segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Os imigrantes nos ajudam a descobrir o mundo

Por Iacopo Scaramuzzi
“É preciso agradecer os imigrantes que vieram à Itália e Europa por um motivo: ajudam-nos a descobrir o mundo”. Foi o que disse o superior dos Jesuítas, padre Adolfo Nicolás, durante uma visita ao Centro Astalli, o serviço para refugiados na Itália da Companhia de Jesus. O “geral” da Companhia destacou que a Ásia é “o caminho”, que Europa e Estados Unidos estão preocupados com a “verdade”, e América Latina e África estão preocupadas com a “vida”. “Por isso, necessitamos de todos, porque todos têm uma sabedoria e algo a oferecer à humanidade”.
“Vivi no Japão por mais de trinta anos e trabalhei durante quatro anos em um centro para imigrantes, em geral, a maior parte destes não tem documentos. Falo, pois, por experiência vivida”, disse Nicolás em um discurso que pronunciou durante sua visita por ocasião da Dia Mundial do Imigrante e do Refugiado, no último dia 14 de janeiro, e agora publicado pela revista “La Civiltà Cattolica”. “À luz do que vivi, confirmo: as imigrações são uma fonte de benefícios para os diferentes países, e são desde sempre, apesar das dificuldades e das incompreensões. A comunicação entre as diferentes civilizações se dá, de fato, através dos refugiados e dos imigrantes: é assim que se criou o mundo que conhecemos. Não se tratou apenas de acrescentar culturas a culturas: foi um verdadeiro intercâmbio. Isto é o que nos diz a história. Também as religiões (o cristianismo, o islã, o judaísmo) se difundiram no mundo graças aos imigrantes que abandonaram seus países e se moveram de um lugar para outro. Por isso, é necessário lhes agradecer, porque nos ‘deram’ o mundo, sem o qual estaríamos fechados dentro de nossa cultura, convivendo com nossos preconceitos e com nossos limites. Cada país corre o risco de se fechar em horizontes muito limitados, muito pequenos, ao passo que graças a eles o coração pode se abrir, e também o próprio país pode se abrir a novas dinâmicas”.
“Foram os imigrantes que criaram um país como os Estados Unidos, um país no qual se desenvolveu a democracia. Isto não aconteceu por acaso: ocorreu justamente porque se criou um ‘melting pot’, uma mistura de culturas e de pessoas. E nasceu um país assim. E, obviamente, poderíamos apresentar outros exemplos no mundo: Argentina, por exemplo, e assim sucessivamente”, destacou o superior dos jesuítas.
O padre Nicolás contou que “um bispo japonês, referindo-se ao versículo do Evangelho ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’, dizia que o ensinamento de Jesus pode ser aplicado a outras religiões. Agora, como superior geral dos jesuítas, tenho que viajar muitas vezes por todo o mundo, e constato que este bispo tinha razão. Ásia, em especial, pode ser considerada ‘o caminho’. De fato, na Ásia sempre se busca o caminho, o ‘como’: como fazer yoga, como se concentrar, como meditar. Yoga, zen, as religiões, o judô (considerado o caminho dos fracos, porque se serve da força dos outros) são considerados caminhos. Sem criar oposições, é preciso considerar que Europa e Estados Unidos estão preocupados, sobretudo, com a ‘verdade’; América Latina e África estão preocupadas com a ‘vida’. Os valores da vida são muito importantes, e por isso necessitamos de todos, porque todos têm uma sabedoria e algo a oferecer à humanidade. Chegou o momento em que a humanidade deve se conceber como uma unidade e não como um conjunto de muitos países separados entre si com suas tradições, suas culturas e com seus próprios preconceitos. É necessário pensar em uma humanidade que necessita de Deus, e que necessita de um tipo de profundidade que pode surgir somente da união de todos. Devemos, pois, estar agradecidos por esta contribuição dos imigrantes e dos refugiados para uma humanidade integral”.
Os imigrantes, além disso, “mostram-nos a parte mais frágil, mas também a parte mais forte da humanidade”. A mais frágil “porque experimentam o medo, a violência, a solidão e os preconceitos dos outros”; a mais forte porque “nos fazem compreender como superar o medo com o valor de correr riscos que nem todos são capazes de correr” e “até nos demonstram que há valores e realidades mais profundas que temos perdido”, coisa que acontece “quando se vivem situações extremas”, apontou Nicolás, que citou um fato que ocorreu a um jesuíta nos Estados Unidos.
“Durante um incêndio que se desencadeou próximo de sua casa, temeu que o fogo chegasse até a sua moradia. Confessou-me que, justamente enquanto era refém do medo, aprendeu a distinguir o que era importante e o que não era. De fato, não salvou o dinheiro, mas, ao contrário, levou um pacote de fotografias que lhe recordavam suas raízes e sua vida. Nesse momento, compreendeu que a parte mais importante estava dentro de si, não fora, nem sequer a casa. Os refugiados experimentam tudo isso: veem o perigo de frente e o enfrentam. Pensemos um segundo: Se nós já não tivéssemos uma casa, uma família, uma língua... Se tivéssemos só a vida, e também ela estivesse em perigo, o que faríamos? O que pensaríamos? O que e a quem amaríamos?”.
O padre Nicolás concluiu recordando que neste Ano da Misericórdia, conceito central do cristianismo, do islã e do judaísmo, “podemos aprender dos imigrantes e dos refugiados a ser misericordiosos com os outros. Aprendamos deles a ser humanos, apesar de tudo. Aprendamos deles a ter como horizonte o mundo, e não nossa pequena e restrita cultura. Aprendamos deles a ser pessoas do mundo”.
Vatican Insider, 11-02-2016.

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