sábado, 4 de julho de 2015

Ex-Charlie Hebdo diz que cartunistas passaram de covardes a corajosos

'Eu tenho medo até de jogar futebol', afirma o francês Riad Sattouf.
Na Flip, ele comenta tragédia em Paris que matou colegas de redação.

Letícia MendesDo G1, em Paraty

O cartunista francês Riad Sattouf dá entrevista na Flip 2015 (Foto: Letícia Mendes/G1)O cartunista francês Riad Sattouf dá entrevista na Flip 2015 (Foto: Letícia Mendes/G1)
O cartunista francês Riad Sattouf, de 37, passou dez anos de sua vida desenhando para o semanário "Charlie Hebdo", cuja redação foi atacada em janeiro deste ano e 12 colegas seus foram mortos, entre eles o lendário Wolinski.
"Eu não ia à redação, eu fazia os desenhos e mandava por e-mail e, na ocasião do atentado, eu já tinha saído há seis meses de lá para trabalhar no 'Le Nouvel Observateur'", conta, em entrevista realizada neste sábado (4) na 13ª Flip.
"Na verdade, eu não estou envolvido nessa parte política. Lá, eu fazia uma tira que chamava 'A vida secreta dos jovens', em que contava coisas que eu via na rua, fatos reais que ligam os adultos aos jovens. Nunca fiz sobre política. O Plantu [cartunista francês que também está na Flip] faz e por isso fica muito exposto. Essa não é minha função", afirma.
Riad Sattouf diz que a vida para os cartunistas ficou muito mais difícil após a tragédia do "Charlie Hebdo". "Agora eles têm um papel que adquiriu uma importância muito maior. Em geral, do que eu conheço dos cartunistas da minha geração e do 'Charlie', foram jovens complexados, tímidos, com problemas sexuais, sem sucesso com as mulheres. Aí, de noite, como não têm mulher nem amigos fazem desenhos eróticos para poder se excitar. Após os assassinatos, eles viraram os paladinos da liberdade de expressão e, na verdade, são frustrados sexuais."
"Agora eles têm que assumir uma posição corajosa. Não há uma pessoa que seja mais afastada dessa coragem do que os desenhistas. Eu sou uma pessoa muito covarde. Eu tenho medo até de jogar futebol, que a bola bata na minha cabeça", diz.
Trecho do livro 'O árabe do futuro' (Foto: Divulgação/Intrínseca)Trecho do livro 'O árabe do futuro' (Foto: Divulgação/Intrínseca)
Na Flip, Riad Sattouf lança "O árabe do futuro", livro de memórias em quadrinhos de sua infância na Síria e na Líbia nos anos 1980. "No 'árabe do futuro', não faço comentários políticos nem caricaturas políticas. Apenas mostro os fatos e o leitor que faça seus comentários. O personagem do pai, por exemplo, é uma pessoa que alguns dizem ser muito emocionante e outros dizem que ele é um monstro. A vida é mais complexa do que um simples comentário, e quero provocar essa reação nas pessoas."
No livro, ele desenha sua relação com o pai sírio e a mãe francesa. Ele diz que hesitou em fazê-lo, por medo de contar sua história, mas mudou de ideia para "se vingar" da burocracia francesa. "Em 2011, quando a Guerra Civil começou na Síria, uma parte da minha família ainda morava em Homs, que foi totalmente destruída. Eu quis fazer com que eles viessem para a França e tive dificuldade para conseguir a documentação. Eu ia nas prefeituras francesas, explicava e eles diziam que não podiam fazer muita coisa. Encontrei muita dificuldade. Tive vontade de me vingar dessas pessoas, então fiz esse livro.
"

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