quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Padres casados: avaliando os prós e contras

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Padre anglicano convertido ao catolicismo partilha sua experiência como presbítero casado.
Celibato para padres é uma disciplina da Igreja, não uma doutrina.
Celibato para padres é uma disciplina da Igreja, não uma doutrina. (Divulgação)
Por Dwight Longenecker*

Há uma abundância de argumentos históricos e teológicos a favor e contra padres casados, mas poucos param para considerar os prós e contras práticos. O catolicismo, no entanto, já tem padres casados, e aqui um deles compartilha esta experiência.

A Igreja Católica deveria ter padres casados? Muitas pessoas ficam surpresas ao descobrir que a Igreja já tem padres assim, e eu sou um deles.

No começo da década de 1980, o Papa São João Paulo II estabeleceu a Provisão Pastoral, que permitiu que homens casados ordenados nas igrejas anglicana e luterana (e que fossem subsequentemente recebidos em plena comunhão na Igreja Católica) recebessem uma dispensa dos votos de celibato autorizando-os a serem ordenados ao sacerdócio católico.

A dispensa do voto de celibato é permitida porque o celibato para padres é uma disciplina da Igreja, não uma doutrina. Doutrinas não podem ser alteradas. Disciplinas podem.

Eu recebi minha dispensa do Papa Bento XVI e, com a presença de minha esposa Alison e nossos quatros filhos, fui ordenado em 2006. Servi como capelão de uma escola de ensino médio e padre assistente em uma paróquia. Em seguida me pediram para administrar uma pequena paróquia.

Depois de dez anos atuando como padre católico casado, posso falar dos prós e contras.

Existem motivos históricos e teológicos que retêm a disciplina do celibato aos sacerdotes, e existem motivos históricos e teológicos para mudar essa disciplina. Este artigo não trata desse debate. É apenas um relato sobre os aspectos práticos da coisa.

O que Alison e eu aprendemos é que para cada motivo prático a favor dos padres casados existe um motivo balanceador contrário para “não” se tê-los na Igreja.

A primeira preocupação é a administração do tempo. “Como um homem casado pode também ser padre?”, as pessoas se perguntam. “Nossos padres estão disponíveis 24 horas por dia, nos sete dias da semana, para servir a Deus e a sua Igreja”.

Na verdade, não. Os padres tiram férias e têm dias de folga. Ainda que estejam disponíveis para emergências, a maioria deles trabalha relativamente sete horas diárias.

O meu trabalho como padre não é mais exigente em termos de administração do tempo do que o de muitos outros que trabalham horas irregulares. Médicos, enfermeiros, bombeiros, policiais, caminhoneiros, militares e muitos mais estão mais distantes de casa e da família, com horários mais difíceis do que os meus. Padres que trabalham duro são ocupados, mas não mais do que os demais profissionais em funções exigentes.

Há outros problemas que envolvem não só a administração do tempo, mas um compromisso.

São Paulo dizia que os homens deveriam permanecer solteiros como ele porque um celibatário pode se dedicar a agradar a Deus somente, mas um homem casado precisa agradar sua esposa. Então, o que dizer sobre os estresses no casamento por causa do compromisso do padre em servir a Deus? E a esposa não se sente como estando em segundo plano?

Lembro de ouvir a esposa de um sacerdote anglicano se queixar de que o seu marido ama a Deus mais do que a ela.

“Eu poderia competir com uma outra mulher”, chorava, “mas não posso competir com o Deus Todo-Poderoso!”.

Exige-se uma mulher forte, de mentalidade independente, para ser esposa de um padre.

Além disso, as relações pastorais próximas que se desenvolvem entre um padre e o seu povo podem levar ao ciúme, a relações extraconjugais e ao divórcio. Aqueles e aquelas que defendem a existência de padres casados deveriam estar melhor preparados para receberem esposas infelizes, aceitar casamentos rompidos e prover sustento a padres e esposas quando o matrimônio termina em divórcio.

Devem também considerar como manter as viúvas e filhos dependentes. A infraestrutura diocesana típica não possui um modo de lidar com tais necessidades.

Embora estas dificuldades sejam reais, é também verdade que a esposa de um padre é o seu maior sustento e auxílio. Quando o casamento é forte e a fé os vincula, o padre casado e sua esposa e família fornecem um exemplo brilhante do matrimônio cristão. A esposa do padre está ao seu lado como uma caixa de ressonância, crítica e auxiliar.

