segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Clero e clericalismo, essa enorme trama tem algo a ver com o que Jesus fez e disse?

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Se as coisas continuam como estão na Igreja , os cristãos estarão sempre à mercê da vontade dos bispos, sacerdotes e 'clérigos' em geral.
Para designar os sacerdotes, foi generalizado no século III o título e categoria de
Para designar os sacerdotes, foi generalizado no século III o título e categoria de "clérigos", distintos e superiores aos "leigos". (Reprodução/ Periodista Digital)
Por José M. Castillo

Segundo o dicionário RAE, de língua espanhola, "clero" é uma palavra entendida como a classe sacerdotal na Igreja Católica. Enquanto "clericalismo" é, de acordo com o mesmo dicionário, a excessiva intervenção do clero na vida da Igreja.

Se levarmos em conta esses dois conceitos, entende-se o porquê daqueles que propõem, para renovar a Igreja e atualizá-la, a supressão do clericalismo.

Porque, se a intervenção do clero na vida da Igreja, é "excessiva", o mais lógico seria controlar o excesso clerical, de modo que os leigos não sejam reduzidos a mera submissão e observância dos clérigos que governam. Com isso, os leigos, que são a grande maioria dos cristãos, acabam permanecendo na Igreja com a única missão de se submeterem ao que o clero pensa, decide e impõe (cf. F. Vidal, em Vida Nueva digital.com: "Decálogo para suprimir o clericalismo").

A razão para esta proposta é clara: se as coisas continuam como estão na Igreja, os crentes (não "ordenados" como sacerdotes) serão reduzidos à mera condição de "clientela do clero". Ou seja, os cristãos estarão sempre à mercê da vontade dos bispos, sacerdotes e "clérigos" em geral, a partir de suas ideias e interesses que, como sabemos, podem estar, em muitos casos e em questões importantes, talvez muito longe do que os mortais comuns pensam, sentem e vivem.

Além disso, essa questão é complicada se acrescentarmos a isso a teologia, a liturgia, as cerimônias, as normas, o que pode e deve ser feito para determinar as questões da vida, e tudo o mais. Isso parece estar mais de acordo com o que se pensava, era dito e feito na Antiguidade e na Idade Média, que com o que pensamos, estamos interessados e temos que resolver no século XXI.

Não temos mais que ir à missa, celebrada em certas igrejas, confessar-nos com tal ou qual sacerdote ou comparecer a casamentos e batismos em que as pessoas têm que ouvir coisas que deixam a mais de um nervoso. Lá, a linguagem, as roupas, as cerimônias, as questões que surgem e as soluções propostas são coisas que não são compreendidas. E se chegam a se entender, poucos participantes estarão interessados.

Costuma-se dizer que a raiz desses problemas está no "clericalismo". Daí a necessidade de superá-lo. O que é verdade. Mas não é toda a verdade. Porque, se esse assunto for analisado mais a fundo, logo fica claro que o problema não está no "clericalismo", mas no "clero".

De fato, o termo grego "klêros" é usado, no Novo Testamento, quando se fala de Matias para substituir Judas (Atos 1, 17-26). Para designar os sacerdotes, foi generalizado no século III o título e categoria de "clérigos", distintos e superiores aos "leigos". Assim, a Igreja estava dividida entre: o "clero" que monopolizava a capacidade de tomar decisões, o poder de administrar os rituais sagrados e a dignidade de ser "consagrados". Com o inevitável perigo de que não poucos "homens da Igreja" começassem a ver, no ministério eclesiástico, uma maneira de se estabelecer na vida e até alcançar uma categoria senhorial (Y. Congar).

Entende-se isso, mesmo antes de Constantino, o tratado "De singularitate clericorum" que lutou contra os abusos de grandeza e vaidade de não poucos ministros da Igreja (J. Quasten). E, infelizmente, essa tendência (ao longo dos séculos) estava aumentando. Até transformar o "seguimento de Jesus" em uma "carreira de dignidade", situando-se (talvez sem pensar) nos níveis mais altos da sociedade.

Assim, a comunidade dos crentes em Jesus ficou fraturada e dividida. O "clero" (que é uma minoria) impõe suas ideias e possui os poderes sagrados. Os "leigos" (a grande maioria) são forçados a se submeterem aos "consagrados".

Se a isto somarmos os templos, monumentos sagrados, palácios episcopais, mosteiros, propriedades e a quantidade de dinheiro que estes lugares movimentam e precisam, a questão que se coloca é inevitável: isso tem que ver, em algum grau, com o que Jesus fez e disse? É mais ainda: pode-se razoavelmente pensar que todo este artificio solene evoluirá para se assemelhar à simplicidade, pobreza e condição humilde em que Jesus viveu, conforme o apresentado no Evangelho?

A contradição entre "o que é vivido" e "o que é dito" é clara. Então, pode ter "credibilidade" quem vive em tal contradição?

Dói-me  ter que dizer essas coisas. Porque tudo o que sou e tudo o que sei é à Igreja a quem devo isso. E é por esse motivo que, por quanto amo a Igreja, não posso calar a boca contra essas contradições que magoam tanto.


Periodista Digital - Tradução: Gilmar Pereira

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