Quando o amor chama, você se entrega. Se não, nada feito
Para Erich Fromm, o amor não é algo espontâneo, e sim uma arte que deve ser aprendida. (Oziel Gómez/ Unsplash)
Afonso Barroso*
Dizer que quem ama não mata é contrariar os fatos e a lógica. Fiz, durante vários anos indolentes da minha aposentadoria, um estudo minucioso sobre o amor. Uma das minhas conclusões é a de que quem ama às vezes mata, sim, e em certos casos não raros, até se mata.
Descobri o que já devia saber: que o amor é um sentimento de alta complexidade, ora transparente, ora opaco, ora incompreensível, e existe nos mais variados tipos, padrões e cores. Para uma análise superficial, mas ao mesmo tempo sólida, tomemos alguns dos modelos.
Tem o chamado amor platônico, também conhecido como socrático. Ganhou esse nome, como é sabido, porque foi extraído do amor que o filósofo Platão detectou na relação de Sócrates com seus alunos, em especial com um deles, Alcibíades. Não há registro de homossexualidade nas amizades meio coloridas de Sócrates. Tudo indica que era um amor que não se arriscava além da amizade. Pode-se dizer do amor platônico aquele que não chega às vias de fato, o que parece uma boa definição.
Tem o amor-paixão, o tipo que não conhece limites. É famosa e universalmente adotada a frase de Blaise Pascal, segundo o qual “o amor tem razões que a própria razão desconhece”. Pascal deve ter feito cálculos minuciosos para chegar a essa afirmação, porque afinal era um matemático. É esse modelo de amor que leva à loucura. Dominada pela paixão, a pessoa não vê limites para defendê-la. Por ela, é capaz de roubar, matar ou morrer, embora não se tenha notícia de atrocidade como a que foi descrita numa canção do finadíssimo Vicente Celestino. (Para quem não sabe, a canção dizia que um camponês arrancou o coração da própria mãe por exigência maluca da mulher amada. Vai amar assim nos infernos).
Tem o amor bandido – ou selvagem. É o modelo animalesco que ama maltratar e fazer sofrer. É mais praticado pelo homem, especialmente o funkeiro que chama de cachorra a pessoa amada. Na verdade, bandido no caso não é o amor: é o dono dele.
Tem o amor itinerante. É o que nasce do visual. Aprendi, nos meus exaustivos estudos, que o amor não se consolida quando surge motivado pela aparência. Em muitos casos, talvez na maioria, quando a pessoa começa a amar alguém pela beleza exterior, não demora acaba desgostando ou melhor, desamando. E sai vagando sem rumo à procura de novas aventuras, ou novos desamores.
E tem o amor materno, diferente de todos os outros, mais forte que o paterno ou o filial, porque mais doce e mais genuíno. Amor de mãe é o único que nasce junto com o filho. Vem lá das entranhas e nunca se vai, nunca morre. Existem mães de verdadeiros marginais que amam esses filhos como se fossem santos. Ninguém explica a força desse sentimento. Mãe é mãe, diz a sábia idiotice popular.
Há outros tipos de amor, mas não cabem numa crônica. Fico nesses, mas não deixo de lembrar que o psicólogo e sociólogo alemão Erich Fromm tem uma teoria até interessante, mas para mim equivocada sobre o assunto. Diz ele que o amor não é algo espontâneo, e sim uma arte que deve ser aprendida. Como se fosse música ou pintura. Erradíssimo esse raciocínio, digo eu. Ninguém se torna um bom pintor ou um bom músico se não tiver vocação. E vocação, como qualquer não filósofo sabe, é o mesmo que chamamento. Quando o amor chama, você se entrega. Se não, nada feito.
Bem, caro leitor e amantíssima leitora, isto é tudo que sei sobre o amor, esse sentimento louco que enleva, arrebata, tortura, oprime e... mata.
*Afonso Barroso é jornalista, redator publicitário e editor
domtotal.com
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