quinta-feira, 6 de junho de 2019

Descuido com meio ambiente pode afetar economia


Especialista em direito ambiental e coordenador da força-tarefa Rio Doce do MPF adverte os riscos da fragilização da legislação e os impactos na mineração e no agronegócio.


As indústrias extrativas despencaram 6,3% em relação ao quarto trimestre de 2018, o pior desempenho entre as principais atividades destacadas.
As indústrias extrativas despencaram 6,3% em relação ao quarto trimestre de 2018, o pior desempenho entre as principais atividades destacadas. (charlesricardo/Pixabay)
Por Pablo Pires Fernandes
Editor Dom Total

O impacto das mudanças na legislação ambiental e da ausência de regulamentação e fiscalização no setor tem sido grande. Os casos do rompimento de barragens em Bento Rodrigues, distrito de Mariana; e em Brumadinho, na Grande BH, são trágicos exemplos de consequências da falta de atenção do poder público, agravada pela maneira irresponsável da prática extrativa das mineradoras em Minas Gerais.
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Coordenador do Programa de Pós-Graduação da Dom Helder Escola de Direito, José Adércio Sampaio aponta para a pressão de fatores econômicos sobre o poder público no que diz respeito à fragilização da legislação ambiental, tanto no setor da mineração como na agropecuária. Para ele, as recentes mudanças na legislação “podem ser um tiro no pé”. “Temos dois grandes componentes da nossa exportação. As commodities minerárias e agrícolas. Na área de mineração, somos uma tragédia literalmente. Isso pode de alguma forma impactar, talvez não no curto prazo, a maneira como o mercado internacional tratará as nossas commodities minerárias”, afirma Sampaio, que exerce a coordenação da força-tarefa Rio Doce do Ministério Público Federal (MPF). Sampaio é coordenador e participa nesta segunda e terça feira (3 e 4) do “Congresso internacional direito, democracia e ambiente”, promovido pelo Programa de Pós-Graduação da Dom Helder Escola de Direito.
De fato, o rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho (MG), impactou o desempenho do setor extrativo no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no primeiro trimestre do ano. As indústrias extrativas despencaram 6,3% em relação ao quarto trimestre de 2018, o pior desempenho entre as principais atividades destacadas. O fechamento da mina, também da Vale, de Gongo Seco, em Barão de Cocais (MG) e de Brucutu, em São Gonçalo do Rio Abaixo (MG), a maior do estado, também fez subir o preço do minério no mercado internacional.
O que o professor destaca é que o impacto pode não ser apenas na produção, mas na visão do mercado externo em relação às práticas mineradoras. Sampaio acompanha as discussões sobre licenciamento e segurança de barragens e diz que houve esperança de mudanças na legislação e na forma de lidar com a questão. “Não mudou nada, ao contrário. Em matéria de legislação ambiental você teve uma série de projetos de lei no plano federal que flexibilizavam o licenciamento. E aqui em Minas Gerais tivemos a aprovação de uma lei que flexibilizou mais ainda, o que é um contrassenso completo”.
Sampaio conta que a força-tarefa do MPF fez uma série de recomendações a diversos órgãos para que houvesse uma reestruturação, uma mudança de parâmetros, por exemplo, de segurança de barragem, de licenciamento, mas que “nada disso foi acolhido pelo poder público”. “Foi preciso ajuizarmos uma ação contra a União para que ela adotasse uma política de reestruturação da Agência Nacional de Mineração”, relata, dizendo que não se sente otimista a curto prazo. O especialista afirma que o cenário ainda é aterrador com relação aos desastres de Mariana e Brumadinho e que é preciso que a sociedade cobre para que haja mudanças efetivas na política ambiental.
Agricultura e desmatamento
Outros aspectos que esbarra na legislação ambiental e está diretamente ligado à economia são a liberação de agrotóxicos e o desmatamento em consequência da expansão da pecuária e das fronteiras agrícolas. Sampaio afirma que o volume de agrotóxicos liberados recentemente é inédito no país, boa parte deles de uso proibido nos Estados Unidos e na Europa. “Talvez de uma maneira mais imediata e ameaçadora do que em relação à nossa produção minerária, podemos ter um boicote em relação à produção dos nossos grãos, por exemplo. Quem vai pagar o preço? Exatamente a exportação, no primeiro plano, e o nosso agronegócio”, adverte.
No entanto, Sampaio argumenta que a conta nunca é paga apenas pelos donos do agronegócio, pois cria um efeito cascata que afeta os trabalhadores do agronegócio e a sociedade como um todo. E questiona: “Não sei se é das mais inteligente a política de ampliar o desmatamento, possibilitar o uso de agrotóxicos, porque nossos produtos agrícolas podem sofrer uma descriminalização no plano internacional”.
Redação Dom Total, colaborou Patrícia Azevedo

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