terça-feira, 29 de março de 2016

Os 5 meios para vencer a fome dos que vivem perto e longe de nós


Reflexão de Frei Patrício Sciadini, ocd. “Estômago não tem carteira de identidade e nem passaporte, nem nacionalidade. Fome é fome”

Somalians sit in the sun as they wait for food provided during Operation Provide Relief, Somalia.  This sign was one of many sights taken-in by a congressional fact-finding delegation.  The delegates, directed by Rep. John Lewis (D-GA) and Rep. Bill Emerson (D-MO), toured several humanitarian relief sites to determine the impact of U.S. aid in the besieged country.
Foto: Wikipedia
Não há um tempo para as obras de misericórdias. É sempre o Kairos de Deus, que nos convida para estarmos de olhos abertos para que  não sejamos indiferentes diante do sofrimento das pessoas. Estômago não tem carteira de identidade e nem passaporte, nem nacionalidade. Fome é fome. Não se pode compreender o que é fome se nunca tem passado fome por falta de comida. Hoje em dia há pessoas que passam fome “por esporte”, querem emagrecer para estar em forma nas próximas férias, ou para perder kg  depois de ter comido demais. Mas esta fome não é a dos famintos de que fala o evangelho, onde a pessoa quer comer e não tem. Vê com tristeza que pão, comida, são desperdiçadas e elas, como pobres lázaros, estão nas portas, procurando as migalhas  do que cai da mesa.
É triste ver anúncios em jornais de primeira mão onde se fala de “restaurantes para gatos e cachorros”, e supermercados  para animais e ate jóias preciosas para festejar o aniversario de Luli, um gato siamês. Quando saio de casa vejo pessoas que mendigam um pedaço de pão. Recordo, uma vez  estava  em São Paulo e parei  no sinal porque era vermelho  e por hábito  fechei a janela do carro. Uma criança bateu no vidro e me olhou com olhos  marejados de lágrimas e de tristeza. Abri e ela me disse: “tio, eu não sou um ladrão, tenho fome!”  Parei o carro e desci para  conversar e  oferecer um pãozinho na próxima padaria da esquina. Essa criança que se chamava André foi para mim  Jesus, que bateu a minha porta e me deu uma lição de fraternidade, de moral e de evangelho, como nunca tinha  recebido.
Mas infelizmente   esqueci e nem sempre recordo  tudo isto. A geografia da fome no mapa do mundo é terrível, não podemos ficar de braços cruzados. O que importa, o que Jesus exige de cada um de seus discípulos é  que nunca  perto de nós tenha alguém que, por causa do nosso egoísmo, “passe fome”, mas que todos tenham comida e comida em abundancia. A fome  no planeta é um problema que poderia ser resolvido  se houvesse  interesse político e humano. Boa vontade. Dizem as estatísticas que  todos os anos  se  desperdiçam milhões de toneladas  de comida, que seriam suficientes para  dar de comer a todos. Mas por que então isto não é possível e se recorre  a caminhos que não são autênticos e nem verdadeiros? “Se queremos vencer a fome do mundo  devemos limitar o número dos filhos, somos muita gente no planeta e a terra não suporta mais a não ser ‘EU’”.
O muro do egoísmo é o mais terrível de todos os muros, que a mente humana pode construir. Quem controla os muros do egoísmo é o diabo e nos impede de sermos cristãos.  A palavra de Deus nos recorda que nunca se nega um copo de agua e um pedaço de pão para ninguém, nem para os inimigos. Poderia fazer aqui uma lista de textos bíblicos que nos convidam a repartir o pão com os que têm fome. Mas dispenso destas citações e somente recordo as palavras  de Jesus “tive fome e me deste de comer”. E Jesus, na sua caminhada humana entre nós, teve sempre uma sensibilidade particular para os que tem fome. Não multiplica os pães para os saciados, mas para os que tinham fome  ,para os necessitados.
É belo como por ocasião do Ano da Misericórdia o Papa tirou a poeira  das  obras de caridade corporais e nos recordou que  o dar de comer  aos que tem fome, antes de ser um ato de justiça humana, é um ato de caridade e de amor.  A única “guerra santa” que todos os países devem assumir é contra a fome e a miséria. Uma luta que somente pode ser vencida juntos. O Papa São João  Paulo II,  escrevendo   a carta ao Superior Geral do Carmelo  Descalço por ocasião do 4º. Centenário da morte de São João da Cruz, em 1991, fala das novas noites escuras  do mundo contemporâneo. “O doutor místico chama hoje a atenção de muitos crentes e não crentes pela descrição  que faz da noite escura como experiência tipicamente humana e cristã. Nossa época viveu momentos dramáticos nos quais o silêncio ou ausência de Deus, a experiência de calamidades e sofrimentos, como as guerras ou o mesmo holocausto de tantos seres inocentes, fizeram compreender melhor esta expressão, dando-lhe além do mais um caráter de experiência coletiva, aplicada à realidade mesma da vida e não só a uma fase do caminho espiritual. A doutrina do santo é invocada hoje ante esse mistério  insondável da dor humana. Me refiro a esse mundo específico do sofrimento do qual falei na carta apostólica Salvifici doloris. Sofrimentos físicos, morais o espirituais, como a enfermidade, a praga da fome, a guerra, a injustiça, a solidão, a carência do sentido da vida, a mesma fragilidade da existência  humana, a consciência dolorosa do pecado, a aparente ausência de Deus, são para o crente uma experiência purificadora que poderia chamar-se noite da fé. (n. 14).” Ele cita a fome, a miséria, a violência … Estas noites escuras que não são provas de Deus, mas frutos da indiferença e da injustiça e contra as quais devemos lutar.
Cinco meios para vencer a fome dos que vivem perto e longe de nós:
  1. Ver em todos necessitados e famintos, além das feições humanas, o Cristo que pede um pedaço de pão  e nunca negar isto a ninguém. Não devemos nos esconder   atrás da desculpa: “se eu dou dinheiro não sei o que vão fazer”. Então, dê pão, dê comida. Nunca dar comida “estragada e velha”. Pobre não é lixeiro, ele merece o melhor. O que não serve para nós  ou que nós não gostamos, não devemos dar ao pobre.
  2. Educar os filhos, as pessoas que convivem conosco, a não abusar de comida e não estragar comida, sabendo que enquanto nós estragamos, há por aí pessoas que morrem de fome, especialmente crianças. Saber repartir com os outros o que nós comemos.
  3. Se você não conhece quem tem fome, vá na paróquia, fale com seu vigário. Ame os pobres, ajude, coopere  no caso com o trabalho, mas também com sua oferta  generosa  pessoal, fruto do seu sacrifício e porque você eliminou o supérfluo e luxo de suas comidas.
  4. Saber não só ver os famintos perto de nós, mas também os longínquos. Através  das obras missionarias ou outros  meios fazer  chegar a nossa ajuda a tantos famintos do mundo. Sejamos lutadores  e profetas corajosos contra a epidemia da fome.
  5. Abrir os horizontes, não restringir a palavra fome só ao “estômago”, mas sim  tentar descobrir perto de nós os famintos dos valores humanos, fome de justiça, de cultura, de paz, de perdão, de amor…
A obra de misericórdia “dar de comer aos famintos”  nos desinstala do nosso comodismo e nos obriga a ir às “periferias”, onde tantas pessoa sofrem por causa da fome   e não encontram ninguém que reparta com ele  o pão para o corpo, mas também  o pão da palavra de Deus, da escuta, da acolhida. Não sejamos surdos ao grito dos famintos.
Zenit

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