Alinhados tanto a Hillary quanto Trump, candidatos concorrem em Estados que tradicionalmente recebem a comunidade brasileira, mas reclamam de 'falta de apoio' entre concidadãos.
A eleição americana, marcada para o dia 8 de novembro, deverá ter participação recorde tanto de eleitores como de candidatos brasileiros.
Na Flórida e em Massachusetts, ao menos quatro membros da comunidade concorrem a cargos públicos. Os dois Estados abrigam as maiores parcelas de imigrantes brasileiros nos EUA, estimados em pelo menos 1 milhão de pessoas.
Boa parte do grupo mora no país irregularmente e não vota, mas o número de brasileiros com cidadania americana tem crescido e faz com que alguns já sonhem até com a eleição de um representante brasileiro para o Congresso - apesar de queixas de alguns candidatos sobre a falta de apoio entre os concidadãos.
Conheça quatro membros da comunidade que estão se lançando na política americana:
Natural de São Gonçalo (RJ), Alves é advogada especializada em imigração e concorrerá ao posto de vereadora em Margate, cidade com 58 mil habitantes. Ela diz que ficou impressionada "com a falta de apoio da comunidade brasileira" na campanha.
"Recebi muita ligação de brasileiros perguntando se poderiam ser meus assessores, se eu poderia arrumar emprego para eles, mas doação quase não veio", diz a advogada, que mora nos EUA há 15 anos.
A advogada afirma, por outro lado, que sua candidatura tem sido muito bem recebida por imigrantes de outros países latino-americanos (ela fala espanhol fluentemente). "Sempre perguntam se sou cubana, isso me ajudou bastante."
Alves é a única candidata em Margate pertencente a uma minoria racial, embora negros e latinos sejam 46% da população da cidade. Se eleita, será a primeira latina a assumir o posto. Na Flórida, candidatos a vereador não concorrem por partidos.
Ela diz que sua principal proposta é modernizar a cidade. No futuro, pretende se lançar a deputada estadual, cargo que lhe permitiria tornar as leis da Flórida mais favoráveis a imigrantes.
Alves conta que em reunião recente com autoridades da Flórida perguntou por que a comunidade brasileira não recebia a mesma atenção destinada a outros grupos de imigrantes. "Eles respondiam: 'vocês não têm nenhum deputado, nenhum senador eleito'. E sempre citavam os haitianos, que estão aqui há menos tempo que a gente mas já têm vários representantes."
Segundo Alves, os haitianos são politicamente mais unidos que os brasileiros: quando um deles se candidata, até haitianos de cidades vizinhas o ajudam na campanha. "Os brasileiros ainda não entenderam a importância de ter um representante eleito, mesmo que seja um vereador."
Goiana de Inhumas, Shepard se elegeu no fim do ano passado como representante em Framingham, município que fica numa das áreas com maior presença de brasileiros em Massachusetts (nordeste dos EUA).
O município, de 68 mil habitantes, não tem prefeitura e é administrado por um conselho de 160 cidadãos, modelo de gestão que vigora em partes dos EUA.
Shepard também é tesoureira do comitê local do Partido Democrata e ajudou a organizar a primeira reunião entre imigrantes brasileiros para arrecadar fundos para a eleição presidencial. Ela diz que mais de 200 brasileiros participaram e que as doações a Hillary Clinton (a candidata democrata à Casa Branca) somaram U$S 4 mil (mais de R$ 12 mil).
Dona de uma empresa de limpeza, ela afirma que a comunidade brasileira terá uma participação recorde nesta eleição e que o grupo foi o "fiel da balança" na prévia que escolheu o candidato democrata à assembleia estadual.
Segundo ela, cerca de 200 brasileiros que nunca tinham votado nas prévias endossaram o candidato Jack Patrick Lewis, que derrotou o rival por 63 votos. Ele agora disputa a eleição para deputado estadual com uma representante do Partido Republicano e um candidato independente.
Na campanha, Lewis apoiou uma das principais demandas da comunidade brasileira: a aprovação de uma lei estadual que autorizaria a emissão de carteiras de motorista para imigrantes sem vistos.
