Por Dom Pedro Brito Guimarães*
“Como é bom, como é agradável habitar todos juntos, como irmãos. É como óleo fino sobre a cabeça, descendo sobre a barba de Aarão, descendo sobre a gola de suas vestes” (Sl 133). Todos os anos, nesta solenidade - Missa da Unidade e do Crisma - escolhemos um tema para a nossa meditação, que sirva para a Semana Santa e, quem sabe, de programa de vida para todo o ano. Este ano escolhemos o “óleo da consolação”. Santo Inácio diz que vivemos ou em estado de consolação ou em estado de desolação. Os sinais de consolação são paz, alegria, confiança, ânimo, coragem, abertura, sentido da vida... E os sinais de desolação são inquietação, angústia, tristeza, desconfiança, desânimo, fechamento, obscuridade, confusão, irritação... Quem está na consolação se previna para não entrar na desolação e quem está na desolação se prepare para entrar na consolação. O Brasil está passando por um momento de crise e de instabilidade social, política, econômica e jurídica. A sociedade brasileira está em estado de desolação. O coração verde-amarelo está despedaçado. As feridas do pecado são visíveis, doloridas e estão deixando marcas e cicatrizes. Mas, se existem feridas e doenças, existem também remédios e curas “se dermos, ao menos, um passo, em direção de Deus” (papa Francisco, O nome de Deus é misericórdia, 25-26.92).
Como se chama este remédio? O remédio é o óleo da consolação. O papa Francisco, na Bula de proclamação do Ano Santo da Misericórdia, diz textualmente: “Neste Ano Santo, poderemos fazer a experiência de abrir o coração aqueles que vivem nas mais variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria de forma dramática. Quantas situações de precariedade e sofrimentos presentes no mundo atual! Quantas feridas gravadas na carne de muitos que já não tem voz, porque o seu grito foi esmorecendo e se apagou por causa da indiferença dos povos ricos. Neste jubileu, a igreja sentir-se-á chamada ainda mais a cuidar destas feridas, aliviá-las com o óleo da consolação, enfaixá-las com a misericórdia e tratá-las com a solidariedade e atenção devidas” (papa Francisco, Misericordiae Vultus,15).
E quais são os óleos da consolação contidos e oferecidos nesta Sagrada Liturgia? Primeiro óleo da consolação: Jesus Cristo. Na Sinagoga de Nazaré, orante, com a Palavra nas mãos, ungido pelo Espírito Jesus se oferece para curar as nossas debilidades e catividades. Com é bonito ver Jesus orando, lendo a Palavra e atualizando-a na sua e na nossa vida. Como é bonito ver Jesus curando as enfermidades e as feridas da alma e do corpo do seu povo. Este mesmo Jesus, pregador da salvação e do amor, está muito bem desenhado na segunda leitura. O apocalipse não é um supercomputador que faz previsão ou advinha o futuro. É antes, uma profecia, pronunciada, em nome de Jesus, “a testemunha fiel, o primeiro a ressuscitar de entre os mortos, o soberano dos reis da terra, o amém, o alfa, o ômega, aquele que é, que era e que vem, o todo-poderoso” (Apoc 1,5.8). Jesus é o médico da Igreja. O “doutor Jesus” está à nossa espera para curar. Para vê-Lo e ouvi-Lo assim é preciso exercitar os apostolados dos olhos e dos ouvidos. Mas quem é Jesus para mim? Que lugar ocupa na minha vida? Onde O coloco nos espaços da minha existência?
Segundo óleo da consolação: o Espírito Santo que desceu sobre Jesus, o ungiu e o consagrou para a missão. O Espírito Santo é definitivamente descido do céu para ungir e consagrar a Jesus e os seus seguidores: “o Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção” (Lc 4,16) “para consolar os que choram, dar a estes a coroa, em vez da cinza e o óleo da alegria em vez da aflição” (Is 61,3). Assim com Jesus, nós também somos destinatários desta unção do Espírito. Ele é o cumprimento das Escrituras, a qual se refere Jesus. A liberdade que ele oferece, com a unção com o óleo da alegria e da consolação, é endereçada aos pobres, aos cativos, aos cegos e aos oprimidos (Lc 4,18). Os pobres são vítimas da desordem social e da penúria dos bens econômicos; os cegos sofrem por defeitos físicos; e os cativos e os oprimidos são vítimas da maldade de irmãos contra os irmãos e as irmãs. Nestas quatro formas de catividades estão todas as outras misérias humanas, decorrentes do pecado. O Espírito é o médico e o tesouro espiritual da Igreja. Falamos muito do Espírito Santo. Mas que Espírito cultuamos? É o “espírito” da tibieza, que paralisa e engessa ou o Espírito que dinamiza, energiza, incomoda e produz ousadia e audácia?
