Tema ainda é pouco debatido no Brasil, a morte virou moda nos Death Cafés
Por Camila Moraes*
É verdade que muitas pessoas preferem não falar sobre a morte e se sentem mais confortáveis fazendo de conta que ela não existe. Também é verdade que outras tantas precisam conversar sobre ela, encará-la como algo concreto e então seguir vivendo. Se for um bate-papo acompanhado de bolo e café, melhor ainda.
Para os adeptos dessa postura, o Death Café promove “um jeito fácil de falar sobre coisas difíceis”, com o objetivo de “aumentar a consciência sobre a finitude e a ajudar as pessoas a aproveitarem melhor suas vidas (finitas)”. O formato propõe um encontro para um bate-papo livre e surgiu em 2011, a partir das ideias do sociólogo e antropólogo suíço Bernard Crettaz – o primeiro defensor famoso dos espaços para falar sobre o morrer e crítico ferrenho do que ele chama de “tyrannical secrecy” (sigilo tirânico). Pode ser organizado em qualquer lugar, e cada vez mais lugares o organizam.
Já aconteceram quase 2.000 Death Cafés – definidos pelos organizadores centrais como uma “franquia social” – em cidades do mundo inteiro, incluindo São Paulo. Aqui, a estreia do Death Café Sampa aconteceu em 2014 depois que a economista formada pela USP Elca Rubinstein, que viveu 18 anos em Washington trabalhando no Banco Mundial, participou em 2014 de sua primeira conversa organizada sobre a morte. “A experiência de viver em um país em que a longevidade e o envelhecimento foram assimilados me permitiu pensar mais sobre a morte. Não é o caso do Brasil, onde as pessoas ainda morrem jovens e não dá nem tempo de falar sobre o assunto”, diz Elca.
Segundo ela, que já organizou seis cafés paulistanos ao lado do psiquiatra Bernardo Gregorio, algumas pessoas preferem não revelar aos familiares que vão a um Death Café. “Elas inventam que vão passear, porque se contam o que de fato farão vão ser chamadas de malucas. Aqui, não temos espaço para falar de questões de morte nem dentro de casa”, conta. Ela acredita que a geração de brasileiros que nasceu nos anos 40 e 50 é a primeira a pensar na finitude: “Eles dizem: ‘Tenho 50, 60 anos e vou viver mais 20, 30. O que vai acontecer? Vou ter grana? Minha família vai cuidar de mim?'”. Nos cafés, fala-se sobre essas questões práticas e outras filosóficas. “As pessoas que frequentam não estão morrendo, não estão na crise. Querem simplesmente conversar a respeito”, garante a organizadora, que prepara mais um encontro paulistano, dia 22 de agosto, na pousada Ziláh.
Cemitérios para os vivos
Ainda que se proponha ser um papo solto e agradável que pode ser organizado por qualquer interessado – desde que não tenha vínculos com nenhuma instituição –, um Death Café implica respeito a algumas regras básicas: não pode ser uma atividade com fins lucrativos, ter tópicos pré-definidos, “vender ideias” e se apresentar como um espaço de terapia. Uma recomendação especial é que se sirva algo doce, como um bolo, para contribuir com o clima informal e facilitar a abordagem de um tema que não deixa de ser pesado.
Camila Appel, jornalista e dramaturga que mantém na Folha de S. Paulo um blog exclusivamente dedicado ao tema chamado Morte sem tabu, participou de um desses cafés. Em sua experiência, vários questionamentos surgiram e foram tratados com naturalidade, amparados por "depoimentos pessoais e reflexões que realmente não têm espaço no dia a dia”. "Isso me pareceu o grande triunfo do Death Cafe, deixar que a informalidade e a falta de agenda conduza estranhos a se abrirem e aprenderem com as experiências dos outros”, ela opina.
O impulso de Camila para criar um blog temático sobre a morte, coisa rara inclusive na superpovoada blogosfera, veio do próprio medo de morrer. “A ideia da morte já me assustava, e isso piorou depois que virei mãe. Pensei: ‘Vou me curar e ainda oferecer um serviço’”, conta. Segundo a jornalista, posts não faltam, porque “fala-se pouco sobre a própria indústria da morte” e, além disso, “a cada minuto tem uma notícia nova”. Uma dessas notícias que ela destaca é um serviço da NASA que lança cápsulas com restos mortais no espaço a cada seis meses. O serviço atende a um certo gosto extravagante, mas custa relativamente pouco: 7.000 dólares.
