segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Nós, os cidadãos de bem!

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A hipocrisia ronda o termo 'cidadão de bem'.
Cidadãos de bem?
Cidadãos de bem? (Divulgação)
Por Felipe Magalhães*

Nós, os cidadãos de bem, achamos que somos melhores que todos e que merecemos tudo de melhor, porque somos cidadãos de bem. Mas não percebemos que temos privilégios e que a falácia da meritocracia só impede que rompamos com a desigualdade social.

Nós, os cidadãos de bem, somos a favor da vida, desde que sejamos apenas pró-nascimento, pois crianças em situação de vulnerabilidade social não merecem subsídios governamentais, pois se tornam vagabundos preguiçosos. E caso cometam algum delito, somos a favor da redução da maioridade penal, pois é melhor que desapareçam de nossas ruas.

Nós, os cidadãos de bem, somos favoráveis a políticas higienistas, pois não gostamos de pessoas em situações de rua que nos deixem desconfortáveis e inseguros, além de enfeiurar os lugares pelos quais passamos. Contudo, somos terminantemente contra toda e qualquer ação de resgate da dignidade da vida destas pessoas, pois estão na rua porque querem.

Nós, os cidadãos de bem, acreditamos piamente que bandido bom é bandido morto, que violência policial é necessária e que chacinas em presídios são uma bênção providencial, pois se estão presos é porque não são santos. Nós, porém, movemos mundos e fundos para livrar nossos filhos das consequências de seus erros cometidos, pois são apenas erros, ainda que pessoas tenham morrido porque nossa prole tenha dirigido embriagada, coisa normal para jovens.

Nós, os cidadãos de bem, somos contra a corrupção e contra essa chaga no país batemos panelas. Mas sonegamos impostos, subornamos agentes públicos e queremos tirar vantagem em tudo, pois por nossa bondade e honradez, merecemos o que há de melhor e mais fácil.

Nós, os cidadãos de bem, admiramo-nos com a prosperidade e com tudo o que remeta aos países do Norte, pois têm as melhore coisas, as melhores oportunidades e as melhores pessoas. Entretanto, bradamos com ódio contra toda política de afirmação nacional, pois são real ameaça do comunismo, coisa que nem sabemos o que é, mas que precisamos odiar, pelo nosso bem e pelo bem de nossos filhos.

Nós, os cidadãos de bem, somos cristãos, mas nos esquecemos que nem Jesus reconhecia a si mesmo como bom, pois sabe que só o Pai é verdadeiramente bom (cf. Mc 10,18).

Que triste, um país que tenha tantos cidadãos de bem!

*Felipe Magalhães Francisco é mestre em Teologia, pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia. Coordena a Comissão Arquidiocesana de Publicações, da Arquidiocese de Belo Horizonte. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). Escreve às segundas-feiras. E-mail para contato: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.

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