A magnitude de seu talento e sua curta vida mexeu e como com a minha emoção.
Por Lev Chaim*
Entrei rápido no trem rumo à Amsterdã, eufórico e preparado para uma viagem de uma hora. Isto, para visitar a exposição sobre o lado desconhecido da cantora britânica Amy Winehouse, agora em exibição no Museu Histórico Judaico da capital holandesa, depois de ter passado por Londres, Tel Aviv, Viena e São Francisco – “Amy Winehouse: um retrato de família”. Ela fica ali até o dia 4 de setembro.
No meio do caminho, na cidade de Utrecht, entrou um senhor de terno, ocupou o lugar vago ao meu lado e abriu o jornal holandês NRCHandelsblad (22/03). Dei uma espiada pelo rabo do olho. Não é que ali, numa matéria de página inteira, estava um artigo sobre o Brasil com o título: “Tudo errado no Brasil, o país das ‘maravilhas’! No que deu para ler, assim meio disfarçado, era que o PT, no poder desde 2003, não havia investido em educação, saúde e nem em infraestrutura como havia prometido.
E do outro lado da página, uma matéria sobre a visita de Obama à Cuba com o seguinte título: “Para o povo cubano, o presidente americano ainda permanece distante”. Lido isto, virei-me para a janela e admirei a paisagem. Alguns pontos do céu já estavam azuis. Não iria me preocupar com esses assuntos agora. O dia era para a exposição de Amy Winehouse. Como uma mantra, repeti várias vezes: ‘Deus, cuida do Brasil’.
Foi bom, pois quando entrei no museu já estava calmo e pude de cara sentir o forte efeito da exposição montada pelo irmão mais velho da cantora, Alex Winehouse. Retratos de Amy, de quando adolescente e bem jovem, no momento em que seu mundo ainda era ‘tudo cor de rosa’, estavam espalhados pela sala. Foi um choque positivo, pois tudo era muito simples, singelo e bem longe da mulher vampiresca, exótica que magnetizou o mundo com a sua extraordinária musicalidade e talento.
Não era uma exposição grande, mas deixava uma profunda impressão sobre o outro lado daquela que morreu aos 27 anos, alcoolizada, segundo a autópsia oficial, após ter sido encontrada caída em seu flat londrino, em julho de 2011. Em uma foto, na varanda da casa da avó, notava-se uma Amy sonhadora, com um espesso cabelo preto, escorrido e totalmente diferente de seus modelos de quando já famosa, em forma de uma pirâmide de algodão doce.
Filha de judeus e crescida numa comunidade judaica de Londres, Amy tinha uma relação especial com a origem de sua família. Ela sempre lembrava aos mais íntimos o que sentia: “Ser judia para mim é como pertencer a uma grande família e não tem nada a ver com o acender das velas e o recitar de orações.”
Como disse, a exposição é todinha formada de fotos de sua juventude, seus vestidos favoritos, sapatos, objetos pessoais, tal qual a sua favorita guitarra, que sempre dividia com o irmão Alex. A sua coleção de discos já deixava antever o seu bom gosto musical, mesmo antes de se tornar um ídolo. E se podia ver também seus dois livros favoritos: Hitchcock e Hunter S. Thompson.
O que mais me impressionou foi um varal com os vestidos favoritos da artista pendurados todos juntos, sem qualquer proteção especial. Fique pasmo frente ao vestido azul escuro, com penduricalhos prateados, que ela apareceu no festival de Glastonbury, Somerset, Inglaterra, em 2008. Pregado no vestido ali pendurado, ainda estavam alguns fios de cabelos da cantora, como se ela acabasse de tê-lo tirado e o pendurado ali agora. Era como se espionássemos a sua intimidade de perto, bem de perto.
Ao deixar a sala de exposição e transpor a porta para outras salas do museu, ouvi no alto falante o concerto de Amy, quando ela esteve no North Sea Festival, na Holanda, em 2004; como também a sua magnífica apresentação no programa irlandês ‘Outras Vozes’, em 2008, cantando o seu sucesso, Back to Black.
O contraste entre o singelo da exposição, a magnitude de seu talento e sua curta vida mexeu e como com a minha emoção. Carpe diem (aproveite o dia, aqui, agora, que o futuro a Deus pertence, como dizia a minha avó). Só na volta, dentro do trem, é que voltei a pensar no Brasil!
Confira o sucesso Back to Black de Amy Winehouse:
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou mais de 20 anos para a Radio Internacional da Holanda, país onde mora até hoje. Ele escreve todas as terças-feiras para o Domtotal.
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