surge o conceito de “bolivarianismo”.

O que Simón Bolívar teria a ver com a pesada carga socialista que lhe atribuem, assim como com a história política do Brasil, terra da qual ele jamais se aproximou, não se sabe. Mesmo assim, aterrissou recentemente no país a ideia equivocada (já na Venezuela) de que Bolívar pode estar atuando sobre um lado de nossa vida política, atualmente tão polarizada. Para esclarecer essa questão, não nos resta outra saída que investigar quem era esse personagem, e uma imersão sem compromisso na trajetória dele durante um fim de semana pode ajudar.

Não falta material para quem se atrever a procurar teses, biografias, romances e até filmes em espanhol. Mas há opções em português também.

Apesar de Bolívar ser cultuado pela esquerda, Marx – ninguém menos que ele – o considerava "medíocre e grotesco”. Isso pode ser comprovado em Simón Bolívar por Karl Marx, um ensaio do próprio autor de O capital, no qual ele questiona profundamente se Bolívar teria servido à democracia e ao anti-imperialismo e se cabia (à época da publicação) o culto à sua figura. O texto, descoberto apenas em 1935, foi um acaso na vida de Marx – contratado em 1857 por Charles Dana, diretor do New York Daily Tribune, para colaborar sobre temas de história militar, biografias etc na New American Cybclopaedia. Max dividiu o trabalho com Engels, e quis o destino que ele escrevesse o verbete sobre Bolívar.

Outra opção é ler O libertador, uma biografia do venezuelano escrita por Moacir Werneck de Castro, que conta a história de um homem às voltas com sofrimentos, amores e decisões políticas às vezes equivocadas.

Por fim, quando a realidade não der conta de tanta ficção ao seu redor, uma boa saída é assistir a um dos incontáveis filmes inspirados em sua vida. O mais recente deles é Libertador, a produção cinematográfica mais cara da história da América Latina (custou 50 milhões de dólares), dirigida pelo venezuelano Alberto Arvelo. É uma coprodução entre Venezuela, Espanha, Alemanha e Estados Unidos, cuja trama – um novelão – tem lugar em sete países. Mesmo se tratando de uma epopeia de luta que quer deixar registrado o valor de seu protagonista para a história da América Latina, nada ali diz respeito ao possível legado social de Bolívar, nem muito menos ao Brasil.

'Libertador', veja o trailer:
  
*Camila Moraes escreve para o El País, onde esta reportagem foi publicada originalmente.

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