segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Vida de cão, Dostoievski e demais sortidos

 domtotal.com
Se o leitor mergulhar melhor em Dostoiévski verá que naquele tenebroso amargor de uma Moscou antiga há muito amor.
Quis deixar um registro de como uma vidinha de 11 anos pode ser voltada apenas para o amor.
Quis deixar um registro de como uma vidinha de 11 anos pode ser voltada apenas para o amor. (Divulgação)
Por Ricardo Soares*

Perdi um animal de estimação que era muito mais que um animal de estimação. Um boxer de 11 anos chamado Lorde. Tornou-se trivial nos tempos modernos os homens e mulheres se despedirem em público dos seus cães e gatos em redes sociais. Que bom se isso dá a ilusão de aliviar a dor da perda. A minha eu não sei. Dói do mesmo jeito mas quis fazer também a despedida pública não só na tentativa de repartir minha dor com os outros mas para “destilar” algo bom nessas redes onde acabamos por compartilhar tantas agruras. Quis deixar um registro de como uma vidinha de 11 anos pode ser voltada apenas para o amor. Em estado sólido.

Era de se esperar – confesso que nunca imaginei que com tanta ênfase e carinho – que houvesse uma reação solidária dos amigos, virtuais ou não. Foi muito mais do que eu esperava e resolvi, mesmo que isso me custe muito tempo, responder a cada um que me deixou uma palavra de carinho. É a prova, desculpe o óbvio, de que nem tudo está perdido quando as pessoas se sensibilizam e entendem muito bem o que representa a perda de um verdadeiro animal de estimação. Queria também ler um dia um estudo sério a respeito do assunto que desse conta do tanto que aumentou em nosso país o número de “pet shops” e mesmo a população dos animais de estimação nas grandes metrópoles. Carência, sinal de esperança para a humanidade na medida em que eles, os nossos bichinhos, só nos despertam os melhores sentimentos? Sigo triste mas confortado por conta dessa onda enorme de carinho e queria aqui, se me derem licença, usar esse espaço para agradecer, também de público, a todos que se importaram com a minha dor. Que o destino lhes dê na vida a chance de terem ou conviverem, por pouco que seja, com um animalzinho da categoria do meu Lorde.

DOSTOIÉVSKI

No mesmo sofá de onde Lorde assistia a esse que vos escreve redigir as suas mal traçadas linhas está um volume antigo de “Os Irmãos Karamázovi” e outro de “Crime e Castigo” do venerado Dostoiévski. Ao contrário do que eu disse acima (esperança para a humanidade) o mestre russo aparentemente acreditava que éramos um caso perdido diante de tanta vileza e iniqüidade. Mas isso só numa leitura superficial. Se o leitor mergulhar melhor em Dostoiévski verá que naquele tenebroso amargor de uma Moscou antiga há muito amor. Ou seja, existe e existiu sempre amor em Moscou, apesar do hoje mal fadado Putin. Até Dostoiévski acreditava que os homens podem ser melhores do que de fato aparentam.

Rodrigo Maia

Quando você acorda e se dá conta que seu cão partiu parece que o mundo ficará mais difícil quando seres bons partem e no planeta habitam e desgovernam um Putin, um Trump ou (mais perto) um tipo execrável como esse Rodrigo Maia, a prova viva de que uma linhagem genética pode se deteriorar pois esse “jovem” consegue ser pior que seu pai, o lamentável César Maia. Rodrigo Maia é a prova viva da sapiência do velho Nelson Rodrigues que pedia aos jovens para envelhecerem, reforçando a tese que a juventude não é, por si só, uma qualidade. Eu desejo que Rodrigo envelheça melhor e menos obtuso e oportunista do que é e não se transforme num patético Roberto Freire, o arremedo do que há de pior em política como comprovou mais uma vez no episódio onde desancou Raduan Nassar na cerimônia de entrega do prêmio Camões. Há solução para esse tipo de gente? Tocado pois pela perda do meu animal de estimação posso apenas desejar não o mal a tipos como esses mas que cães como o Lorde cruzem o caminho deles pois, com certeza, se tornarão um pouco melhor do que aquilo que são. A mais completa tradução de seres humanos desprezíveis.

*Ricardo Soares é escritor, diretor de tv, roteirista e jornalista. Publicou 7 livros e dirigiu 12 documentários.

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