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Há uma meta linguagem, uma nostalgia e a desilusão do fim das utopias dos anos de 1960.
Filme de Domingos Oliveira tem Sophie Charlotte, Caio Blat e Daniel Dantas. (Divulgação)
Por Alysson Oliveira
“BR 716” – uma referência ao prédio da Rua Barata Ribeiro, 716, em Copacabana – é um filme de Domingos Oliveira que parece sintetizar em si todos os elementos que compõem a obra do diretor, incluindo clássicos como “Todas as Mulheres do Mundo” e “Edu, Coração de Ouro”. Há uma meta linguagem – presente já primeira cena –, uma nostalgia e a desilusão do fim das utopias dos anos de 1960. Em Gramado, o longa recebeu os prêmios de Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Trilha Musical e Melhor Atriz Coadjuvante (Glauce Guima).
A história começa com um colorido vibrante, com uma cena de making of: um ator e uma atriz na praia, equipe técnica, diálogos que não se completam. É a forma de Domingos lembrar ao público que isso é uma encenação, a lembrança é um resíduo de algo que nos ficou mediado por algum filtro. O que segue depois é em preto e branco – com fotografia assinada por Luca Pougy e Felipe Roque –, uma lembrança de um passado incerto, mas mais libertário e feliz.
O apartamento “num bairro nobre”, conforme lembra o pai (Daniel Dantas), foi dado por ele mesmo, que chega para visitar Felipe (Caio Blat) cheio de questionamentos: “E o romance, já acabou? “Não é romance, pai, é um roteiro”. Depois, fala ao filho sobre a foto de quando o rapaz se formou em engenharia, e emenda estar preocupado porque ouviu dizer que o filho bebe muito e precisa arrumar um emprego.
Nada disso importa muito a Felipe – o que conta são seus amigos, seus amores. E nesse sentido, ele está bem servido. Seu melhor amigo (Alamo Facó) “roubou” a mulher dele (Maria Ribeiro), o que desencadeia uma longa discussão entre o trio. O filme é todo construído em cima de diálogos – algo comum na obra do cineasta –, e fala-se muito. Sobre política, sexo, arte. Sobre um período tão conturbado (o ano é 1963), quanto rico em sua estética.
Domingos se volta para as formas de cinema daquela época, assim, seu “BR 716” transita entre a Nouvelle Vague e o cinema de John Cassavetes. Há também uma artificialidade proposital em diálogos, ou quando as personagens se voltam para a câmera. O resultado é um tanto irregular – as artificialidades nem sempre funcionam – mas os bons momentos são mais constantes do que os ruins.
Um desses belos momentos é quando o protagonista vê Gilda (Sophie Charlotte) pela primeira vez, durante uma briga numa festa: “Um instante de beleza é uma alegria para sempre”, diz, enquanto ela dança ao som de “Perfidia”. A partir daí, ela se torna o foco da vida de Felipe e do filme. Ela, por sua vez, sonha em ser cantora e só ama quem pode ajudá-la na sua carreira, ainda que também coloque seu amor à disposição: “Se você quiser você pega, se você não quiser, você não pega”.
A política, como não podia deixar de ser, dada a época, está sempre presente – nem que de forma cifrada. Há cenas sobre ideais revolucionários e sobre o golpe militar de 1964. É a época do fim dos sonhos, da esperança, da utopia. É um filme sobre o último suspiro de uma liberdade que este país – e talvez o mundo – nunca mais viu.
Reuters
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