domtotal.com
Uma teologia que desconsidera as situações cotidianas e sofrimento não pode ser considerada cristã.
No país com tantas mortes de LGBTQI+ e feminicídios, torna-se impensável uma teologia que não volte seu olhar para o sofrimento dessa parcela da população (Christian Sterk/ Unsplash)
Fabrício Veliq*
O humanismo é um movimento que surge no final do século 14, tendo como fundador Petrarca. Em sua origem, seu intuito era pensar a cidade a partir das categorias humanas e não as da Igreja, da Idade Média. Nesse sentido, nasce com o projeto de um novo homem que se desenvolveria por meio do estudo da filosofia e da retórica.
Leia também:
- A teologia na fronteira: gênero, decolonialidade e humanismo
- Criados para a dignidade e para a liberdade
- O rosto de Jesus está no irmão que sofre
Uma de suas grandes características iniciais foi o questionamento acerca dos autores considerados canônicos à época, como Aristóteles e Cícero. Ao invés de serem tidos como sumidades e não passíveis de contestações, passaram a ser vistos como humanos que eram e, consequentemente, podendo ser questionados e até mesmo reinterpretados sem os limites da antiga escolástica. O humanismo foi o grande responsável por desenvolvimentos na Idade Moderna, lançando bases para grandes transformações, até mesmo na forma do fazer teológico.
A teologia, em tempos atuais, sem desconsiderar o transcendente, tem consciência muito maior do papel humano no seu fazer e no próprio conhecimento do divino. Afinal, o Deus cristão se fez carne e habitou entre nós, de maneira que pensar o humano como ser de carne, possuidor de um corpo, leva ao reconhecimento da dignidade que este possui em si mesmo. Esse é o ponto de partida de qualquer antropologia cristã.
Com isso, é tarefa teológica recuperar diariamente os valores humanos a fim de poder, justamente, falar de Deus. Uma teologia que desconsidera as situações cotidianas, o modo de viver de cada cultura ou o próprio sofrimento não pode ser considerada cristã. Para o ser, ela necessita voltar seu ouvido para as questões da atualidade e, assim, propor respostas que contribuam no desenvolvimento e maior humanização da sociedade. Nesse contexto é que se colocam as questões de gênero e LGBTQI+. No país em que mais se mata pessoas LGBTQI+ e casos de feminicídios aumentam vertiginosamente – com apoio de diversos movimentos fundamentalistas e machistas –, torna-se impensável uma teologia que se preocupe somente com o transcendente e não volte seu olhar para o sofrimento dessa parcela da população, buscando assegurar sua dignidade por reconhecer que também são imagem de Deus.
Essa teologia, por sua vez, precisa ser feita a partir das categorias de nossa sociedade, bem como ser descolonizada, a fim de poder dar suas próprias respostas para as situações que os povos do sul vivem. Não deve somente importar teologias de outras realidades, principalmente europeias e norte-americanas, que muitas vezes não tocam problemas que somente os países do hemisfério sul sofrem.
Nesse contexto, e com o intuito de pensar as categorias de gênero, decolonialidade e humanismo que o grupo de pesquisa Teologia e Diversidade Afetivo-sexual, da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia propõe para o dia 23/10/2019 rodas de conversa sobre essas temáticas, nas quais pessoas que as estudam estarão presentes e as discutirão sob diversos prismas.
Você é, portanto, convidado e convidada do grupo de pesquisa para este evento.
*Fabrício Veliq é protestante e teólogo. Doutor em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE), Doctor of Theology pela Katholieke Universiteit Leuven (KU Leuven), Bacharel em Filosofia (UFMG) E-mail: fveliq@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário