quinta-feira, 19 de abril de 2018

Haverá futuro para o Brasil e a humanidade sem os povos indígenas?

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O complexo financeiro-empresarial-midiático que governa o Brasil é despudoradamente anti-indígena.
Documento registra o assassinato de 118 indígenas em 2016 e 106 suicídios; 735 crianças menores de 5 anos morreram por causas diversas, entre elas por desnutrição.
Documento registra o assassinato de 118 indígenas em 2016 e 106 suicídios; 735 crianças menores de 5 anos morreram por causas diversas, entre elas por desnutrição. (Rodolfo Oliveira/ Ag. Pará)
Por Élio Gasda*

A conjuntura é de retirada de direitos. A Caixa de Pandora aberta em abril de 2016 afetou os mais pobres e vulneráveis, dentre eles os indígenas. As ameaças contra a vida desses povos são reais. A ofensiva conservadora-neoliberal contra seus territórios, culturas e riquezas é cada vez mais feroz. O complexo financeiro-empresarial-midiático que governa o Brasil é despudoradamente anti-indígena. Almejam um Brasil sem índios: paralisação de demarcação das terras, supressão dos direitos territoriais, desmantelamento das políticas de saúde, sucateamento da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), criminalização de lideranças, pistolagem, privatização do Aquífero Guarani, expansão desenfreada do agronegócio, das mineradoras e madeireiras.

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou nesta semana (16), dados de assassinatos de conflitos no campo. O ano de 2017 registrou 70 assassinatos, maior número desde 2003. Na semana passada (12), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) entregou ao Papa Francisco o ‘Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil’. O documento registra o assassinato de 118 indígenas em 2016 e 106 suicídios; 735 crianças menores de 5 anos morreram por causas diversas, entre elas por desnutrição.

Os povos indígenas querem que se cumpra o Capítulo VIII - Dos índios - Artigos 231 e 232 - da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses”.

Passados trinta anos, pouco se avançou na tarefa legislativa de ampliar a proteção e o respeito aos povos indígenas. Enquanto isso, as forças conservadoras aumentam a onda de proposições que visam alterar a Constituição e assim eliminar esses direitos. As Nações Unidas desempenham um papel importante nesta questão. A Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas (2007) reconhece a necessidade de respeitar e promover os direitos intrínsecos dos povos indígenas, que derivam de suas estruturas políticas, econômicas e sociais e de suas culturas, de suas tradições espirituais, de sua história e de sua concepção da vida, especialmente os direitos às suas terras, territórios e recursos. Os indivíduos indígenas têm direito, sem discriminação, a todos os direitos humanos reconhecidos no direito internacional.

Todo cristão é chamado a ser solidário com as lutas e as angústias dos povos indígenas. É o que pede Papa Francisco: “Temos que prestar atenção especial às comunidades aborígenes com as suas tradições culturais. Não são apenas uma minoria entre outras, mas devem tornar-se os principais interlocutores, especialmente quando se avança com grandes projetos que afetam seus espaços. Para eles, a terra não é um bem econômico, mas dom gratuito de Deus e dos antepassados que nela descansam um espaço sagrado com o qual interagem para manter a sua identidade e seus valores. Eles, quando permanecem nos seus territórios, são quem melhor os cuida” (Laudato si, 146).

Sua ecologia é integral. Um dos grandes ensinamentos dos povos indígenas é o da convivência com a Mãe Terra. Sumak Kawsay, de origem aymara/quéchua significa Bem Viver, em harmonia entre cosmo, natureza e humanidade. “Para alguns, vocês são considerados um obstáculo ou um estorvo. Na verdade, vocês com suas vidas são um grito à consciência de um estilo de vida que não consegue dimensionar seus próprios custos” (Papa Francisco. Encontro com povos indígenas - Puerto Maldonado, 01/2018).

A cultura do Bem Viver faz parte do amplo contexto de preservação da vida no planeta. A Terra é mais do que simplesmente o lugar onde se habita. Ela é sagrada, geradora de vida. O Bem Viver pode mudar nossa maneira de pensar, de interagir com a natureza e nossas relações humanas. É protesto contra o capitalismo que impõe o “viver melhor” através do consumo, do desperdício e da ostentação.

 A batalha indígena é a batalha de todos nós. Sem eles a natureza morre. Sem eles, parte de nós desaparece. “Sua presença recorda que não podemos dispor dos bens comuns ao ritmo da ganância e do consumo... O reconhecimento destes povos – que nunca podem ser considerados uma minoria, mas autênticos interlocutores – assim como de todos os povos originários nos recorda que não somos possuidores absolutos da criação” (Papa Francisco, Encontro com povos indígenas - Puerto Maldonado,  01/2018).

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