Rádio Vaticana
Cidade do Vaticano (RV) – O Papa Francisco presidiu, na manhã deste sábado, na Basílica Vaticana, ao Consistório Ordinário Público de 2015, durante o qual foram criados 20 novos Cardeais, 15 Eleitores e 5 Eméritos, provenientes de 14 países. Quatro deles contam pela primeira vez com uma sede cardinalícia: Cabo Verde, Panamá, Tonga e Myanmar (Birmânia), o que reforça a diversidade e universalidade do Colégio dos Cardeais.
Com a realização deste Consistório, o segundo do Pontificado do Papa Francisco, o Colégio Cardinalício fica agora composto de 227 Cardeais, dos quais 125 eleitores e 102 não-eleitores. Os Cardeais provenientes da Europa são 118; da América do Norte, 27; da América do Sul, 26; da América Central, 8; da Ásia, 22; da África, 21 e da Oceania, 5.
O Santo Padre deu início à celebração do Consistório, com um momento de oração, em silêncio, diante do altar da Confissão, sobre o túmulo do apóstolo São Pedro.
Durante a cerimônia do Consistório Público para a criação dos 20 novos Cardeais, após uma breve liturgia da Palavra, o Santo Padre fez uma alocução aos presentes, refletindo sobre a “dignidade cardinalícia”, que não é honorífica, como indica o próprio nome “cardeal”, que quer dizer junção cardinal, principal.
Não se trata de algo acessório, decorativo que leva a pensar a uma honorificência, mas de um eixo, um ponto de apoio e movimento essencial para a vida da comunidade. Os Cardeais são incardinados na Igreja de Roma, que “preside à assembleia universal da caridade”. A Igreja de Roma tem uma função exemplar: presidir na caridade. Assim, toda Igreja particular é chamada a presidir na caridade.
Aqui, o Papa, referiu-se ao “hino da caridade”, da Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, que constitui a palavra-chave da celebração deste Consistório para o ministério dos novos Cardeais e, de modo particular, para os que, hoje, passam a fazer parte do Colégio Cardinalício:
“Quanto mais se amplia a responsabilidade dos Cardeais, a serviço da Igreja, tanto mais se deve ampliar seus corações, dilatar-se na medida do coração de Cristo. A “magnanimidade”, da qual fala o apóstolo Paulo, é, em certo sentido, sinônimo de catolicidade: é amar sem limites, com gestos concretos. Saber amar com gestos benévolos. A “benevolência” é a intenção firme e constante de querer sempre o bem para todos”.
Depois, São Paulo diz que a “caridade não é invejosa, não é arrogante, não é orgulhosa”. Trata-se de um verdadeiro milagre da caridade, porque nós, seres humanos, sentimo-nos inclinados à inveja e ao orgulho por causa da nossa natureza ferida pelo pecado. As próprias dignidades eclesiásticas não estão imunes desta tentação.
Outro aspecto do “hino à caridade” do Apóstolo é que a “caridade não falta ao respeito, não procura o seu próprio interesse”. Estes dois pontos revelam que, quem vive na caridade, se descentraliza de si mesmo. O único e verdadeiro centro da Caridade é Cristo.
Paulo recorda ainda que a “caridade não se irrita, não leva em conta o mal recebido”. O pastor, que vive em contato com as pessoas, não está isento de se irritar. Mas, só a caridade nos livra do perigo de reagir impulsivamente, dizer e fazer coisas erradas; e, sobretudo, nos livra do risco mortal da ira em nosso interior. Isto não é aceitável para um homem de Igreja.
A caridade, acrescenta o Apóstolo Paulo, “não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade”. Quem é chamado ao serviço de governar a Igreja deve ter um forte sentido da justiça e ver toda e qualquer injustiça como inaceitável, para si ou para a Igreja. Mas, ao mesmo tempo, se “rejubila com a verdade”. O homem de Deus é aquele que vive fascinado pela verdade. O povo de Deus deve sempre ver em nós verdadeiros homens que denunciam a injustiça e prestam alegre serviço à verdade.
Por fim, São Paulo recorda que a “caridade tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. Nestas quatro palavras, concluiu o Papa, encontra-se um verdadeiro programa de vida espiritual e pastoral para os Pastores da Igreja:
“O amor de Cristo, infundido em nossos corações pelo Espírito Santo, permite-nos viver assim, ser assim, como pessoas capazes de perdoar sempre; dar sempre confiança, pela sua fé em Deus; infundir sempre esperança, pela esperança que vem de Deus. Tais pessoas sabem suportar, com paciência, todas as situações, em união com Jesus, que suportou com amor o peso de todos os nossos pecados”.
