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No xadrez tático que tentou responder à ordem de prisão 'express' do juiz, ex-presidente produz 24 horas de mobilização em São Bernardo enquanto negocia os termos de sua rendição.
Lula não se apresentou à Polícia Federal em Curitiba na sexta-feira
como sugeriu o juiz Sérgio Moro. (AFP).
Uma hora depois de vencido o prazo dado pelo juiz Sérgio Moro para que se entregasse à Polícia Federal, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi até a janela do segundo andar do prédio do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo. Era ali que ele estava recluso havia quase 24 horas sob holofotes nacionais e internacionais. Acenou para a multidão que estava na porta, mas preferiu não discursar. “Eu vou ficar. Não sei até quando”, afirmou.
Aquela altura já era claro que o petista havia ignorado a "oportunidade" oferecida por Moro, em um pedido de prisão express. Nem havia viajado a Curitiba, como o juiz da Operação Lava Jato sugerira, nem se entregaria à PF em São Paulo imediatamente. Se fosse se entregar, seria em seus termos. Ganhara tempo na batalha tática produzindo imagens de apoio da militância enquanto sua defesa disparava novos - e incertos - cartuchos legais para tentar livrá-lo da cadeia. Pouco antes das 17h, o prazo final, os apoiadores que se aglomeravam na porta do prédio fizeram contagem regressiva. Ultrapassado o marco, passaram a gritar: “Não tem arrego”.
Apesar do entusiasmo, do lado de fora, no entanto, ninguém sabia de fato o que aconteceria. O dia havia sido de oscilações e muita informação desencontrada. Até o final do prazo ainda não estava certo se ele se entregaria ou não. Foi aconselhado por advogados e políticos, que desde a véspera diziam que ele não deveria se entregar para uma prisão que consideram ilegal. Pela manhã, disse ao jornalista Ricardo Kotscho que não se entregaria. Só o ex-metalúrgico parecia saber qual seria seu destino .
O final do dia da prisão de Lula (que não foi) seria definido por um pequeno grupo reunido dentro do sindicato: Lula, seu advogado, Cristiano Zanin, e as principais lideranças do PT. Era o núcleo que discutia novas formas de ganhar tempo e de onde emanavam as informações de que ele estaria negociando com a Polícia Federal formas e prazos de se apresentar para começar a cumprir a pena de 12 anos de um mês de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. A negociação acabou mudando o tom dos discursos do lado de fora. Se na quinta-feira a mensagem principal era de que era preciso resistir, agora, nos microfones, diziam que Lula, ao não se entregar, não estaria fazendo nada de ilegal. "Quero deixar claro que não há por parte do presidente Lula nenhum descumprimento do mandado de prisão emitida pelo juiz Sergio Moro. Ele tinha a opção dada pelo juiz de ir até Curitiba, não exerceu essa opção", disse a presidenta do PT, Gleisi Hoffman. Foi Gleisi também que anunciou que o petista ficaria no sindicato e que, lá mesmo, participaria de uma missa em memória de Marisa Letícia neste sábado, às 9h30. A ex-primeira-dama, morta em 2016, faria 68 anos neste 7 de abril.
Momentos depois, a Polícia Federal faria chegar aos jornalistas que não cumpriria a ordem de prisão ainda nesta sexta. Queria, ao que parece, dissipar a tensão. "O mais importante nesse momento é preservar o preso e os policiais. Quanto menos trauma na execução da prisão, melhor para todos", avaliava, em Curitiba, o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Luiz Antonio Boudens. Ele fez questão de destacar que, caso Lula não se entregasse, seria preciso agir "com tranquilidade". Boudens esclarecia ainda que, mesmo sem se apresentar à PF no prazo determinado por Moro, o petista não deveria ser considerado foragido da Justiça, uma vez que seu paradeiro é conhecido.
"Prudência"
A pequena massa do lado de fora passou boa parte do dia na esperança de que Lula falasse. Pela manhã, a doméstica Nivalda Nogueira dos Santos, 43 anos, tentava entrar no andar em que o ex-presidente estava. Tinha saído de Iuiu, na Bahia porque queria ver pessoalmente se o que acontecia com Lula era verdade. “Na minha família, todo mundo é petista. Se eu não viesse, ia ter um treco”, dizia ela. “O povo do Nordeste ama Lula. Nossa vida só melhorou por causa dele. Nem água a gente tinha e agora tem”, emociona-se. Mas, assim como na véspera, Lula não falou com a militância que esperava para vê-lo. “Não acho que seja prudente”, afirmou, ao ser questionado pelo EL PAÍS.
O final do dia anticlímax jogou para esse sábado toda a expectativa sobre um desfecho. Como Lula vai se entregar? Vai conseguir ganhar mais tempo? A forma pode ser determinante para dizer que se, mesmo detido, Lula terá angariado pontos políticos com sua estratégia de transformar seu berço político em São Bernardo em um bunker.
El País
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