Além de permitir dirigir, a habilitação tem a função de um RG: o portador pode usá-la, por exemplo, para embarcar em voos domésticos. Hoje, muitos brasileiros sem vistos não têm qualquer documento reconhecido nos EUA, o que limita suas vidas.
Shepard diz que a comunidade brasileira apta a votar nos EUA (incluindo filhos e netos de imigrantes já nascidos no país) é numerosa o suficiente para eleger um representante para o Congresso em Washington, mas que para isso "falta criar um lastro de história, porque você não elege candidatos para cargos majoritários sem uma estrutura local".
Ela conta que nos próximos anos pretende se candidatar a cargos eletivos mais altos ou apoiar outros candidatos brasileiros. Ao menos dois brasileiros já se candidataram a vereador em Massachusetts e uma brasileira disputou uma prévia para concorrer à eleição para a assembleia estadual, mas nenhum teve sucesso.
Há 31 anos nos EUA, Peixoto nasceu em Ipanema (MG) e é o único dos candidatos entrevistados a apoiar o republicano Donald Trump para a Casa Branca. "Ele não tem rabo preso com ninguém, não deve um centavo, não tem lobby nenhum atrás dele", afirma o brasileiro, que trabalha com construção civil e mora em Key Largo, ilha ao sul de Miami.
O brasileiro também é filiado ao Partido Republicano, mas concorrerá como independente a uma vaga no Congresso porque não participou da prévia que definiu o candidato republicano em seu distrito eleitoral. É a segunda vez que ele disputa o posto. Em 2012, perdeu ao ficar em quarto lugar, com 2.717 votos (1,1% do total). O vencedor, o democrata Joe Garcia, recebeu 136 mil votos (53,6%).
Peixoto diz que alguns brasileiros na Flórida o censuram por pedir votos para Trump (o empresário promete deportar todos os imigrantes sem vistos), mas que "em meia hora de conversa muitas pessoas mudam de opinião".
Segundo ele, a proposta de Hillary Clinton para regularizar imigrantes sem documentos vai "abranger muita gente que não deveria estar aqui", como criminosos e estrangeiros que não conseguem se sustentar sem o apoio do Estado.
Membro da maçonaria, ele diz que uma de suas principais propostas é limitar o mandato de congressistas a uma única reeleição (hoje não há limite ao número de mandatos).
Peixoto diz que Hillary é a "Dilma americana" e compara o Partido Democrata ao PT. "Os democratas têm esse negócio de querer dar bolsas para tudo, como o PT, mas nós já vimos que isso não deu certo no Brasil."
Nascida em Buenos Aires, Mariaca morou doze anos em São Paulo, terra do seu marido e onde nasceu um de seus dois filhos. Nos EUA há mais de 20 anos, fala português com sotaque paulistano e se considera "meio argentina, meio brasileira, meio americana".
Ela começou a se envolver com a política ao presidir uma associação de pais e professores em Doral, cidade com 56 mil habitantes. Na época, ficou impressionada com o acesso que cidadãos tinham às autoridades. "A gente que vem de países latino-americanos não está acostumada com a possibilidade de ir na prefeitura e falar para o prefeito o que você acha que está certo ou errado."
Gostou tanto da experiência que resolveu se candidatar. Como Renata, ela concorre sem partido, já que candidatos a vereador não concorrem por legendas na Flórida.
Formada em economia e especialista em marketing, ela diz que uma de suas preocupações é "trazer de volta a sensação de comunidade que tínhamos". Segundo ela, a população de Doral cresceu muito nos últimos anos com a chegada de imigrantes, muitos dos quais brasileiros.
Ao mesmo tempo em que corteja os moradores receosos dos novos vizinhos, ela tenta atrair os votos da crescente população latina. "Não sei se é porque tenho essa mistura cultural, mas tenho recebido um pouco de apoio de cada grupo."
Mariaca também tenta se equilibrar entre os eleitores favoráveis e contrários a Trump em Doral, sede de três campos de golfe e um resort do empresário.
Mariaca diz que muitos moradores ficaram decepcionados com Trump quando seus campos de golfe perderam a licença para sediar um campeonato que rendia muitas receitas para a cidade. "Falar em Trump por aqui é complicado, ele deixou um gosto meio amargo na população."
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