Muitas vezes, quando chego em casa depois de um longo dia, agradeço a Deus pela bênção de uma esposa como uma amiga e companheira, e faço uma oração pelos meus padres companheiros que aceitaram a disciplina do celibato e retornam a uma casa vazia. Estes têm feito um grande sacrifício e eu mantenho um enorme respeito por eles.

Muitos fiéis, quando ouvem que sou casado, dizem: “É uma questão de tempo. Acho que todos os padres deveriam ser casados”. É aqui onde lhes lembro que um homem casado com uma família vai exigir não só uma casa grande, mas pagar escola, atendimentos odontológicos, faculdade e outras despesas.

“Quer padres casados? Está disposto a contribuir com 50 reais a mais por semana para ajudar a apoiá-lo?”

É incrível como de repente o entusiasmo por padres casados se evapora rapidamente!

A questão financeira é uma inquietação real para a maioria dos padres casados. Roma estipula que antes que um homem casado seja aceito para a ordenação, a ele seja garantida uma renda adequada para sustentar a família. O meu primeiro posto foi como capelão escolar. A escola provia-me com um salário de professor.

Agora que estou na paróquia, não pego mais do que aquilo que as diretrizes diocesanas autorizam aos párocos.

O dinheiro pode ser curto. No entanto, vendo o lado positivo, assim que os filhos crescem, a esposa do padre pode conseguir um trabalho para contribuir na renda da família, e embora o salário do padre talvez não seja muito alto, a maioria dos padres em países desenvolvidos contam com moradia, serviços públicos, seguro saúde, benefícios trabalhistas e aposentadoria.

O salário é baixo? Sim, mas posso me lembrar de vários homens casados e suas famílias que estariam felizes em trabalhar por um salário mais baixo se tivessem moradia, estabilidade no emprego, uma função gratificante e demais benefícios que grande parte das dioceses fornecem.

E quanto aos filhos? Muitas pessoas parecem esquecer que um padre e sua esposa irão ser fiéis à doutrina da Igreja. Isso significa que não usarão métodos contraceptivos artificiais. Se eles forem jovens e férteis, estará a paróquia pronta para aceitar a responsabilidade de alimentar e abrigar uma dúzia de crianças do casal?

Várias paróquias achariam difícil esta situação, e uma família numerosa colocaria uma pressão maior sobre o pai, a esposa e a paróquia.

Por outro lado, que oportunidade fantástica para uma paróquia lembrar os ensinamentos da Igreja e testemunhar a bênção das crianças! Um padre jovem com uma família grande seria uma fonte de vida e energia para a paróquia, e a comunidade inteira iria aprender a viver pela fé e dar de modo mais generoso para apoiar o dom das crianças e da vida.

Uma casa repleta de filhos assim poderia ser uma fonte de bênção abundante. Talvez mais casais veriam o exemplo e estariam abertos a famílias numerosas. As escolas da paróquia ficariam cheias novamente, e haveria mais vocações ao sacerdócio e à vida religiosa.

Tenho ciência de que as minhas experiências são aquelas de um padre que vive num país desenvolvido. A situação pode ser bem diversa em outras partes do mundo. Não pretendo que as nossas experiências deem a última palavra sobre o assunto.

Devemos ter padres casados? Para cada “pró” existe um “contra”, e quando pesamos os motivos históricos e teológicos para a disciplina do celibato, penso que é melhor manter o status quo.

Ao dizer isso, vejo uma outra opção. Em lugar de permitir que todos os padres se casem, o Vaticano poderia delegar às conferências episcopais a autoridade de considerar a ordenação de alguns homens casados mais velhos.

Já que a maioria de nós está vivendo mais, já que estamos vivendo vidas ativas, há muitos homens casados financeiramente seguros e cujos filhos estão crescidos que bem poderiam servir a Igreja como padres maduros.

Mas é apenas a minha opinião. A decisão em si está acima do meu nível salarial.


Crux/ IHU - Tradução: Isaque Gomes Correa

*Dwight Longenecker é escritor e padre católico convertido do Anglicanismo, pároco na Igreja Nossa Senhora do Rosário, na Carolina do Sul, Estados Unidos.

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