quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Registro de agressores sexuais pode não ajudar igrejas na proteção de membros

Cada vez mais igrejas estão consultando o registro de agressores sexuais. Isso está ajudando?


Membros da Convenção Batista do Sul e convidados erguem as mãos em oração durante a reunião anual da convenção em Birmingham, Alabama.
Membros da Convenção Batista do Sul e convidados erguem as mãos em oração durante a reunião anual da convenção em Birmingham, Alabama. (RNS/ Butch Dill)
Por Yonat Shimron

Desde que foi oferecida a possibilidade de reunir seus recursos e verificar os antecedentes de voluntários e funcionários dos últimos 11 anos, cerca de um terço das igrejas Batistas do Sul se inscreveram no programa OneSource da LifeWay Christian Resources.
No início deste ano, a LifeWay informou que 16 mil congregações e outras organizações da igreja tinham arquivos para a verificações de antecedentes sobre homens e mulheres a ela vinculados por meio de um serviço chamado backgroundchecks.com. (Até agora, a Convenção Batista do Sul resistiu aos pedidos para criar um banco de dados próprio, dizendo que o registro nacional era mais confiável.)
Outras denominações também usam, cada vez mais, bancos de dados pesquisáveis sobre possíveis empregados, ao mesmo tempo em que o movimento #ChurchToo começa a mudar as atitudes da igreja em relação ao abuso sexual e à prevenção.
A maioria das verificações de antecedentes apontou mais de 600 milhões de registros de crimes, delitos e tráfico. Talvez, o mais importante é a possibilidade da verificação no registro nacional de agressores sexuais.
Mas isso pode dar às igrejas e outros grupos religiosos uma falsa sensação de segurança sobre a prevenção do abuso, dizem especialistas.
"Deixamos claro para as pessoas que, para entender a situação, terão que fazer uma pesquisa mais profunda", disse Josh Weis, vice-presidente executivo da Ministry Brands, um provedor de software de gerenciamento de igrejas que também vende produtos de triagem para cerca de 30.000 congregações, principalmente protestantes. "Nem todas as verificações de antecedentes são criadas da mesma forma".
A lei federal exige que todos os 50 estados implementem registros de agressores sexuais. Mas a lei não trata de condenações por abuso sexual de nível inferior, e as leis estaduais sobre abuso sexual variam de estado para estado.
Isso significa que alguns agressores sexuais podem não ser descobertos.
Jeffrey Epstein, o economista de Nova York acusado de tráfico sexual de crianças menores de idade, é um bom exemplo. Epstein foi registrado como agressor sexual na Flórida. Mas em Nova York, onde é dono de uma residência luxuosa, não era obrigado a comparecer periodicamente perante um juiz, processo exigido por lei. Depois, o economista mudou seu endereço para as Ilhas Virgens, relatou o The New York Times.
E no Novo México, onde Epstein possuía uma mansão de 2480 m2 ao sul de Santa Fé, conseguiu evitar a inclusão no registro do estado, porque sua condenação envolvia uma jovem de 17 anos. Essa é a idade de consentimento no Novo México.
As igrejas precisam investir em pesquisas mais profundas para funcionários e voluntários e não se contentar com estudos menos cuidadosos no estado onde a congregação está localizada, Weis e representantes de outras empresas de verificação de antecedentes insistem.
A Ministry Brands divulgou recentemente uma auditoria das 29.768 igrejas que usaram sua marca "Protect My Ministry", um produto para igrejas. A consultora mostrou que 40% daqueles beneficiários das igrejas e alguns fieis não aproveitam os estudos e registros mais profundos e completos em cada um dos 50 estados.
O relatório também recomendou que as congregações exigissem que os solicitantes fornecessem números de seguro social para a correta verificação de antecedentes, para que pudesse detectar pessoas usando nomes falsos ou apelidos.
Na semana passada, o escritório do xerife do condado de Sarasota (Flórida) acusou Charles Andrews, um ministro de uma igreja local, de 500 agressões criminais e posse de pornografia infantil. Andrews, que serviu na igreja de Cristo em Osprey, Flórida, está registrado como um criminoso sexual no Alabama.
Autoridades disseram que Andrews usou endereços de e-mail e uma conta de mídia social que não foram reportados ao Departamento de Polícia da Flórida, informou o Orlando Sentinel. Não ficou claro se os membros da igreja sabiam que Andrews era um criminoso sexual registrado no Alabama. O telefone da igreja estava desconectado quando tentamos fazer contato.
Elizabeth Jeglic, professora de psicologia do John Jay College, da Universidade da Cidade de Nova York, que estuda registros de agressores sexuais, disse que esses casos são muito raros. Apenas 5% das pessoas no registro de agressores sexuais são reincidentes, de acordo com um estudo recente no estado de Nova York. A grande maioria dos agressores dentro do sistema cometeu um crime sexual.
Pesquisar sobre possíveis funcionários para trabalhos nas igrejas através do registro de criminosos sexuais é útil, disse Jeglic. Mas os dados fornecidos são limitados.
O registro nacional se tornou lei depois de uma série de estupros e assassinatos de crianças, talvez o mais famoso seja o da morte de Megan Kanka, uma garota de 7 anos de Nova Jersey que foi estuprada e assassinada por seu vizinho em 1994. Seu assassinato levou a um projeto de lei que exige um registro de agressores sexuais, com um banco de dados rastreado com notificações de residência dos estados e das comunidades onde moram e são cadastrados esses criminosos sexuais. O presidente Bill Clinton assinou a Lei de Megan em 1996, exigindo os registros de agressores sexuais nos 50 estados.
Mas nos últimos anos, a eficácia do registro nacional de agressores sexuais foi questionada. Por um lado, o banco de dados não é atualizado em tempo real. Pode levar meses ou anos até que o banco de dados seja atualizado com pessoas que foram libertadas da prisão por ofensas sexuais. Por esse motivo, as empresas que fornecem pesquisas de banco de dados para as igrejas recomendam que todos os funcionários sejam investigados a cada ano.
"As igrejas têm essa ideia de uma e outra forma", disse Weis. "Recomendamos que façam isso anualmente".
Além disso, um estudo de 2010 da Carolina do Sul mostrou que muitos criminosos sexuais recorrem para que seus crimes sejam classificados como não sexuais e assim não sejam incluídos no registro.
Isso, além da variabilidade das leis estaduais sobre abuso sexual, leva os pesquisadores a concluir que a verificação de pessoas por meio de bancos de dados como o registro nacional de agressores sexuais ou o banco de dados criminal do estado não garante um ambiente eclesiástico livre de abuso sexual.
"Estamos gastando muito tempo e dinheiro na aplicação de políticas restritas que não previnem a reincidência em vez de trabalhar na prevenção", disse Jeglic.
Ela recomendou que as congregações trabalhassem em políticas ou procedimentos para reduzir a incidência de abuso sexual. Isso poderia significar, em primeiro lugar, estabelecer protocolos claros de treinamento que proíbem os funcionários da igreja ficarem sozinhos com uma criança, até mesmo no banheiro, e submeter todos os novos contratados a um período em que estejam acompanhados.
"Como mulher e mãe, é bom poder olhar alguém e saber", disse Jeglic. "Mas, como pesquisadora, os dados não ajudam a evitar futuros crimes sexuais. Muitas informações no registro estão incorretas. Isso nos dá uma falsa sensação de segurança."
Publicado originalmente por Religion News Service.
Tradução: Ramón Lara

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