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A primavera é um chamamento à esperança: a natureza dá provas de resiliência.
Flores são símbolos da resistência. São frágeis, sim, mas a beleza que gera vida tem uma força impressionante. (Reprodução/ Pixabay)
Por Felipe Magalhães Francisco*
A primavera está aí. Já havia sido anunciada, desde o inverno, pelos tão majestosos Ipês. Quem não se sensibiliza com o renascer e o florescer de plantas e árvores? Bastam poucas chuvas dos fins de tardes primaveris, para que a explosão em verde se faça ver. Não há como não pensar em milagre. É a vida que vence as ameaças de morte. A primavera é um chamamento à esperança: a natureza dá provas de resiliência.
Estamos em plena corrida eleitoral. Temos conversado muito pouco a respeito dos candidatos e das candidatas ao Legislativo. Que não corramos o risco de repetir, como há quatro anos, a tragédia de alçar ao poder pessoas tão empenhadas em nos destruir, tal como a formação do atual Congresso. Nossa atenção está voltada para as candidaturas presidenciais. Há um nítido clima de tensão, pairando por todos os lados.
Como há anos, a eleição está polarizada. Basicamente, a polarização das eleições anteriores, entre PT e PSDB, estava em projetos de poder: um, de caráter mais popular; outro mais neoliberal. Nas últimas quatro eleições, o PT saiu vitorioso e as reações foram sempre fortes. Estamos imersos numa situação de antipetismo, criada, sobretudo, pela mídia oligárquica. O ápice dessa situação se deu com o golpe jurídico-parlamentar, no qual a presidenta Dilma Rousseff foi apeada do poder. A constatação de que o ocorrido se deu num golpe, não nos tira a consciência e a clareza dos erros cometidos pelos governos petistas.
A onda antipetista está aí. É agressiva e absurda. E ela ajudou a desenterrar alguns ossos mal sepultados de nossa cultura: um anseio popular por uma violência institucionalizada. Dessa vez, a bipolarização das eleições superou, em muito, a questão dos projetos de poder. Temos um verdadeiro inimigo a ser vencido: o fascismo. As esquerdas, divididas, não conseguem um consenso político. A direita mais esclarecida, sem uma candidatura significativa, enfrenta uma forte crise: sofre as consequências de ter chocado um ovo de serpente. O Judiciário entrou, há muito, no jogo partidário: são tempos de exceção e arbítrio. O resultado está aí: um candidato fascista muito bem cotado na disputa eleitoral.
O inominável candidato tem dois tipos de eleitores: aqueles, menos esclarecidos, que surfam na onda do descontentamento de tudo o que está aí, que acreditam que, só radicalmente, as coisas podem entrar nos eixos. Tratam-se de pessoas com as quais devemos manter um diálogo. O segundo grupo é aquele que entrou na onda do discurso do ódio. O problema, aqui, é de integridade humana: têm, na violência e no ódio, suas divindades. Estarrece-nos que, grande parte desses que compõem o segundo grupo, se digam cristãos. De cristãos não têm nem o andado.
E o que tem a primavera a ver com tudo isso? Primeiro, que as eleições se darão em plena estação. Depois, que o renascimento da vida e da beleza são verdadeiros imperativos para nossa luta contra a cultura da morte. Há uma bonita tradição, em nossa latino-américa, de que nos túmulos dos mártires, roseiras são plantadas. O sangue derramado em favor de uma causa justa provoca o florescimento do mundo. Martírio, vale recordar, significa testemunho. Há muitas maneiras de vivermos o testemunho. Romper com toda e qualquer estrutura fascista e odiosa é uma delas.
Flores são símbolos da resistência. São frágeis, sim, mas a beleza que gera vida tem uma força impressionante. Nas redes sociais, nos diálogos corriqueiros, temos conquistado alguma união e consenso, no rechaço do fascismo, representado pelo candidato que muito tem sido idolatrado nos rincões do país, de forma doentia e preocupante. Ele não é uma campanha séria: revela em que tipo de nação queremos viver. Que a consciência de nossa responsabilidade na luta contra o fascismo nos leve a ações concretas de superação da violência e na criação de uma cultura respeitosa e aberta às diferenças. Para cada palavra de ódio e disseminadora de morte, nossa resposta florescida numa prática que promova a justiça, a solidariedade, o respeito e a paz, sobretudo na defesa solidária das minorias, primeiras vítimas do ódio.
Venceremos o ódio. E que essa luta nos ensine a pensar um projeto de nação na qual haja dignidade para todos e todas. Aproveitemos bem essa temporada das flores. É com ela que venceremos o fascismo e a cultura do ódio.
*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). E-mail: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.
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