Conheça o Death Café de São Paulo. Veja o vídeo:
Para os adeptos dessa postura, o Death Café promove “um jeito fácil de falar sobre coisas difíceis”, com o objetivo de “aumentar a consciência sobre a finitude e a ajudar as pessoas a aproveitarem melhor suas vidas (finitas)”. O formato propõe um encontro para um bate-papo livre e surgiu em 2011, a partir das ideias do sociólogo e antropólogo suíço Bernard Crettaz – o primeiro defensor famoso dos espaços para falar sobre o morrer e crítico ferrenho do que ele chama de “tyrannical secrecy” (sigilo tirânico). Pode ser organizado em qualquer lugar, e cada vez mais lugares o organizam.
Já aconteceram quase 2.000 Death Cafés – definidos pelos organizadores centrais como uma “franquia social” – em cidades do mundo inteiro, incluindo São Paulo. Aqui, a estreia do Death Café Sampa aconteceu em 2014 depois que a economista formada pela USP Elca Rubinstein, que viveu 18 anos em Washington trabalhando no Banco Mundial, participou em 2014 de sua primeira conversa organizada sobre a morte. “A experiência de viver em um país em que a longevidade e o envelhecimento foram assimilados me permitiu pensar mais sobre a morte. Não é o caso do Brasil, onde as pessoas ainda morrem jovens e não dá nem tempo de falar sobre o assunto”, diz Elca.
Segundo ela, que já organizou seis cafés paulistanos ao lado do psiquiatra Bernardo Gregorio, algumas pessoas preferem não revelar aos familiares que vão a um Death Café. “Elas inventam que vão passear, porque se contam o que de fato farão vão ser chamadas de malucas. Aqui, não temos espaço para falar de questões de morte nem dentro de casa”, conta. Ela acredita que a geração de brasileiros que nasceu nos anos 40 e 50 é a primeira a pensar na finitude: “Eles dizem: ‘Tenho 50, 60 anos e vou viver mais 20, 30. O que vai acontecer? Vou ter grana? Minha família vai cuidar de mim?'”. Nos cafés, fala-se sobre essas questões práticas e outras filosóficas. “As pessoas que frequentam não estão morrendo, não estão na crise. Querem simplesmente conversar a respeito”, garante a organizadora, que prepara mais um encontro paulistano, dia 22 de agosto, na pousada Ziláh.
Cemitérios para os vivos
Ainda que se proponha ser um papo solto e agradável que pode ser organizado por qualquer interessado – desde que não tenha vínculos com nenhuma instituição –, um Death Café implica respeito a algumas regras básicas: não pode ser uma atividade com fins lucrativos, ter tópicos pré-definidos, “vender ideias” e se apresentar como um espaço de terapia. Uma recomendação especial é que se sirva algo doce, como um bolo, para contribuir com o clima informal e facilitar a abordagem de um tema que não deixa de ser pesado.
Camila Appel, jornalista e dramaturga que mantém na Folha de S. Paulo um blog exclusivamente dedicado ao tema chamado Morte sem tabu, participou de um desses cafés. Em sua experiência, vários questionamentos surgiram e foram tratados com naturalidade, amparados por "depoimentos pessoais e reflexões que realmente não têm espaço no dia a dia”. "Isso me pareceu o grande triunfo do Death Cafe, deixar que a informalidade e a falta de agenda conduza estranhos a se abrirem e aprenderem com as experiências dos outros”, ela opina.
O impulso de Camila para criar um blog temático sobre a morte, coisa rara inclusive na superpovoada blogosfera, veio do próprio medo de morrer. “A ideia da morte já me assustava, e isso piorou depois que virei mãe. Pensei: ‘Vou me curar e ainda oferecer um serviço’”, conta. Segundo a jornalista, posts não faltam, porque “fala-se pouco sobre a própria indústria da morte” e, além disso, “a cada minuto tem uma notícia nova”. Uma dessas notícias que ela destaca é um serviço da NASA que lança cápsulas com restos mortais no espaço a cada seis meses. O serviço atende a um certo gosto extravagante, mas custa relativamente pouco: 7.000 dólares.
Conheça o Death Café de São Paulo. Veja o vídeo:
*Camila Moraes escreve para o El País
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