As nossas grandes cidades não cabem mais naquela lenda do Brasil, país da cordialidade.
Em dias nublados fica ainda mais triste andar por suas ruas.
Por Ricardo Soares*
Vou lhes fazer o estranho convite de passearem pela minha cidade. De cara vou lhes dizer que ela não é bonita e foi esvaziada pelo medo, pela insegurança , pela desmedida ganância da especulação imobiliária. É uma cidade onde a cultura de rua resiste bravamente como musgos entre as pedras mas vem perdendo sua "humanidade" já faz algum tempo.
Em dias nublados fica ainda mais triste andar por suas ruas seja nos tais "bairros nobres" seja nos locais mais populares. Não dá para ir simplesmente flanando por aí , olhando as vitrines, pois sempre se está com um olho no peixe e outro no gato, aquele medo que nos incutiram de temer todo os semelhantes como suspeitos em potencial.
Em dias nublados fica ainda mais triste andar por suas ruas seja nos tais "bairros nobres" seja nos locais mais populares. Não dá para ir simplesmente flanando por aí , olhando as vitrines, pois sempre se está com um olho no peixe e outro no gato, aquele medo que nos incutiram de temer todo os semelhantes como suspeitos em potencial.
As mais soturnas previsões embutidas em livros fundamentais e apavorantes que lemos no passado ( tanto "1984" quanto "Admirável Mundo Novo" ) se confirmam e até pioram. Na minha cidade o próximo mais próximo é aquele que nos dá medo. Não é aquele que possa talvez nos ajudar, nos cumprimentar com um sonoro bom dia estampado no rosto.
As nossas grandes cidades, a minha, a sua, as nossas, não cabem mais naquela lenda do Brasil , país da cordialidade , e nem naquela premissa do profeta que vagava vestido de branco pelas estradas : de que a gentileza gera gentileza. A delicadeza foi perdida e , lógico, vicejam todos os dias iniciativas e pessoas que nos fazem crer que nem tudo está perdido. Sucede que eu vivo e vocês também o "aqui e agora" e gostaríamos de poder passear por nossas grandes cidades sem sobressaltos, sem medos, sem receios. Uma ambição que de tão simples nem é uma ambição , é um direito. Mas ao nos ensinarem desde sempre a lógica do capitalismo selvagem de que só o dinheiro traz felicidade e só o acumulo de bens nos faz feliz estamos fadados a ficar trancafiados em nossas masmorras internas e externas cada vez mais ? Espero que não seja pois para sempre e que ainda possa nessa minha encarnação possa convidar vosmecês a passear pela minha grande cidade sem receio.
*Ricardo Soares é escritor, diretor de tv, roteirista e jornalista. Publicou 7 livros , dirigiu 12 documentários e foi cronista dos jornais " O Estado de S.Paulo" , "Jornal da Tarde" e da revista "Rolling Stone".
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