Enquanto ela caminha em busca do Amado, na mesma via ele vai à procura de Teresa.
Por Dom Leomar Brustolin*
Em outubro, encerram-se as celebrações do quinto centenário do nascimento de Santa Teresa. Esse foi um sinal de memória e de gratidão pelas maravilhas que o Senhor realizou na mística de Ávila. Mais: indica que a sua mensagem está viva e é capaz, ainda hoje, de suscitar peregrinos no caminho que ela mesma trilhou.
Para Teresa o caminho é uma imagem muito querida. Em suas obras, ela recorre mais de seiscentas vezes às palavras: “caminho” e “caminhar”. Para ela, esses termos têm duplo sentido: exterior e interior. Caminhamos pelo mundo, no tempo e no espaço e percorremos também as vias do nosso eu mais profundo, procurando o sentido de ser e existir. Essa imagem reflete o dinamismo do pensamento teresiano. Ela mesma será chamada, até criticamente, de “andarilha”.
Uma contemplativa andarilha? Sim, em Teresa, o paradoxo encontra a síntese. Ela caminha apressadamente em direção ao Senhor, mas não é afobada, tem pressa, como fez Maria para ir ao encontro de Isabel. É um êxodo, um sair de si, guiada pelo encontro com o mistério divino que lhe comunicou algo maravilhoso. Nada pode reter essas mulheres de Deus. A Mãe do Senhor corre às montanhas da Judeia para levar, no ventre, o Verbo feito carne que seria precedido por João Batista. Teresa percorre a Espanha, levando no coração o Amigo e Companheiro perfeito, fazendo com que suas filhas, as monjas, se aproximem do Cristo. Enquanto a Virgem Maria era “levada” por Deus e ao mesmo tempo caminhava como cristófora, isto é, carregando Cristo, Santa Teresa tinha consciência que não caminhava sozinha. Dizia ela: “Caminhemos juntos, Senhor: andarei onde andares, e por onde fores, irei também eu.” (Caminho de Perfeição 26,6).
O que movia Teresa era um desejo incontido de Deus. Desejo: uma palavra tão ambígua em nossos tempos. Há tantos desejos egoístas, que manipulam os outros, compram sentimentos e pretendem satisfazer a sede de plenitude. Mas nada conseguem e, no final, resta o vazio. Teresa deseja seu Senhor. A etimologia da palavra desejo vem do latim: desideribus, e pode designar de-sideribus, isto é, além das estrelas, ou o que vem das estrelas; remete ao conceito de transcendência. Ir além das estrelas, metaforicamente, é encontrar Deus. Teresa caminha para além das estrelas, pois seu desejo está focado no Senhor do caminho, aquele que ela mesma quer atingir. Ela “deseja” superar todo “desejo” para encontrar aquele que todo coração humano busca, mesmo sem ter consciência. Por isso, Teresa coloca-se a caminho, numa estrada até então desconhecida, e só assim abre acessos novos na busca de Deus. Enquanto ela caminha em busca do Amado, na mesma via ele vai à procura de Teresa. Ela é a Teresa de Jesus, e ele é o Jesus de Teresa.
CNBB 23-09-2015.
*Dom Leomar Brustolin é bispo Auxiliar de Porto Alegre (RS).
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