Terceiro óleo da consolação: os Santos Óleos que abençoamos. A Igreja, segundo o papa Francisco, é o “hospital de campanha”, e a “família é o hospital mais próximo” (86-87 e 125). Elas devem estar onde estão os combates da vida, para curar as pequenas e grandes doenças, prontas para o “pronto-atendimento” e os “primeiros-socorros”. O óleo, desde o mundo antigo, sempre foi um elemento precioso e de múltiplos usos: alimentício, terapêutico, medicinal, lúdico, esportivo, bélico e laboral. Enquanto permanecer nos frascos não serve para muita coisa. Sua missão é doar-se, urgir e desaparecer. Assim também é a Igreja: se doa, serve, vive para os outros. Somos óleos que perdem a eficácia quando nos fechamos nos frascos bonitos e ficamos nas estantes das Igrejas e das casas paroquiais. Nos textos bíblicos o óleo é exaltado como o “óleo da alegria” (Is 61,3) e “óleo consagrado” (Sl 88,21). E nos textos eucológicos é ressaltado com “óleo generoso”, “óleo santo” (Bênção do óleo dos enfermos), “sinal de fortaleza” (Bênção do óleo dos catecúmenos), “óleo tão rico” e “sacramento a perfeita salvação” (Bênção do óleo do crisma). Os Santos Óleos são bálsamos e unguentos da Igreja para sarar as feridas, decorrentes do pecado. O ungido com estes óleos é chamado de sacerdote, para formar um reino de sacerdote e de ministros de Deus (Is 61,6; Apoc 1,6). E são estes óleos santos que fazem de nós sacerdotes para Deus, para cantar eternamente o amor do Senhor (Sl 88). Os óleos que consagramos é para uma Igreja em saída, para fazer de nós um reino de sacerdotes e ministros do nosso Deus (Is 6,6; Apoc 1,6). São Paulo diz que “somos o bom odor de Cristo para Deus, entre os que salvam e os que se perdem; para uns, odor que da morte leva à morte; para outros, odor da vida que leva à vida” (2Cor 2,16). Que odor somos e temos? O da vida ou o da morte? O que vamos fazer com estes óleos? Vamos conservá-los em nossas prateleiras ou vamos abri-los para urgir, consagrar, perfumar e curar as feridas dos corações despedaçados?
Agora, sim, temos os instrumentos, as graças, os dons, as potencialidades e as condições e somos empoderados para a recepção e aplicação do Plano Arquidiocesano de Evangelização que tem a Família e a Comunicação como Prioridades e a Iniciação à Vida Cristã como Urgência. Com esta unção, sem sombra de dúvida, este ano vai ser o Ano da Graça do Senhor.
O nome de Deus é misericórdia e Jesus é o rosto de misericórdia divina. Sem misericórdia o mundo nem existiria. Tudo o que existe na terra e no universo é fruto da misericórdia de Deus. Neste Ano Santo da Misericórdia as nove portas da misericórdia continuam abertas, de norte a sul, de leste a oeste, para a passagem dos peregrinos da fé. Para todos nós o Senhor proclama este ano, o Ano da Graça do Senhor, no Jubileu da Misericórdia. Jesus é Santo, o Espírito é Santo e os Óleos são Santos para nos santificar. Hoje também para nós se cumpriram as Escrituras que acabamos de ouvir. Portanto, são três os óleos da consolação que o Senhor disponibiliza para nós hoje, aqui e agora. A terra é a nossa casa comum. A responsabilidade para com ela é de todos nos. Parafraseando o lema da CF-2016: “Quero ver o óleo da consolação brotar como a fonte e a escorrer como um riacho que não seca!” Amém!
CNBB, 28-03-2016.
*Dom Pedro Brito Guimarães: Arcebispo de Palmas (TO).
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