Ao término da sua reflexão, na cerimônia do Consistório Ordinário Público, o Papa Francisco recordou que “Deus é amor e realiza tudo, se formos dóceis à ação do Santo Espírito. Eis como devemos ser: “incardinados e dóceis”.
“Quanto mais estivermos incardinados na Igreja que está em Roma, tanto mais devemos nos tornar dóceis ao Espírito, para que a caridade possa dar forma e sentido a tudo o que somos e fazemos. Incardinados na Igreja que preside na caridade, dóceis ao Espírito Santo, que derrama nos nossos corações o amor de Deus”.
O Papa concluiu sua alocução afirmando que Jesus é a Caridade encarnada. Por isso, invocou Maria, sua Mãe, para que nos ajude a acolher a Palavra e a seguir sempre este Caminho da caridade; que ela nos ajude, com a sua conduta humilde e terna de mãe, porque a caridade, dom de Deus, se desenvolve e cresce onde há humildade e ternura.
A cerimônia prosseguiu com a leitura, em latim, da fórmula de criação, que, depois, fizeram a profissão de fé e o juramento de fidelidade e obediência ao Papa e aos seus Sucessores; receberam o barrete cardinalício e o anel, símbolo do amor pela Igreja.
Enfim, cada Cardeal recebeu seu título de uma igreja de Roma, que simboliza a participação na solicitude pastoral do Papa na cidade Eterna, bem como a bula de criação cardinalícia, momento selado por um abraço de paz. (MT)
No final da cerimônia da criação dos 20 novos Cardeais, deu-se o Consistório Ordinário Público, presidido pelo Bispo de Roma, para a votação de três Causas de Canonização das seguintes beatas: Giovana Emília de Villeneuve (França, 1811-1854), Maria de Jesus Crucificado (Palestina, 1846-1878) e Maria Afonsina Danil Ghattas (Palestina, 1843-1927).
Na tarde deste sábado, os 20 novos Cardeais recebem a chamada “visita de cortesia”, durante a qual são cumprimentados pelos seus convidados, em diversas salas da Residência Apostólica, no Vaticano.
Eis a homilia na íntegra:
Amados Irmãos Cardeais!
A dignidade cardinalícia é certamente uma dignidade, mas não é honorífica. Assim no-lo indica o próprio nome – «cardeal» –, que evoca a «charneira», a junção cardinal, principal; não se trata, portanto, de algo acessório, decorativo que faça pensar a uma honorificência, mas de um eixo, um ponto de apoio e movimento essencial para a vida da comunidade. Vós sois «junções cardinais» e estais incardinados na Igreja de Roma, que «preside à universal assembleia da caridade» (CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. Lumen gentium, 13; cf. SANTO INÁCIO DE ANTIOQUIA, Carta aos Romanos, Prólogo).
Na Igreja, toda a presidência provém da caridade, deve ser exercida na caridade e tem como fim a caridade. Também nisto a Igreja que está em Roma desempenha uma função exemplar: assim como ela preside na caridade, assim também cada Igreja particular é chamada, no seu âmbito, a presidir à caridade e na caridade.
Por isso, penso que o «hino à caridade» da Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios (cap. 13) possa constituir a palavra-orientadora para esta celebração e para o vosso ministério, de modo particular para aqueles de vós que hoje passam a fazer parte do Colégio Cardinalício. E far-nos-á bem – a começar por mim e vós comigo – deixarmo-nos orientar pelas palavras inspiradas do apóstolo Paulo, nomeadamente quando refere as características da caridade. Venha em nossa ajuda, nesta escuta, a Virgem Maria, nossa Mãe. Deu ao mundo Aquele que é o «caminho que ultrapassa todos os outros» (cf. 1 Cor 12, 31): Jesus, Caridade encarnada. Que Ela nos ajude a acolher esta Palavra e a seguir sempre por este Caminho; nos ajude com a sua conduta humilde e terna de mãe, porque a caridade, dom de Deus, cresce onde há humildade e ternura.
