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Em nossa confusão, não percebemos que precisamos mesmo é de correr atrás do lucro.
Não podemos culpar os outros pelas nossas próprias decisões e suas consequências. (Reprodução)
Por Evaldo D´Assumpção*
Chegou dezembro, e com ele as atribulações do final de ano, as expectativas e projetos para o novo ano, o tempo (para alguns) de entrar dentro de si mesmos, revendo projetos, decisões, ações e seus resultados, no ano que termina. Curiosamente nos esquecemos de que o calendário é uma simples convenção cultural, havendo povos para quem o início e o fim de um novo ano é totalmente distinto do adotado pela civilização em que vivemos. Portanto, as predeterminações astrológicas, esotéricas e místicas não coincidem nos diferentes fatiamentos do planeta Terra. Submeter nossas preocupações a elas, é meramente uma questão de gosto, com pouco ou nenhum resultado prático. Portanto não as discuto. Voltemos então ao final de ano que nos diz respeito, este 2016 que foi tão agitado em todos os níveis, com terremotos e tsunamis políticos, financeiros, religiosos, médicos, policiais, etc. etc., e até mesmo sísmicos.
Numa pesquisa aleatória, haverá aqueles que o classificarão como trágico, outros como terrível, outros mais como absurdamente frustrante. Mas, sem dúvida também existirão os que o dirão bom, muito bom, e até mesmo excepcional. Como entender tal diversidade?
A vida é como um formidável caleidoscópio, pelo qual contemplamos as cores e as formas que continuamente se modificam, seus fragmentos coloridos trocando de lugar a cada movimento feito pelo observador. Diante de tanta variedade, ficamos questionando as forças que estão atuando para que surjam todas aquelas figuras. Alguns as chamam de destino; outros, fatalidade; outros, coincidência; outros mais de karma, sincronismo, determinação de forças superiores. Dizem que “fartura é sinal de penúria”: quando se tem muitas explicações, é porque nenhuma delas explica suficientemente. Pessoalmente, tenho a convicção de que tudo é consequência do livre arbítrio, exercido em ações cruzadas – afinal, cada pessoa tem o seu, e consequentemente interfere, com ele, no livre arbítrio do outro. Contudo, todas estas manifestações se processam conforme as aptidões, qualidades e habilidades de cada um, a que eu chamo de “dons”, recebidos do Criador, e que são aprimorados ou deformados ao longo da vida, em razão de esforço pessoal ou de ações construtivas ou destrutivas do meio em que vivemos.
Acredito que Deus criou o universo e estabeleceu leis para tudo, nas quais não interfere diretamente. Contudo, respeitando a dignidade de suas criaturas, pois feitas à sua imagem e semelhança (coisa tão difícil de ser assimilada pela nossa lógica e racionalidade...), deu-lhes o livre arbítrio para que possam tomar suas próprias decisões, assim como os meios para exercê-lo. Todavia, essa própria liberdade lhes impõe total responsabilidade por suas decisões e ações. Situação bastante complexa, que muitos rejeitam, pois lhes é demasiadamente pesado ter de admitir que coisas boas ou ruins se fazem por opção pessoal. Não podemos culpar os outros pelas nossas próprias decisões e suas consequências, e isso, quase sempre é muito desconfortável para aceitar.
À luz dessas considerações, voltemos ao ano que termina: afinal, foi bom ou ruim? Foi um período de muitas e grandes crises? Mas tudo na vida está estreitamente ligado a crises. Nosso próprio nascimento é consequência de uma crise: o espaço intrauterino, onde por nove meses vivemos despreocupadamente, de repente tornou-se pequeno, desconfortável para o tamanho que alcançamos. A solução para esta crise foi descobrir um jeito de sair dali, em busca de espaço mais amplo, onde poderíamos movimentar com liberdade, respirar livremente, crescer, desenvolver. A crise fetal, tornou-se a libertação do bebê, a abertura de oportunidades para vivermos uma história que no útero materno havia chegado ao seu limite.
Nos anos seguintes, as crises foram acontecendo, e a cada crise uma reação bem coordenada nos levou a dar passos à frente, mesmo que em algumas situações, um passo mal dado nos jogou para trás. E compreendemos tão mal tais ocasiões, que até para expressá-las invertemos os fatos. Quantas vezes ouvimos alguém afirmar que algo de mal lhe aconteceu e agora tinha de “correr atrás do prejuízo”? Em nossa confusão, não percebemos que precisamos mesmo é de “correr atrás do lucro”, jamais do prejuízo, do qual devemos sempre correr dele... Uma simples expressão que demonstra toda a nossa desorientação, nossa desconcentração do que devemos realmente fazer para superar as crises. Que quase sempre nos são úteis e benéficas, se soubermos lidar com elas. Afinal, o fim é sempre um começo, cabendo a nós torna-lo, usando bem o nosso livre arbítrio, um ótimo começo.
*Evaldo é médico e escritor
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