segunda-feira, 11 de julho de 2016

Cuidado, mulher!

 domtotal.com
Conquistas e direitos femininos são alvos de ameaças.
Leis e conquistas históricas para as mulheres correm o risco de serem alteradas.
Leis e conquistas históricas para as mulheres correm o risco de serem alteradas.

Por Pablo Pires Fernandes*

Extinguir o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos já seria, por si só, um ato de restrição de direitos civis. A decisão do presidente interino, no primeiro dia de exercício da Presidência, não apenas contraria o plano de governo pelo qual foi eleito, mas demonstra a intenção de desmontar a política social que, mesmo com problemas e tropeços, realizou avanços notáveis em prol da igualdade e combate ao preconceito na última década.

É o caso de destacar aqui a sanção pelo presidente Lula da Lei 11.340 (7/08/2006), conhecida como Lei Maria da Penha, instituída para “coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher”; a aprovação da Lei 13.104 (9/03/2015), chamada Lei do Feminicídio, que torna crime hediondo o estupro e altera no Código Penal a tipificação da morte de mulher por sua condição de mulher como feminicido e não homicídio; e a criação do programa Mulher viver sem violência, formalizado pelo Decreto 8.086 (30/08/2013), que busca ampliar a assistência à mulher por parte do Estado e reverter a triste realidade de violência de gênero no país.

Estas leis são conquistas históricas e correm o risco de serem alteradas. Nota-se que a modificação ocorre sob um governo interino sem qualquer representante feminina ou de origem afrodescendente no primeiro escalão. A composição ministerial deixa evidente a iniquidade para com esses dois grupos, ambos constituintes da maioria da população brasileira.

Além de irônicas críticas da mídia internacional, organizações da sociedade civil vieram a público denunciar a ameaça de desconstrução de uma política que conquistou avanços fundamentais. Várias entidades que compõem o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), órgão do Ministério da Justiça, renunciaram coletivamente aos cargos em protesto contra a política do governo interino. A abertura da 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em 10 de maio, foi marcada por críticas ao governo provisório e pelo temor de retrocesso.

A ameaça aos direitos humanos foi denunciada em nota pela Anistia Internacional (AI). Nadine Gasman, representante no Brasil da ONU Mulheres, criticou o ministério e pediu que as conquistas e políticas pelos direitos da mulher sejam preservadas.

Não parece, porém, que os atuais ocupantes do Palácio do Planalto e da Câmara dos Deputados sejam sensíveis aos apelos da sociedade civil. A nomeação da ex-deputada federal Fátima Pelaes para a Secretaria Especial de Política para as Mulheres, órgão subordinado ao Ministério da Justiça e Cidadania (portanto, sem status de ministério), foi recebida com críticas de todos os lados. Evangélica e contrária ao aborto (até em casos de estupro), ela é investigada por suposta participação em esquema de corrupção.

Mas há outras ameaças. Um deles é o Projeto de Lei 5069 (de 2013), de autoria do deputado Eduardo Cunha, ex presidente da Câmara dos Deputados,  e em tramitação na Casa, que impede que as mulheres vítimas de estupro sejam atendidas nas emergências dos hospitais antes de terem feito o registro em delegacias. Outra é o Projeto de Lei Complementar 07/2016, que altera a Lei Maria da Penha. Já aprovado na Câmara, é alvo de debate no Senado. A proposta dá poderes aos delegados de polícia para decidir sobre a aplicação de medidas de proteção às mulheres vítimas de violência doméstica, o que, na atual legislação, é prerrogativa exclusiva da Justiça. A alteração legal é contestada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (Conamp) e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 

Para a garantia dos direitos conquistados pelas mulheres, apenas a mobilização da sociedade civil e o acompanhamento das decisões tomadas pelo Executivo e pelo Legislativo podem ter algum efeito. A dúvida, entretanto, é se existe qualquer interesse nessas instâncias de ouvir os cidadãos que representam ou se o próprio umbigo dos excelentíssimos senhores vai prevalecer.

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