sábado, 26 de janeiro de 2019

Tristeza e indignação em Brumadinho

domtotal.com
Cidade sofre com mais uma tragédia ambiental em Minas Gerais.
Lama de rejeitos chega ao rio Paraopeba.
Lama de rejeitos chega ao rio Paraopeba. Foto (Patrícia Azevedo/Dom Total)

Por Patrícia Azevedo
Repórter Dom Total, enviada especial a Brumadinho. 

Brumadinho (MG) – Uma cidade que aguarda notícias e busca respostas. Na tarde deste sábado (26), uma equipe do portal Dom Total seguiu para Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, para registrar a movimentação no local após o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale. O acidente ocorreu na sexta-feira (25) e deixou pelo menos 34 mortos e 300 desaparecidos.

O número de carros parados no acostamento chamava a atenção já nas proximidades do município de Mário Campos, localizado a 15 quilômetros de Brumadinho. Em pé, às margens da rodovia MG-040, motoristas e passageiros se misturavam aos moradores da região para observar o rio Paraopeba, que ganhou cor marrom devido à presença da lama de rejeitos que desceu o córrego do Feijão.

Entre eles estava o encarregado de obras Cícero Albuquerque, de Sarzedo. Ele seguia para Brumadinho em busca de notícias de quatro amigos que trabalham como terceirizados na Vale e estão desaparecidos. “O clima está muito tenso, esse rompimento nos pegou de surpresa. Eu mesmo estava trabalhando ontem quando recebi a notícia, por volta de meio dia. Isso ‘desmonta’ a gente. Olha o rio, está horrível! Costuma ser mais claro, bem mais claro, agora só tem lama e rejeitos”, afirmou Cícero.

Entre Mário Campos e Brumadinho, o movimento de viaturas das polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil ficou cada vez mais intenso. Em frente ao gabinete de crise da tragédia, estruturado na Faculdade Asa, repórteres de diferentes veículos disputavam espaço e informações. Às 14h40, era grande a expectativa para o depoimento da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. A entrevista, no entanto, foi adiada em função da forte chuva que atingiu o local. Restava aos jornalistas aguardar.

Seguimos então rumo ao povoado de Tejuco, que foi parcialmente evacuado em função da lama que atingiu o local. A vendedora Rosilda Rodrigues, que mora no povoado, destacou o sentimento de indignação e medo compartilhado pela comunidade. “As pessoas estão preocupadas, chorando, apreensivas. Estamos com muito medo também, porque existem outras firmas lá para cima. E se acontecer a mesma coisa? O sentimento é de muita indignação. Amigas minhas estão chorando pelos filhos desaparecidos. Não temos notícias. As famílias vão aos hospitais e não acham nada. Já estão abrindo covas no cemitério, é muita tristeza”, contou Rosilda. Para a vendedora, as regras para a mineração precisam ser revisadas. “Tem que ser uma coisa bem olhada. Eles vão esperar acontecer outra vez, outra tragédia?”, completou.

Também morador do Tejuco, o menino Gabriel Nonato, de 11 anos, está em busca de notícias do primo, que trabalha como caseiro em um sítio na área atingida pelo rompimento. “A minha mãe ligou para o meu primo ontem. Ele disse que ia tirar um cochilo, e depois viria à nossa casa. Estávamos na horta quando um amigo disse que a barragem tinha estourado. Desde então a minha mãe tenta ligar para ele e não consegue. Já mandou fotos para os hospitais, saiu às 8h da manhã em busca dele e até agora não voltou. A situação está feia, essa noite não consegui dormir”, disse Gabriel.

Os moradores não eram os únicos sem respostas. Às 16h05, no gabinete de crise, os jornalistas continuavam à espera do pronunciamento de Raquel Dodge e de outras autoridades. A movimentação também era intensa na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Brumadinho, que tinha a entrada de veículos controlada por policiais e membros do Corpo de Bombeiros. Ao lado da UPA, está localizada a Estação Conhecimento, espaço da Vale que está sendo usado para receber familiares e amigos de pessoas desaparecidas após o rompimento. O número de carros chegando ao local continuava grande quando deixamos Brumadinho.

Surpresa previsível

Para o professor José Cláudio Junqueira, que integra o corpo docente do Mestrado em Direito Ambiental da Dom Helder, o risco de ocorrer rompimentos é previsível, tendo em vista o elevado número de barragens de rejeitos em Minas Gerais.  “A flexibilização no licenciamento ocorrida em 2017 e o desmantelamento do órgão técnico Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), somados à lentidão para a aprovação da lei denominada ‘Mar de lama nunca mais’ agravam a situação”, afirmou.

De acordo com o professor, após a tragédia de Mariana, houve uma mobilização em torno do projeto de lei ‘Mar de Lama’, que disciplinava a questão de barragens em Minas Gerais, reduzindo os riscos de rompimento dessas estruturas. “Todavia, a par de várias audiências e dois substitutivos, nossos representantes ainda seguem um rito lento para a tomada de decisão, seguros que a lama nunca os atingirão”, ressaltou.

*Patrícia Azevedo/Com a colaboração de Wellington Kattah.

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