O principal conflito que os bispos enfrentarão gira em torno dos divorciados que voltam a se casar.
O Papa Francisco abre no próximo domingo, no Vaticano, o segundo sínodo sobre a família, cujos debates, sobre temas espinhosos, como o divórcio, o concubinato e a homossexualidade, marcarão seu pontificado.
De 4 a 25 de outubro, cerca de 400 cardeais e bispos, provenientes de todos os continentes, debaterão pela segunda vez em um ano sobre os desafios encarados pela família católica, em crise diante das mudanças da sociedade moderna.
"A última palavra sobre todos estes temas é do Papa", esclareceu nesta sexta-feira em uma coletiva de imprensa o cardeal Lorenzo Baldissieri, secretário-geral do Sínodo.
"Estamos no mar e há muitas turbulências", reconheceu.
Uma série de questionários enviados a pedido do Papa às dioceses de todo o mundo colocaram em evidência a distância entre a doutrina severa da Igreja e a prática dos fiéis.
O primeiro sínodo ou assembleia de bispos sobre a família, celebrado há um ano, revelou as profundas tensões e divergências que reinam dentro da Igreja católica, apesar de compartilhar uma série de conceitos básicos.
Os 360 "padres sinodais" convidados pelo Papa, desta vez sabiamente escolhidos entre conservadores e progressistas, debaterão sobre temas delicados, sem a obrigação de chegar a uma conclusão.
Pela primeira vez 18 casais participarão dos debates, que deverão apresentar sua própria visão como leigos diretamente envolvidos.
Para o Papa de origem argentina, a família tradicional está vivendo uma crise profunda, que afeta o conjunto da sociedade e em particular a Igreja, de cujas diretrizes oficiais muitos fiéis se afastaram.
"A aliança entre o homem e a mulher é a resposta aos desafios do mundo atual, sendo, por sua vez, modelo da gestão sustentável da criação", afirmou na quarta-feira o Papa durante a audiência geral no Vaticano.
Francisco, que se apresenta como um religioso aberto ao diálogo, disposto a ouvir as partes, é um conservador em assuntos doutrinários.
Embora tenha reconhecido recentemente que é justo e necessário que um casal se separe quando há violência, reiterou em seus quase três anos de pontificado a condenação ao aborto, ao casamento homossexual e à eutanásia, embora com um tom menos agressivo e reivindicativo em comparação com seus antecessores.
Choque de expectativas
O principal conflito que os bispos enfrentarão gira em torno dos divorciados que voltam a se casar.
Para a Igreja o casamento é indissolúvel e não reconhece o divórcio civil, razão pela qual não permite que os católicos divorciados que voltam a se casar recebam a comunhão.
Livros, petições, simpósios de um lado e de outro pedem de um lado maior flexibilidade e do outro exigem a inviolabilidade da doutrina.
Uma petição lançada há vários dias na página Change.org, a pedido de vinte teólogos de todo o mundo, solicita ao Papa e ao Sínodo que autorize a comunhão aos divorciados que voltam a se casar.
A petição já superou as dez mil assinaturas.
Reina um clima tenso, com príncipes da Igreja que se acusam mutuamente.
Muitos temem que no decorrer deste ano tenha se constituído um núcleo duro, "dedicado mais a frear que a propor" reformas, afirmaram à AFP fontes religiosas.
No início de setembro, com um golpe astuto, o Papa simplificou o procedimento para a nulidade do casamento, que também será gratuito, resolvendo antecipadamente um dos problemas sobre o tapete.
A reforma democratizou o trâmite, mas não modificou os motivos que justificam as anulações, assunto que será abordado durante o sínodo.
Alguns setores progressistas manifestaram suas dúvidas sobre o resultado do sínodo e temem que o Papa das reformas e da renovação acabe por decepcioná-los.
"Não entendo a estratégia do Papa. Por um lado encoraja o debate e por outro parece encerrá-lo", comentou recentemente um vaticanista americano.
Os grandes temas que fazem muitos católicos sofrerem, como a comunhão dos divorciados ou a discriminação dos casais com o mesmo sexo, podem cair no esquecimento.
Francisco deverá elaborar, se assim decidir, um documento Papal que para muitos observadores marcará a direção que seu pontificado tomará.
O Papa dos pobres, das periferias, o pacificador da América por seu papel em Cuba, Estados Unidos e Colômbia, tem agora a tarefa de conciliar setores contrários dentro da mesma Igreja, além de oferecer perdão e misericórdia, como anunciou ao lançar o Jubileu ou Ano Santo a partir de 8 de dezembro deste ano.
AFP
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