quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

A Terra queima, e não há muro que o impeça

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O ano de 2016 tem todas as credenciais para se tornar o ano mais quente da história.
16 dos 17 anos mais quentes foram registrados justamente no século XXI.
16 dos 17 anos mais quentes foram registrados justamente no século XXI. (Agência Brasil)
Por Marica Di Pierri*

Não há nada de realmente novo ou inesperado no alerta lançado nessa segunda-feira nas mesas da COP-22 pela OMM, a Organização Meteorológica Mundial. Em um comunicado divulgado durante o dia de abertura da segunda semana de trabalhos em Marrakech, a agência da ONU confirmou que 2016 tem todas as credenciais para se tornar o ano mais quente da história. Seria o terceiro recorde seguido depois dos primados registrados por 2014 e 2015.

Especificamente, o aumento é de 0,88°C a mais em comparação com o período de 1961-1990 e de nada menos do que 1,2 graus em comparação com a época pré-industrial. Um aumento que torna cada vez mais próximo o limite de +1,5°C, considerado por muitos como o limiar máximo que não deve ser superado para garantir a sobrevivência de grandes regiões do planeta.

A tendência exponencial das temperaturas globais também é confirmada por outro dado: 16 dos 17 anos mais quentes foram registrados justamente no século XXI. Também aumentam os eventos climáticos extremos, inundações e ondas anômalas de calor.

Em outubro, a OMM tinha divulgado outros dados referentes ao alcance do limiar de 400 ppm (partes por milhão) de CO2 na atmosfera. A novidade em relação ao passado é que tal quantidade não é registrada mais apenas em algumas zonas e em períodos particulares, mas em nível global e ao longo do ano inteiro e está destinada a não diminuir por diversas gerações.

O secretário-geral da OMM, Petteri Taalas, acrescentou que, em algumas regiões árticas da Rússia, registram-se temperaturas de 6-7 graus a mais do que a média, enquanto aumentaram em três graus as temperaturas de outras regiões setentrionais, incluindo o Alasca e o noroeste do Canadá. 

No dia 21 de julho de 2016, a Sociedade Meteorológica Wunder Ground tinha divulgado o dado recorde registrado em Mitribah, no Kuwait: uma temperatura de 54°C. Se essas tendências se confirmarem, o continente africano poderia literalmente queimar.

A desertificação ameaça um quarto das terras do planeta e um bilhão de pessoas alocadas em cerca de 110 países, mas é na África que se registra a situação mais dramática. A seca na Somália levou a +32% da população subnutrida e a 431 mil refugiados no Quênia, aos quais se unem os 300 refugiados interno. 

De acordo com o Banco Mundial, com um aumento das temperaturas médias globais entre +1,5°C e +2°C, entre 40% e 80% das terras agrícolas da África subsaariana não serão mais adequadas para os cultivos de milho, painço e sorgo já entre 2030 e 2040. Por causa dos rendimentos agrícolas mais baixos, estima-se um aumento entre 35 milhões e 122 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza.

Uma das consequências sociais mais dramáticas conectadas com os dados elencados acima diz respeito ao crescente fenômeno das migrações climáticas: em 2015, de 27,8 milhões de deslocados internos, 14,7 milhões foram determinados por eventos climáticos extremos. O relatório The Human Cost of Weather Related Disaster afirma que, nos últimos 20 anos, os desastres naturais foram determinados em 90% por eventos climáticos extremos. Entre os países mais atingidos, estão também a China, as Filipinas, a Indonésia e os Estados Unidos.

Além dos riscos internos, os Estados Unidos correm o risco de ter que enfrentar o aumento dos migrantes provenientes do México: de acordo com as estimativas, serão 900 mil as pessoas a mais a cada ano rumo à fronteira por causa do deserto que avança em 60% do território mexicano. 

A pergunta é obrigatória: Trump está realmente convencido de que pode enfrentar essas emergências investindo com uma mão na energia fóssil e, com a outra, construindo ao redor do país milhares de quilômetros de muro de contenção?

Il Manifesto, 15-11-2016.
* Jornalista italiana, ativista da associação A Sud e presidente do Centro de Documento sobre os Conflitos Ambientais (CDCA).

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