terça-feira, 19 de junho de 2018

Basta de 'olho por olho'

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Jesus rejeitava a ideia de que as pessoas devessem pagar o mal com o mal.
O que Jesus orienta é o rompimento com uma cadeia de violência que igualam bons e maus, pois ambos pagam na mesma moeda.
O que Jesus orienta é o rompimento com uma cadeia de violência que igualam bons e maus, pois ambos pagam na mesma moeda. (Reprodução/ Pixabay)
Por Tânia da Silva Mayer*

Ao longo de nossas vidas temos a grata surpresa de estar entre pessoas amigas que nos querem bem. De fato, entre essas pessoas nos sentimos queridos e isso nos dá certa segurança, pois o sentimento de proteção é recíproco. Sabemos que nossa vida e existência estão asseguradas, pois os que nos amam não haveriam de nos enganar e agir contra nós. Graças a Deus que esses ambientes existem e nos recordam que viver humanamente é possível. No entanto, não vivemos apenas com aquelas pessoas que nos respeitam e que nos amam. Cotidianamente, convivemos também com quem trama contra nós maldades com o intuito de nos ver sofrer e de nos prejudicar nas várias situações da vida. Se não podemos dizer se tratar de uma reação intrinsecamente humana, também não podemos negar que o mal-estar dessas relações provoca também em nós o sentimento de confronto e embate com nossos inimigos. Entramos na mesma lógica da maldade e começamos a cogitar uma realidade na qual esses perversos não existiriam.

No fundo, aplicamos por nossa própria conta a Lei do Talião que estabelece uma vingança na mesma medida do mal provocado contra nós. Nós a evocamos toda vez que nos sentimos ou nos sabemos injustiçados: “olho por olho, dente por dente”. Essa lei vigorou no oriente antigo com a finalidade de balizar as relações dos povos. Uma vez que a vingança se realizava indiscriminadamente, a violência era uma realidade cruel para as populações. Com a introdução da lei, a vingança assumiu uma lógica de medida, pois só posso fazer contra o outro algo proporcional ao que ele fez comigo. Hoje em dia, a Lei do Talião parece não mais vigorar no interior cultural de nossas sociedades. As ações e reações são desproporcionais, de modo que algumas pessoas se sentem autorizadas a matar uma pessoa pelo fato de ela ter buzinado contra elas no trânsito, ou por cobrá-las uma dívida no valor de um real, entre outros absurdos.

Jesus também questionou a violência humana regida por essa Lei. Ele rejeitava a ideia de que as pessoas devessem pagar o mal com o mal. Se por um lado o Talião estabelecia critérios para vingar, por outro lado não impedia e até incentivava a violência nas relações. A lógica do Reino é outra e é a ela que as pessoas que seguem Jesus devem seguir. Por isso, o Mestre de nossas vidas ensina: “Não enfrenteis quem é malvado! Pelo contrário, se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o manto! Se alguém te forçar a andar um quilômetro, caminha dois com ele! Dá a quem te pedir e não vires as costas a quem te pede emprestado” (Mt 5,39-42). O que Jesus orienta é o rompimento com uma cadeia de violência que igualam bons e maus, pois ambos pagam na mesma moeda.

É certo que o Reino inaugurado na práxis profético-misericordiosa de Jesus fomenta relações que se fundamentem num amor capaz de amar até as últimas consequência, inclusive aqueles que não nos querem bem e que nos fazem mal. Nesse sentido, a Palavra de Jesus continua nos provocando em nossos dias encharcados de violência, porque vividos na companhia de muitas pessoas que desejam e promovem maldades em vários níveis contra nós e nossas vidas. A fé cristã que professamos segue interpelada a testemunhar a paz, a justiça, o bem e o amor entre todas as pessoas e em todas as relações, sobretudo as vividas junto aos inimigos. No entanto, o testemunho da fraternidade não pode encobertar as injustiças, essas que devem ser combatidas para que outras vidas não sejam também ceifadas.

*Tânia da Silva Mayer é mestra e bacharela em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE); graduanda em Letras pela UFMG. Escreve às terças-feiras. E-mail: taniamayer.palavra@gmail.com.

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