Adaptação coloca em cena tudo o que se espera de livro do gênero: frases de efeito, conselhos edificantes e algumas lágrimas.
Cena de 'O vendedor de sonhos' (Foto: Divulgação)
Com qual expectativa se deve aproximar de “O vendedor de sonhos”, filme de Jayme Monjardim, baseado em livro de Augusto Cury? Ninguém chega inocente até esse filme. Impossível viver no Brasil nos últimos anos e nunca ter ouvido falar do autor de autoajuda mais bem-sucedido do país.
A adaptação cinematográfica, cujo roteiro é assinado por L. G. Bayão (com colaboração do escritor), coloca em cena tudo o que se espera de um livro do gênero – frases de efeito, conselhos edificantes e algumas lágrimas.
O filme começa com Júlio César (Dan Stulbach), um renomado psicólogo a ponto de se jogar do 21º andar de um edifício. Outro psicólogo e a polícia já tentaram, mas ninguém conseguiu fazê-lo desistir da ideia. Até que um mendigo (o uruguaio César Troncoso) chega até Júlio, começa a conversar e termina oferecendo “uma vírgula” para ele iniciar uma nova fase em sua vida.
O psicólogo desiste da ideia do suicídio e junta-se ao novo amigo, morando literalmente debaixo da ponte. Lá, o mendigo é conhecido como Mestre, porque tem um conselho para todas as situações. Andando para cima e para baixo com o mendigo e seu amigo (Thiago Mendonça), a vida de Júlio César vai mudar. Como não se tornar outra pessoa ao ser embebedado com gotas de sabedoria toda vez que o Mestre abre a boca? Saem dela palavras dignas de comercial de cartão de crédito, que, no fundo, só querem dizer: “Dinheiro não traz felicidade”.
Mas não é apenas o protagonista que será tocado pelas palavras. De repente, o Mestre se torna um queridinho do mundo corporativo, entrando em centros empresariais e pregando sem qualquer problemas com seguranças e polícia. Aos poucos, ele se torna uma figura meio messiânica dentro desse universo, clamando por um capitalismo mais humanitário e um empreendedorismo mais humanista – seja lá o que isso for.
A suposta sabedoria toda do Mestre, no entanto, não veio de graça. Entrecortando o presente, a trama mostra o seu passado, como um empresário de sucesso, mas sem tempo para dar atenção à mulher e à filha pequena (Gysele Prattes e Geytsa Garcia).
Embora não seja situado em nenhum lugar específico, “O vendedor de sonhos” tem suas cenas externas filmadas em São Paulo, mais precisamente, na Vila Olímpia, região de prédios tão altos quanto as transações financeiras que acontecem nos escritórios que abrigam. O filme, assim como Cury, parece falar exatamente e exclusivamente para pessoas deste ambiente.
O longa é, enfim, uma fantasia sobre o mundo empresarial e sobre um Brasil irreal. Repleto de boas intenções, o longa de Monjardim – que no currículo tem “Olga” e uma adaptação cinematográfica de “O tempo e o vento”, além de várias telenovelas – não funciona nem como uma utopia exagerada com aspirações de um mundo melhor, pois o que o filme e o Mestre pregam é apenas um ajuste dentro do próprio sistema (palavra que ele mesmo usa), fazendo ecoar a famosa frase de “O leopardo”: “As coisas precisam mudar para que continuem as mesmas”.
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