sexta-feira, 17 de junho de 2016

Gente burra

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Truque de mestre: convite a sair da própria caixinha.
Por Gilmar P. da Silva SJ

Tenho impressão de que o número de pessoas burras aumentou. Desculpa-me se eu for politicamente incorreto ou se minhas considerações forem estapafúrdias. Talvez eu mesmo esteja sendo burro agora. Chamo burrice a toda ignorância articulada como sabedoria. Não há problema em não saber ou, mesmo, em errar. A questão está em se arrogar de um conhecimento que não se tem.

Um grande exemplo de burrice está nas discussões políticas atuais. Nas vociferações midiáticas acerca da esquerda ou da direita, ouvem-se argumentos idiotas, pautados em preconceitos, falácias e interpretações rasas. O caso do estudante que se rejeitou a responder uma questão sobre Marx como protesto contra a “doutrinação nas universidades” seria risível se não fosse trágico. Conhecer o pensamento de um autor e dominá-lo não é doutrinar ninguém. Até para se refutar um postulado, deve-se conhecê-lo com um mínimo de propriedade.

Quando comecei a estudar Kierkegaard, que se opõe a Hegel, precisei entender primeiro o pensamento hegeliano. Querendo mergulhar no autor que trata tanto da existência e de seus paradoxos, demandei entender sua estruturação lógica e perspectiva dialética, o que me fez parar em Leibniz. Isso porque o diferente aclara minha própria posição, seja como contraponto ou na relação de superação entre um e outro. Se o estudante que não tem simpatia por Marx, estuda-lo e conseguir apontar seus pontos de incoerência seria louvável. O que não dá para fazer é sair repetindo expressões de efeito tiradas de redes sociais. O fato de projetos socialistas não ter funcionado como seu ideal, não quer dizer que toda teoria marxista esteja errada. O mesmo vale para o liberalismo ou qualquer outra corrente de pensamento, seja econômica ou de qualquer ordem. Mesmo Foucault, levando em conta as considerações do autor de O Capital, não é concorde em tudo, refutando proposições e levando outras mais adiante.

Para se refutar um pensamento é necessário conhece-lo. Muito embora o acesso a informação hoje seja muito mais fácil, há ainda quem tenha a preguiça de aprofundar temáticas e averiguar fontes, o que poderia se dar no uso de qualquer buscador como Google ou Bing. Talvez o problema seja menos o acesso do que o arcabouço cultural para uma devida crítica e análise. Daí a opção, feita pelas massas ignorantes, por pessoas que as possam representar e a quem podem seguir acriticamente. A credibilidade que tais pessoas-filtro ou formadores de opinião têm, com frequência, fundamenta-se no mero reconhecimento social ou fama, não pela profundidade de suas ideias. Isso faz com que, em torno de tais líderes, juntem-se mais e mais ignorantes que o apoiem e a si, mutuamente, compondo comunidade de idiotas.

O idiota é aquele que está encerrado em si. Tendo o eu como referência do mundo, não conseguem ler a realidade com mais complexidade. O idiota não dá espaço para a alteridade, não deixa que o outro caiba em seu mundo e por isso é raso. Pessoas que se negam a alargar o espírito são pobres no que podem ofertar ao mundo. Mas hoje, com o acesso mais popularizado aos meios de comunicação, sua voz se faz ouvir mais fortemente ao se juntar a de outros idiotas que compartilham das mesmas ideias. Daí se discute aborto sem conhecimento algum do processo de evolução embrionária; de religião e bíblia, sem método hermenêutico e teológico; de política, sem visão de história ou filosofia. Não quer dizer que qualquer debate deva ser reservado a uns poucos, mas uma visão curiosa e ampla daria conta de perceber que nem tudo o que se diz na internet é verdade e que, não é por que está na Wikipédia que um conhecimento é verdadeiro. Para não ser burro, há de se ter clareza dos critérios do próprio pensar, ser autocrítico.

Truque de mestre

Um convite a sair da própria “caixinha” e desconfiar daquilo que aparenta ser verdade são os filmes da franquia Now you see me, traduzido no Brasil como Truque de mestre. O nome original é típico dos números de mágica, quando o ilusionista diz “Agora você me vê (com determinada coisa), agora você não me vê”. Em cartaz no cinema Truque de mestre: o segundo ato, continua a saga da equipe de mágicos, denominados Os cavaleiros. Como no primeiro filme, nada é o que parece ser.

A história se dá em torno do roubo de um chip que seria capaz de obter transito livre na internet, acessando e controlando qualquer conteúdo. O processo vai aprofundar na história de alguns personagens e esclarecer elementos do filme anterior. Por isso é bom ver o primeiro antes deste Segundo Ato. O elenco principal se mantém, com a alteração apenas de Isla Fisher por Lizzy Caplan e a adição de Daniel Radcliffe. Lizzy dá mais humor ao filme, enquanto Daniel parece que é utilizado apenas para atrair os fãs de Harry Potter, porque seu personagem foi pouco explorado.

Com a direção de Jon M. Chu, a história mantém o tom fantástico dos truques de mágico, ainda que na história todos sejam hiperbólicos. Não é um grande filme em narrativa ou estética, mas uma boa opção de lazer.

Gilmar P. da Silva SJ
Mestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa em Signo e Significação nas Mídias, Cultura e Ambientes Midiáticos. Graduação em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Possui Graduação em Filosofia (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Experiência na área de Filosofia, com ênfase na filosofia kierkegaardiana.

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