terça-feira, 25 de abril de 2017

Vaidade das vaidades

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Tanto o Eclesiastes, quanto o próprio Jesus, ensinam-nos que o tempo escapa de nossas mãos, juntamente com muitos acontecimentos.
Os poetas da alma assim se expressam em nosso tempo, cantando experiências de ontem e de hoje.
Os poetas da alma assim se expressam em nosso tempo, cantando experiências de ontem e de hoje.
Por Tânia da Silva Mayer*

O Eclesiastes já alertava para a fugacidade do tempo e da vida: “vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. O que a sabedoria antiga quer ensinar é que todas as coisas são efêmeras, que elas passam por nós e que também nós passamos por elas. Todas as pessoas são confrontadas cotidianamente por essa dinâmica da vida. Por isso, ainda hoje é importante alertar:

Para tudo há um momento, e tempo para cada coisa sob o céu: tempo de dar à luz e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo de solapar e tempo de construir; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de lamentar e tempo de dançar; tempo de atirar pedras e tempo de juntar pedras; tempo de abraçar e tempo de evitar o abraço; tempo de procurar e tempo de perder; tempo de guardar e tempo de jogar fora; tempo de rasgar e tempo de costurar; tempo de calar e tempo de falar; tempo de amar e tempo de odiar; tempo de guerra e tempo de paz. [...] Sei que não há nada melhor para o homem que alegrar-se e fazer o que é bom na vida. (Ecl 3,1-8.12)
Em tempos de virtualidades, nos quais a internet tomou conta da nossa vida, tudo é mais fortemente passageiro, e uma postagem nas redes sociais, passados cinco minutos, já é parte de um passado distante. Isso acontecerá com esse texto, daqui a pouco ele passará, com ele as suas palavras e ideias, tornar-se-á passado, porque um é o tempo da leitura e outro é tempo do esquecimento, facilitado pela interação com outras ofertas da internet. Por outro lado, a virtualidade proporciona uma sensação de perenidade para tudo. As redes sociais nos recordam postagens antigas, e quem não curtiu uma foto no momento de sua publicação, por exemplo, poderá fazê-lo mais tarde, noutra oportunidade. É nesse paradoxo existente entre passado e presente que suportamos na realidade e na virtualidade a dinamicidade do tempo, um devorador de filhos e filhas.

Tudo passa, inclusive a vida. A Páscoa de Jesus é um exemplo disso. “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim”. Jesus viveu entre os seus, ensinou-lhes o que é necessário para pertencer ao Reino, anunciou-lhes palavras de sabedoria para a vida, sobretudo ao refletir que, lançados ao tempo, nem tudo cabe a nós e aos nossos cuidados. Há um tempo em que a semente repousa no ventre da terra, nesse momento, o semeador nada pode fazer com relação a ela, só resta-lhe guardar a esperança de que ela se realize em planta. A vida de Jesus é transitória, é isso que vislumbramos na sua cruz-ressureição. Tudo passa. Mas o cristianismo, se é mesmo a religião dos que seguem a Jesus, o Cristo, manterá viva a ideia de perenidade, não como contraposição ao transitório, pois até para Jesus “chegou a hora de passar desse mundo para o Pai”, mas como singular expressão da eternidade que irrompe o tempo, na sua fugacidade. Perene é o amor de Deus que não passa, do qual nada e ninguém nos podem separar, e que nos abraça naqueles momentos e acontecimentos em que nos encontramos mais precisados desse amor.

Tanto o Eclesiastes, quanto o próprio Jesus, ensinam-nos que o tempo escapa de nossas mãos, juntamente com muitos acontecimentos. Tudo isso pode parecer dramático, mas também confortador, pois sabemos que o tempo presente é decisivo para vivermos bem, de maneira digna, de modo a aproveitar os momentos e acontecimentos mais essenciais para a existência. Os poetas da alma assim se expressam em nosso tempo, cantando experiências de ontem e de hoje:

Porque quando menos se espera a vida já ficou pra trás. Segura teu filho no colo, sorria e abrace teus pais enquanto estão aqui. Que a vida é trem-bala, parceiro, e a gente é só passageiro prestes a partir. (Trem-bala, Ana Vilela)
Sob o tempo que nos consome, importa é viver com qualidade, tecendo redes que ligam nossos corações aos de outras pessoas, construindo pontes que nos fazem ir além de nós mesmos; o resto é vaidade das vaidades.

*Tânia da Silva Mayer é mestra e bacharela em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – FAJE; Graduanda em Letras pela UFMG. É editora de textos da Comissão Arquidiocesana de Publicações, da Arquidiocese de Belo Horizonte. Escreve às terças-feiras. E-mail: taniamayer.palavra@gmail.com

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