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Estima-se que 20 milhões de crianças sofram atualmente este tipo de violência.
Acredita-se que 80% dos filhos de pais divorciados já sofreram alguma espécie de alienação parental.
Por Renato Campos Andrade*
Casamento é coisa séria. Decidir ter filhos é mais ainda. Após o rompimento matrimonial, não é raro que um dos pais, magoado com o outro, use os filhos para se vingar. Trata-se da alienação parental.
Existe, inclusive, a classificação médica da Síndrome da Alienação Parental. O termo foi criado pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner, na década de 1980. É uma programação ou lavagem cerebral realizada por um dos pais para que o filho rejeite o outro, especialmente se for criança sem discernimento completo.
A pessoa que comete a alienação é chamado de alienante. Já a criança e o outro genitor são os alienados. Conforme descrito no site especializado alienacaoparental.com.br, a atuação do alienante ocorre geralmente no seguinte sentido:
- exclusão do outro genitor da vida dos filhos, de maneira a tomar decisões importantes e não comunicar ao outro, bem como não compartilhar fatos importantes da vida das crianças;
- interferência nas visitas. Realiza um controle excessivo dos horários e dias, bem como atua para que elas sejam desinteressantes;
- ataca a relação entre o filho e o outro genitor com uma guerra psicológica que impõe que a criança escolha um genitor preferido e tome partido no conflito, inclusive de maneira a dizer que o outro é uma pessoa perigosa, além de esconder e estragar os presentes recebidos do genitor alienado;
- denigre a imagem do outro genitor - faz comentários desabonadores sobre a pessoa e o comportamento do genitor alienado, bem como critica sua atuação profissional. Chega a emitir falsas acusações de abuso de drogas, álcool e até abuso sexual.
Tais atitudes geram uma consequência desastrosa na formação e na vida da criança, que passa a nutrir raiva do alienado, negando a se relacionar com o pai ou a mãe. Além disso, o site destaca que as crianças e adolescentes passam a ser mais propensas a apresentar distúrbios psicológicos como depressão, ansiedade e pânico; utilizar drogas e álcool como forma de aliviar a dor e culpa da alienação; cometer suicídio; apresentar baixa autoestima; não conseguir uma relação estável, quando adultas; possuir problemas de gênero, em função da desqualificação do genitor atacado.
Estima-se que 80% dos filhos de pais divorciados já tenham sofrido alguma espécie de alienação parental e que mais de 20 milhões de crianças sofram atualmente este tipo de violência.
Para preservar as crianças e permitir aos pais igual acesso aos filhos, a Lei 13.058/14 estabelece, em regra, que a guarda dos filhos deve ser compartilhada. A lei, inclusive, alterou o artigo 1.583 do Código Civil no seguinte sentido:
§ 2º - Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos.
A guarda compartilhada, ao contrário da unilateral (que mantém a criança sob a supervisão de apenas um dos pais, mas com vigília do outro), confere a ambos o poder familiar, garantindo o amplo acesso ao cotidiano dos filhos. No entanto, não é a solução, visto que a alienação parental pode ser realizada ainda que um dos pais divida o tempo da guarda com o outro.
O tema é abordado no artigo Alienação parental e a tentativa de separação de vínculos, da advogada, pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e mestranda em Mediação e Resolução de Conflitos, Ana Bárbara de Lima e Souto.
“Conforme a própria legislação, alienação parental é a prática de atos coercitivos a fim de romper com os laços afetivos entre a criança ou adolescente e um de seus pais. Esta prática pode ser induzida por qualquer pessoa que detenha a guarda ou responsabilidade sob a criança ou adolescente”.
Ela ressalta que após o diagnóstico, por meio de perícia técnica ou equipe multidisciplinar habilitada, o juiz responsável pela demanda poderá adotar as medidas trazidas pela legislação pertinente de forma cumulativa ou não, dependendo da gravidade dos atos de alienação e das consequências já existentes. “As medidas ou penalidades podem variar de simples advertência ao alienador à suspensão da autoridade parental, passando ainda pela alteração da guarda, alteração do domicílio da criança ou adolescente, acompanhamento psicológico e/ou psicossocial e até aplicação de multa”.
Já o advogado e economista Paulo Akiyama destaca no artigo Alienação parental poderá ser tratada como crime que já existe um movimento para tornar a Lei de Alienação Parental mais rigorosa. O advogado cita o Projeto de Lei 4.488/16, de autoria do deputado federal Arnaldo Faria de Sá:
Art. 3º
§ 1º - Constitui crime contra a criança e o adolescente, quem, por ação ou omissão, cometa atos com o intuito de proibir, dificultar ou modificar a convivência com ascendente, descendente ou colaterais, bem como àqueles que a vítima mantenha vínculos de parentalidade de qualquer natureza.
Akiyama frisa a importância de se aprovar o projeto. “Assim, demonstra-se que a prática da alienação parental é extremamente maléfica aos filhos e aos pais alienados. Portanto, espera-se ansiosamente a aprovação do projeto de lei em questão. Se o assunto não fosse tão sério, não teríamos leis que demonstram a enorme preocupação da prática da alienação parental, reforçando a aplicação da guarda compartilhada como compulsória. Como disse o desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), Caetano Lagrastra, praticar alienação parental é o mesmo que praticar crime de tortura”.
Já a advogada especialista em Direito Civil e em Direito Processual Civil, psicóloga e membro do Centro de Estudos em Biodireito (Cebid) da Dom Helder Escola de Direito, Simone Murta C. do Nascimento, discorre sobre a atuação do Judiciário nesses casos de alienação parental no artigo Abuso moral contra a criança. Ela cita um processo do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que determinou o afastamento da criança do alienante, visto que “a convivência do pai com a filha era mais prejudicial que benéfica”.
“Observa-se que os juízes dispõem de opções que podem ser acionadas para proteger o bem-estar da criança, que vão desde aquelas de cunho financeiro até a limitação e mesmo suspensão do convívio. Qualquer que seja o motivo do término da relação afetiva entre os pais, desde o fim do amor, passando por traições e mesmo comportamentos violentos, certo é que a criança não pode ser usada para agredir ou manipular o outro”, conclui Simone do Nascimento.
Sugestão de pauta
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*Renato Campos Andrade é advogado, professor de Direito Civil e Processo Civil da Escola Superior Dom Helder Câmara, mestre em Direito Ambiental e Sustentabilidade, especialista em Direito Processual e em Direito do Consumidor.
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