terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

‘Boralá’

Era um daqueles raros milagres que acontecem com determinados vocábulos de uma língua.
Lev Chaim*
Outro dia, bati o olho pela primeira vez nesta pequena palavrinha da nossa bela língua, em uma conversa entre amigos na mídia social. Uma amiga pedia informações sobre o Renato ali mencionado. O tal Renato disse então a esta amiga sobre o seu livro recém lançado com sucesso no mercado (Ladeira da Memória) e que, para isto,  havia montado uma editora.
Ai, uma outra amiga, que trabalha na área cultural da cidade de Ribeirão Preto, respondeu a minha sugestão de imprimir o livro da Marguerita sobre ‘as formigas’ (elaborado em conjunto com a Miriam Portela), com esta palavrinha hilária:‘boralá’! Puff, ela me pegou de frente.
Apesar de tê-la apenas lido, pareceu que eu a havia ouvido dizer aquilo, com ritmo e cadência que me fizeram sorrir, viajar e até pensar em samba. Era um daqueles raros milagres que acontecem com determinados vocábulos de uma língua, milagres semânticos, ditos por alguém especial, de forma sonora, convidativa e positiva: ‘Boralá’ imprimir o livro das Formigas. Entendi à primeira vista, acreditem ou não, sem nunca ter lido antes aquela miraculosa palavrinha.
Não é que a fui procurar no dicionário e no google. Encontrei: Boralá – dicas de viagens; Bora lá – estudo de arte e design; Boralá bar – noites com memórias (salve-me Deus); e Bora lá – método em como ser um bom aluno, elaborado por um professor em Portugal, como estímulo aos  alunos. Talvez até seria bom lançar isto no mercado brasileiro, ou não?
E acabei por encontrar até um título de samba, vejam vocês: ‘Boralá’ (crioulo brasileiro de Sandra de Sá): Boralá pra quadra/ Boralá pro baile/ Sou crioulo preto brasileiro/ Esparramado pelo Rio de Janeiro/ Meu filho foi parar no estrangeiro! - O que mexe com você uma palavrinha mágica, não é mesmo?
Logo em seguida, bati o olho numa resposta que me pareceu absolutamente certa: ‘Boralá’- abreviação da frase ‘Vamos embora até lá’ ou, simplesmente, ‘Vamos’. Ai, relembrei a tremenda riqueza de nossa língua escrita e falada. Será que é a culpa de tantos anos de exílio não ter me dado conta disto antes? Anotações no lixo: já tinha o meu ‘Boralá’ escrito pela linda Érica (ups, quase que havia escrevia ‘dito’) e tudo se encaixou como uma luva.  
Foi esta bem humorada palavrinha que me deu oportunidade de conhecer a Érica mais de perto, quase de tão perto, que chegava a ouvir a sua voz doce sussurrando: ‘Boralá’! Lindo, lindíssimo, mas impossível! Eu só a conheço através da mídia social, porque ela é muita amiga do Renato, muito amigo meu, também na vida real. Mesmo assim, não tenho medo de dizer que a Érica é sucinta e rápida no gatilho.
Vejam vocês! Em um outro comentário, sobre um texto que falava da importância da lista de leitura para os alunos, criticada como arcaica e do tempo da onça, Érica foi direto à mosca: “Nada mais moderno do que ler os antigos! Belo texto, belas colocações”. Percebem agora, que tudo que ela escreve, tem sonoridade?
Com certeza, ainda vou ouvir este ‘Boralá’ ao vivo, da boca da própria Érica, no momento certo. Nada como um sonho de um dia de carnaval, quando o corpo parado, cansado, parece não mais querer andar e a cabeça faz o milagre de ressuscitá-lo, para a última vez, a última noite. Boralá Érica.
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou mais de 20 anos para a Radio Internacional da Holanda, país onde mora até hoje. Ele escreve todas as terças-feiras para o Domtotal.

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