Rádio Vaticana
Cidade do Vaticano (RV) - No nosso espaço Memória Histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a tratar na edição de hoje, da Declaração conciliar Nostra Aetate sobre a Igreja e as Religiões Não-cristãs.
No programa passado, vimos como a Declaração Nostra Aetate, promulgada pelo Papa Paulo VI em 28 de outubro de 1965, representou uma grande novidade no cenário da Igreja, sobretudo há 50 anos. Antes do Concílio Vaticano II, já havia um caminho, ainda que tímido, de diálogo com as outras religiões. Mas foi este documento que abriu um horizonte maior, especialmente em relação aos judeus, com quem temos uma base comum com os Patriarcas, os Profetas, as Promessas.
A Nostra Aetate declara também que a Igreja tem uma “grande estima pelos muçulmanos”, o que representou uma grande mudança, pois até então os muçulmanos eram considerados como inimigos. O Concílio evidenciou, de modo sintético, os valores que se encontram na religião islâmica. Acerca do seu sistema doutrinal, o primeiro e mais importante fato é que se trata de uma religião monoteísta. Mons. Michael Fitzgerald (*), na palestra proferida aos alunos da Pontifícia faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção – explica que de fato, “ aLumen Gentium atribui ao Islã o primeiro lugar entre os monoteísmos não-bíblicos. Declara que, “tal como nós (os Cristãos), eles (os Muçulmanos) adoram o único e misericordioso Deus, juiz da humanidade no último dia” (LG 16). Este Deus, descrito em termos que evocam o Alcorão, como “único, vivo e subsistente, misericordioso e onipotente”, não é visto como um ser longínquo, mas como aquele que “falou aos homens”. Este fato é positivo, embora o Concílio não dê mais indicações sobre o modo da comunicação divina, e, na verdade, Cristãos e Muçulmanos divergem no modo de compreender a revelação. Faz-se uma referência implícita à profecia, sendo notado que os Muçulmanos “veneram Jesus como um profeta”. Neste contexto, encontramos uma observação negativa na Nostra Aetate, que recorda que os Muçulmanos não reconhecem Jesus como Deus. Dificilmente, poderia ser evitada esta observação, pois que a rejeição da Encarnação e, por conseguinte, também da Redenção, por meio da por meio da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus constitui a diferença fundamental entre as duas religiões”.
O valor fundamental do Islã, como indica esta palavra - explica Mons. Michael Fitzgerald - é sublinhado: “Esforçam-se por se submeterem a Deus – é o que quer dizer a palavra islã – sem reserva , aderindo aos ocultos desígnios de Deus”. A escolha da palavra “esforçam-se” indica que não se trata de simples fatalismo, como, muitas vezes, se pensa por preconceito, mas de uma atitude autêntica de devoção que merece respeito. Abraão é visto como modelo desta disposição fundamental do ser humano para com Deus, modelo partilhado por Judeus, Cristãos e Muçulmanos, apesar da diferente compreensão do papel que Abraão é chamado por Deus a desempenhar. O mesmo é verdade, em grau menor, no que diz respeito à Maria. A Nostra Aetate menciona que a Virgem Mãe de Jesus é honrada e, às vezes, devotamente invocada. Procurar a intercessão de Maria, como de outras pessoas reconhecidas como santas, não é aceito por Muçulmanos mais rigorosos. Todavia ocupa um lugar predominante no Islã popular. Pode ser visto como uma característica fundamental dos seres humanos que, na relação com Deus, sentem a necessidade de ajuda e apoio da parte dos que se consideram estar mais perto dEle.
O Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Ecumenismo, Dom Biasin, fala sobre esta novidade que a Nostra Aetate fala em relação aos muçulmanos?
"O Islã, de fato, ele é uma religião monoteísta, e no Alcorão, muitos nomes do Antigo Testamento, como o nosso Pai Abraão na fé, alguns profetas, Moisés, eles estão lembrado como referenciais importantes para a fé do piedoso islamita, do muçulmano. E também outras religiões como o hinduísmo e religiões orientais, são apresentadas de forma positiva, como uma busca do homem de encontro com Deus. Este documento, Nostra Aetate, repito, embora não seja o mais importante, representa uma grande novidade dentro da Igreja e a partir daí, se desenvolveram diálogos bilaterais muito fecundos. O Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, tomou o corpo cada vez mais, e os Papas João XXIII, Bento XVI e o Papa Francisco, eles desenvolveram cada vez mais o diálogo com as grandes religiões, sobretudo, em busca da paz. Pois havendo entre nós um diálogo, um respeito recíproco, trabalhando em favor da paz, dá ao mundo um exemplo de, não diria de unidade, mas de compromisso comum, para a construção de relacionamentos fraternos e de profundo respeito à vida humana e também ao cosmos onde nós estamos, a casa comum, como diz o Papa Francisco”.
A Declaração Nostra Aetate, trata dos laços comuns da humanidade e inquietação religiosa do homem; a resposta das diversas religiões não-cristãs e sua relação com a Igreja. Dom Francisco Biasin, o que a Nostra Aetate fala em relação às outras religiões, que não o judaísmo e o islamismo?
“Também em relação a outras religiões, que há 50 anos atrás ainda não tinham um lugar no cenário inter-religioso, foram, também as pequenas, tomando rosto, e tomando assim também consistência diante da Igreja Católica. Aqui no Brasil, por exemplo, temos diálogo com as religiões de origem afro, dos afrodescendentes, temos diálogo também com as religiões originárias, que são próprias odos índios, num grande respeito e numa aprendizagem recíproca. O que podem nos ensinar estas religiões do povo são sobretudo o respeito à natureza, o respeito à vida e em certos casos também o respeito à família, o respeito ao relacionamento interpessoal. E exigem de nós a superação de preconceitos e até de intolerância religiosa. Portanto, no diálogo, todo mundo pode crescer. Todo mundo pode encontrar caminhos novos e todo mundo pode aprender. Ninguém tem a totalidade da verdade enquanto caminha nesta terra. Também nós, cristãos e católicos, temos que ter a humildade de sentar à mesa e onde vemos um rastro, uma semente do Verbo, realmente dar todo o realce, porque tem a luminosidade do Verbo, que é o próprio Cristo”.
(*) Mons. Michael Fitzgerald, Revista de Cultura Teológica, V. 13 - N. 52, julho/set 2005
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