segunda-feira, 30 de julho de 2018

Vida, um presente incomum

domtotal.com
Viver com coragem é viver para além do medo; não permitindo que ele nos paralise.
A vida, em geral, é uma coisa incrível: ainda que a ciência nos ajude a compreender seus muito mecanismos, nada nos tira o espanto diante desse misterioso acontecimento.
A vida, em geral, é uma coisa incrível: ainda que a ciência nos ajude a compreender seus muito mecanismos, nada nos tira o espanto diante desse misterioso acontecimento. (Reprodução/ Pixabay)
Por Felipe Magalhães Francisco*

Provavelmente, todos já ouvimos, ou até mesmo dissemos, que a vida é um presente. Foi-nos dado sem que tivéssemos podido escolher aceitá-lo. Um presente bastante incomum, poderíamos dizer. No começo, cercam-nos de cuidado; buscam, de muitas formas, fazer com que esse presente prospere. Chega um momento em que já não podemos terceirizar: é com a gente mesmo; tempo de assumir esse presente por nossa conta e risco. E é aí que esse presente pode ser, por muitos, considerado um fardo.

A vida, em geral, é uma coisa incrível: ainda que a ciência nos ajude a compreender seus muito mecanismos, nada nos tira o espanto diante desse misterioso acontecimento. O eclodir de um ovo; o germinar da semente; o desabrochar de uma flor; o primeiro respiro de um bebê: são mistérios que têm a força de nos desorbitar, quando olhados com um pouco de sensibilidade.

Mas a vida é algo que nos exige muito. Muitos não dão conta. E não podemos – não seria justo e honesto – condenar tais pessoas por não conseguirem. Viver é muito perigoso e um descuido prosseguido, ensinara-nos o sábio Riobaldo. Todo estamos diante de um grande risco, quando vivendo. Mas é um risco deliciosamente atraente: quantas boas experiências podemos colher, ao longo do caminho, que enchem nosso coração de satisfação e de contentamento? “A vida rui? A vida rola, mas não cai. A vida é boa” (Adélia Prado).

Saber-nos responsáveis por nossa própria vida pode ser desesperador. Mas o que a vida quer da gente é coragem, torna a nos ensinar Riobaldo, o sábio deste Grande Sertão. "O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! A vida inventa! A gente principia as coisas, no não saber por que, e desde aí perde o poder de continuação porque a vida é mutirão de todos, por todos remexida e temperada. O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando.

Afinam ou desafinam. Verdade maior. Viver é muito perigoso; e não é não. Nem sei explicar estas coisas. Um sentir é o do sentente, mas outro é do sentidor" (Grande Sertão: Veredas).

Viver com coragem não significa viver seguros, sem medo. Viver com coragem é viver para além do medo; não permitindo que ele nos paralise. Creditando ou não nossa vida a um Criador, todos temos uma bonita tarefa, ao recebermos essa dádiva que tanto nos espanta: viver com sentido. Eis a assustadora missão que diz respeito a todos, e que nos impulsiona a sermos sempre mais. Agraciados somos por não ter que fazer isso sozinhos. Que aproveitemos essa deliciosa oportunidade.

*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). E-mail: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.

Nenhum comentário:

Postar um comentário