segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Luiz, meu pai

Naquele momento, senti sua mão apertar a minha com o pouco de força que ainda lhe restava.
Por Marco Lacerda*
Quando finalmente retornei ao Brasil, depois de muitos anos vivendo no exterior, meu pai estava à beira da morte. Pouco depois de chegar ao hospital ele entrou num coma do qual não sairia. Me assustava a sensação de deixa-lo ir-se desse mundo sem pelo menos um gesto que representasse um adeus.
Ao lado da cama, sozinho com ele na UTI, apertei sua mão contra a minha e assim permaneci por algum tempo, tentando sobrepor-me às barreiras que o tempo erguera entre nós, até reencontrar em pensamento o homem terno e protetor que eu conhecera um dia. Aproximei a boca do ouvido dele e disse baixinho o que nunca havia dito antes: “Eu te amo, meu pai”. E repeti tantas vezes quantas quis meu coração.
Naquele momento, senti sua mão apertar a minha com o pouco de força que ainda lhe restava. Movido por um amor fugidio, seu polegar deslocou-se, trêmulo, e acariciou de levinho a palma da minha mão. Como se tivesse uma criança nos braços, senti finalmente que o tinha prisioneiro no lugar que sempre foi dele no meu coração.
Morreu o contador de histórias que despertou em mim o desejo de contar histórias também. Fechou os olhos para sempre o homem em quem o amor dava medo, mas que talvez tenha me amado sempre. Na verdade, acho que ele morreu muito antes. Parecia um homem feito para outros tempos, outros mundos. Estava enfim protegido de todos os medos pela imunidade da morte.
*Marco Lacerda é jornalista, escritor e Editor Especial do DomTotal

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