quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Para forçar delações, Lava Jato vazou informações para a imprensa, diz The Intercept Brasil


Procuradores queriam demonstrar que as denúncias contra seus alvos eram inevitáveis, mesmo quando não eram, como forma de pressão.


Conforme o The Intercept, Dallagnol
Conforme o The Intercept, Dallagnol "mentiu ao público ao negar categoricamente que agentes públicos passassem informações da operação". (Fernando Frazão/ABr)
Com o objetivo de mostrar um ambiente hostil, fazendo com que suspeitos acreditassem que a denúncia contra eles era inevitável e, assim, decidissem fazer delações, procuradores da Lava Jato vazaram informações para a imprensa. É o que revela o novo vazamento do The Intercept Brasil. Conforme o site, o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol “mentiu ao público ao negar categoricamente que agentes públicos passassem informações da operação”. Ele teria participado de grupos nos quais tais vazamentos foram planejados. “Em um deles, o próprio coordenador efetuou o tipo exato de vazamento que ele negou publicamente que partisse da força-tarefa”, afirma The Intercept Brasil.
Dois dias depois da 14ª fase da Lava Jato, em uma conversa ocorrida no dia 21 de junho de 2015, o procurador Orlando Martello perguntou ao colega Carlos Fernando Santos Lima “qual foi a estratégia de revelar os próximos passos na Eletrobrás etc?”. Santos Lima respondeu: “meus vazamentos objetivam sempre fazer com que pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”. As grafias das mensagens foram mantidas como constam nos arquivos obtidos pelo Intercept.
Na conversa os procuradores debateram estratégias para fecharem um acordo de delação com Bernardo Freiburghaus, apontado como operador de propinas da Odebrecht. De acordo com a lei que trata das organizações criminosas e define regras para as delações, estas últimas só podem ser aceitas se a pessoa colaborar voluntariamente.
Ainda segundo o chat obtido pelo The Intercept, Santos Lima assume os vazamentos para a imprensa e insinua que a prática era habitual. Além disso, ele afirma que agia assim para induzir os suspeitos a agirem de acordo com seus interesses. O site ressalta que o comentário do procurador não suscitou qualquer manifestação dos outros membros da Lava Jato. “No decorrer das conversas, os demais membros do grupo permaneceram calados.”
No mesmo dia da conversa no grupo da força-tarefa, Dallagnol e Orlando afirmaram no chat que tinham vazado a informação de que os Estados Unidos ajudariam a investigar Freiburghaus. A informação foi repassada a um repórter do Estadão pelo próprio coordenador da Lava Jato.
No mesmo dia, Deltan e Orlando anunciaram no chat terem vazado a informação de que os Estados Unidos iriam ajudar a investigar Bernardo para repórteres do Estadão, como forma de pressionar o investigado. Eles estavam antecipando a um jornalista uma movimentação da investigação. Foi Dallagnol o responsável pelo vazamento, como mostra sua conversa como o repórter do jornal. No entanto, a pressão não funcionou, pois o suposto operador não delatou.
Ao ser entrevistado em abril de 2017 pela BBC Brasil, após um discurso em Harvard, Dallagnol “disse que agentes públicos não vazam informações — a brecha estaria no acesso inevitável a dados secretos por réus e seus defensores”. Quando perguntado diretamente se a força-tarefa havia cometido vazamentos, o procurador respondeu: “Nos casos em que apenas os agentes públicos tinham acesso aos dados, as informações não vazaram”.
Ao The Intercept, a assessoria de imprensa da Lava Jato negou que os procuradores tenham vazado informações no caso do Estadão, dizendo que a força-tarefa “jamais vazou informações sigilosas para a imprensa, ao contrário do que sugere o questionamento recebido”. Para justificar essa negativa, a força-tarefa alegou que uma informação passada à imprensa deve ser ilegal ou violar uma ordem judicial para ser caracterizada como “vazamento”.
Redação Dom Total

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