São Paulo começa por nos dizer que a caridade é «magnânima» e «benévola». Quanto mais se amplia a responsabilidade no serviço à Igreja, tanto mais se deve ampliar o coração, dilatando-se de acordo com a medida do coração de Cristo. A magnanimidade é, em certo sentido, sinónimo de catolicidade: é saber amar sem limites, mas ao mesmo tempo fiéis às situações particulares e com gestos concretos. Amar o que é grande, sem negligenciar o que é pequeno; amar as coisas pequenas no horizonte das grandes, porque «non coerceri a maximo, contineri tamen a minimo divinum est». Saber amar com gestos benévolos. A benevolência é a intenção firme e constante de querer o bem sempre e para todos, incluindo aqueles que não nos amam.
Depois, o Apóstolo diz que a caridade «não é invejosa, não é arrogante nem orgulhosa». Isto é verdadeiramente um milagre da caridade, porque nós, seres humanos (todos, e em todas as idades da vida), sentimo-nos inclinados à inveja e ao orgulho por causa da nossa natureza ferida pelo pecado. E as próprias dignidades eclesiásticas não estão imunes desta tentação. Mas por isso mesmo, amados Irmãos, pode sobressair ainda mais em nós a força divina da caridade, que transforma de tal modo o coração que já não és tu que vives, mas Cristo que vive em ti. E Jesus é todo amor.
Além disso, a caridade «não falta ao respeito, não procura o seu próprio interesse». Estes dois traços revelam que, quem vive na caridade, se descentralizou de si mesmo. A pessoa que vive auto-centralizada, inevitavelmente falta ao respeito e, muitas vezes, nem se dá conta disso, porque o «respeito» é precisamente a capacidade de ter em conta o outro, a sua dignidade, a sua condição, as suas necessidades. Quem está auto-centralizado, procura inevitavelmente o seu próprio interesse, parecendo-lhe isso normal, quase um dever. Tal «interesse» pode inclusivamente apresentar-se amantado com nobres revestimentos, mas por debaixo está sempre o «próprio interesse». Ao contrário, a caridade descentraliza-te, situando-te no único verdadeiro centro que é Cristo. Então, sim, podes ser uma pessoa respeitadora e atenta ao bem dos outros.
A caridade, diz Paulo, «não se irrita, não leva em conta o mal recebido». Ao pastor que vive em contacto com as pessoas, não faltam ocasiões para se irritar. E o risco de se irritar é talvez ainda maior nas relações entre nós, irmãos, embora tenhamos efectivamente menos desculpa. Também disto é a caridade, e só a caridade, que nos liberta. Liberta-nos do perigo de reagir impulsivamente, dizer e fazer coisas erradas; e sobretudo liberta-nos do risco mortal da ira retida, «aninhada» no interior, que te leva a ter em conta os malefícios recebidos. Não. Isto não é aceitável no homem de Igreja. Entretanto se é possível desculpar uma indignação momentânea e imediatamente moderada, não se pode dizer o mesmo do rancor. Que Deus nos preserve e livre dele!
A caridade – acrescenta o Apóstolo – «não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade». Quem é chamado na Igreja ao serviço da governação deve ter um sentido tão forte da justiça que veja toda e qualquer injustiça como inaceitável, incluindo aquela que possa ser vantajosa para si mesmo ou para a Igreja. E, ao mesmo tempo, «rejubila com a verdade»: é uma bela expressão! O homem de Deus é alguém que vive fascinado pela verdade e que a encontra plenamente na Palavra e na Carne de Jesus Cristo. Ele é a fonte inesgotável da nossa alegria. Possa o povo de Deus encontrar sempre em nós a denúncia firme da injustiça e o serviço jubiloso da verdade.
Por fim, a caridade «tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta». Temos aqui, em quatro palavras, um programa de vida espiritual e pastoral. O amor de Cristo, derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, permite-nos viver assim, ser assim: pessoas capazes de perdoar sempre; de dar sempre confiança, porque cheias de fé em Deus; capazes de infundir sempre esperança, porque cheias de esperança em Deus; pessoas que sabem suportar com paciência todas as situações e cada irmão e irmã, em união com Jesus, que suportou com amor o peso de todos os nossos pecados.
Amados irmãos, nada disto provém de nós, mas de Deus. Deus é amor e realiza tudo isto, se formos dóceis à acção do seu Santo Espírito. Eis então como devemos ser: incardinados e dóceis. Quanto mais estivermos incardinados na Igreja que está em Roma, tanto mais nos devemos tornar dóceis ao Espírito, para que a caridade possa dar forma e sentido a tudo o que somos e fazemos. Incardinados na Igreja que preside na caridade, dóceis ao Espírito Santo, que derrama nos nossos corações o amor de Deus (cf. Rom 5, 5). Assim seja.
(from Vatican Radio)
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