quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Que os cristãos se deixem levar pelo vento do Espírito

Testemunho do Pe. Ray Simpson, fundador da comunidade monástica inspirada na espiritualidade celta
Pe. Ray
20 JANEIRO 2016 BY LUIGI MARIANO GUZZO IGREJA E RELIGIÃO
 Pe. Ray

Lindisfarne é uma ilha ao norte da Inglaterra, com pouco mais de quinhentos habitantes, a poucos quilómetros da Escócia: não por acaso as suas cores recordam as highlands escocesas. Berço da espiritualidade celta, é conhecida como a Ilha Santa. A sua peculiaridade é que está conectada à terra firma por um istmo que a torna acessível a pé ou carro duas vezes por dia, na maré baixa. Em Lindisfarne o Pe. Ray Simpson, um padre anglicano celibatário, fundou a comunidade monástica ecumênica dedicada a Santo Aidan e Santa Hilda para viver e dar a conhecer a espiritualidade cristã celta. No cento, um renovado compromisso no cuidado e na preservação da Criação.

Fomos a Lindsfarne e entrevistamos ali o Pe. Simpson. Falamos também sobre a última encíclica do Papa Francisco, Laudato Si’, de interesse por causa das novas perspectivas no diálogo ecumênico e inter-religioso.


ZENIT: Pe. Ray, fale-nos sobre a comunidade de Santo Aidan e Santa Hilda…

Pe. Ray: Sou um padre anglicano, guardião fundador da comunidade cristã internacional de Santo Aidan e Santa Hilda. Nesta comunidade nós temos membros católicos, ortodoxos, evangélicos e anglicanos. Nós somos uma comunidade ecumênica. E a nossa regra de vida nos indica para vivermos juntos os pontos fortes de Deus em um cristianismo que hoje está separado. Portanto, temos alguns membros que vão à missa com sua esposa e eles acreditam nos sacramentos, temos alguns membros evangélicos que prestam grande atenção aos pobres e à justiça, temos, também, alguns membros anglicanos que hoje estão percebendo o quanto seja importante ter cuidado com a Criação. Estes são apenas alguns dos pontos fortes da nossa comunidade …

ZENIT: Quais são os pontos-chave da espiritualidade celta?

Pe. Ray: Originalmente, o cristianismo era um modo de vida, depois tornou-se uma instituição. Os cristãos celtas procuram estabelecer um modo de vida sem seguir à risca esta forma institucional.

O sol nasce todos os dias e nos direciona a Deus. E da mesma maneira que se o sol se assemelha a Deus, os cristãos celtas olham para o vento como sendo o Espírito de Deus. Os cristãos celtas se deixam levar para o vento sopra, demonstrando em concreto do que se trata o abandono à misericórdia de Deus.

O cristianismo ignorou a criatividade da natureza. Foram necessário 1.300 anos para a Igreja Católica reconhecer o valor da espiritualidade celta após o sínodo de Withby (em 664 com o Sínodo de Whitby decidiu-se a latinização da Inglaterra cristã, ndr).

A Igreja celta tem raízes realmente profundas e importantes. Uma vez a filosofia grega separava o corpo da mente, e assim fazia também a Igreja quando era dominada pelo clericalismo. O pensamento provém do coração, faz com que o Paraíso entre na vida de todos os dias sem separá-los. E isso é muito verdadeiro em relação à Trindade, a ser entendida não como uma coisa absoluta, mas como três amores no coração do mesmo Deus.

ZENIT: É possível achar elementos de semelhança entre o monarquismo celta e o monaquismo beneditino?

Pe. Ray: Certamente existem semelhanças, como, por exemplo, o valor da hospitalidade. Para muitos historiadores não teria sido possível reevangelizar a Europa depois dos Bárbaros, sem o monaquismo. E também o monarquismo celta deu a sua contribuição nisso, embora tenha as suas diferenças com o monarquismo beneditino. Apesar da atenção à oração diária, presente em ambas as experiências, se o monarquismo continental requer uma específica estabilidade no mosteiro, a cultura celta manda os monges caminhar e pregar.

ZENIT: Francisco é o Papa do diálogo e da atenção com a Criação. O que você acha?

Pe. Ray: Papa Francisco é admirado por um número cada vez maior de pessoas. A tragédia dos cristãos é que os próprios cristãos se esqueceram de ser uma só família no mundo, porque a Palavra nos convence de que fomos criados juntos. Deus nos deu a forma para sermos cristãos unidos, mas depois nos dividimos. O problema é que as pessoas não querem reconhecer que tudo o que temos em comum é a fora da Criação, e isso o Papa Francisco está reconhecendo, embora até agora não tenha mudado nada de institucional. Está mudando o estilo pessoal, e as pessoas gostam muito, embora não necessariamente todos sigam os conselhos do Papa dá. Certamente, para a Igreja de Roma, nada mudou na instituição, mas apenas no estilo.

ZENIT: Quais são os pontos de contato entre a encíclica Laudato Si’ de Francisco e a espiritualidade cristã celta?

Pe. Ray: Os cristãos celtas reconhecem que a criação é Deus, e Deus é a criação, da qual todos nós somos parte. Assim os cristãos celtas estão ligados a todas as criaturas, amam os animais, compreendem que a natureza nos fez todos iguais. Enquanto a nossa sociedade capitalista nos leva a explorar o mais fraco para aumentar exponencial as riquezas dos mais ricos.

Na Bíblia domina a criação. No capitalismo domina o dinheiro e destrói-se a criação. O Papa Francisco está dizendo o que nós cristãos celtas já dissemos há uns séculos. O que dizemos é que na natureza os homens são todos iguais. E o Papa Francisco está expressando um pensamento que nós acreditamos há séculos. Ou seja, que os pobres foram largados à sua sorte e que a terra, com os seus recursos naturais, está para ser destruída. E nós devemos comprometer-nos a mudar tudo isso juntos.

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